Lisboa palco da proteção dos oceanos. O que sabe sobre o mar? Quanto vai subir e o que esconde

Lisboa palco da proteção dos oceanos. O que sabe sobre o mar? Quanto vai subir e o que esconde


Conferência dos Oceanos das Nações Unidas arranca na segunda-feira em Lisboa, com várias iniciativas paralelas. No final, será adoptada uma declaração sobre a proteção e preservação de oceanos e áreas marinhas. O que sabe sobre o mar português e global? Reunimos curiosidades e um breve guia para a primeira grande cimeira das Nações Unidas acolhida…


O grande mar português

Portugal tem 2500 km de linha de costa. A Zona Económica Exclusiva de Portugal é a 20.ª maior do mundo, a quinta da Europa, com 1,7 milhões de km2 de extensão. A ZEE portuguesa é a terceira maior da União Europeia. O mar português ocupa um espaço equivalente a 19 vezes a área de Portugal continental ou qualquer coisa como 172 milhões de campos de futebol. Tem três subáreas: continente (287 521 km2), Açores (930 687 km2) e Madeira (442 248 km2). Desde 2009, está em curso nas Nações Unidas o processo para extensão da plataforma continental, com a proposta de Portugal passar a ter uma ZEE com cerca de quatro quilómetros quadrados indo além das 200 milhas náuticas, o que passaria a ser a maior área europeia e a 10ª maior do mundo. O mar português passaria a ter uma área equivalente a 40 vezes Portugal continental. “As discussões continuam, é um processo que não é fácil, demora anos. Daquilo que posso aferir, penso que o processo tem ido bem. Vamos ver se nos próximos anos conseguimos ter pelo menos a negociação finalizada”, disse recentemente o ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva.

 

Subida do mar afetará 150 mil portugueses  

Se os oceanos prometem recursos e uma economia em parte por explorar, Portugal está também vulnerável à subida do nível médio do mar. O consenso científico adotado pelo Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas é de que o nível do mar irá subir, a nível global, 24 a 30 centímetros até 2065 e 60 centímetros até 2100. Em Portugal vai aumentar a área em risco de submersão frequente ou inundação extrema. Eis um exemplo para Lisboa, como explicou ao i em 2019 Carlos Antunes, investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que nos últimos anos trabalhou na modelação da covid-19 e é especialista nesta área: no Cais Sodré, a cota máxima ronda hoje os 2,48 metros e, em 2050, poderá chegar aos 2,62 metros nas marés vivas. As zonas de estuários e rias são as mais vulneráveis, nomeadamente Setúbal, Faro e Aveiro, estimando-se que a área inundável aumente, em cenários extremos de marés vivas, para 1146 km2, afetando,  em 2050, zonas onde vivem hoje 146 mil portugueses. Em 2100, 225 mil poderão sofrer as consequências. Nos últimos 100 anos, desde 1920 até hoje, o nível do mar subiu cerca 20 centímetros na costa portuguesa, podendo subir um metro ao longo do século XXI, explicou na altura ao i o investigador, numa grande entrevista a propósito do projeto que cartografou e cenarizou as áreas de risco em Portugal, disponível no site snmportugal.pt.

 

O amortecedor das emissões

Se as alterações climáticas lançam o alerta sobre a aceleração da subida do nível do mar, os oceanos são um amortecedor das emissões, com novos projetos para intensificar o armazenamento de carbono por ecossistemas marinhos. O mais recente foi lançado pela Fundação Calouste Gulbenkian, que vai cartografar o potencial de sapais e florestas de algas marinhas nas áreas costeiras portuguesas para sequestro de CO2, pretendo lançar um mercado de créditos do chamado carbono azul. A ideia, explicou ao i Filipa Saldanha, responsável pelo projeto, será as empresas e instituições mitigarem parte da sua pegada ecológica financiando ações de conservação destes ecossistemas em áreas equivalentes às necessárias para compensar as suas emissões. O projeto Gulbenkian Carbono Azul, anunciado este mês, vai ser apresentado à margem da Conferência das ONU esta segunda-feira-feira, pelas 16h45, no auditório do Fórum Oceano no Pavilhão de Portugal. Estima-se que um quarto do CO2 produzido pelas atividades humanas é absorvido pelos oceanos e que contém 50 vezes mais carbono do que a atmosfera. Mais quente, o mar torna-se mais ácido, desfavorável a habitats e menos capaz de manter este papel.  Desde 1985, devido ao aumento de dióxido de carbono na atmosfera, a acidez média da superfície do oceano aumentou 12,3%, analisou a Pordata, num conjunto de dados publicados a propósito da conferência da ONU.

 

5% do PIB

Nos anos 60, Portugal chegou a ter mais de 35 mil pescadores registados. Hoje são menos de metade. Em 2021, revela a Pordata, que analisou dados do Instituto Nacional de Estatística, eram 14 917. As embarcações diminuíram para metade desde os anos 90. As pescas e aquicultura têm atualmente um peso reduzido na economia do país: em 2019, estima a Pordata, representaram 0,18% do PIB. Ainda assim, a Direção-Geral de Política do Mar estima que o impacto direto e indireto da economia do mar na economia nacional se traduza em 5% do PIB e 4,1% do emprego no país, isto com base nos últimos dados tratados de 2018. O mar contribui para 5% das exportações nacionais. Em 2020, foram movimentados em Portugal três milhões de TEU (medida padrão dos contentores, referente à capacidade de carga de um contentor marítimo normal, de 20 pés de comprimento). 

 

70% do planeta, 5% explorados

Os oceanos representam 70% da superfície do planeta, com 96,5% de toda a água. A maioria permanece território por explorar – estima-se que apenas 5% são conhecidos do ser humano e só 20% do relevado oceânico está mapeado. Em abril de 2019, o empresário e explorador americano Victor Vescovo bateu o recorde em profundidade, descendo quase 11 quilómetros até ao fundo da Fossa das Marianas, o local mais profundo dos oceanos, onde passou quatro horas a bordo de um submersível. Não trouxe boas notícias: viu pelo menos um saco de plástico.

 

Um mar de plástico

Estima-se que atualmente existam 75 a 199 milhões de toneladas de plástico nos oceanos – representa, segundo as Nações Unidas, 80% da poluição marinha. Todos os anos são mais 14 milhões de toneladas. A grande ilha de lixo no Pacífico já é considerada o sétimo continente. Descrita pela primeira vez em 1988, as últimas estimativas apontam para uma área de 1,6 milhões de quilómetros quadrados, praticamente o tamanho da zona económica exclusiva de Portugal ou três vezes o tamanho de um país como França.

 

Recifes de corais à beira de desaparecer e a revelação de 2022

O alerta foi feito pela UNESCO este ano: os maiores recifes de corais do mundo podem desaparecer até ao final do século à conta do aquecimento e acidificação dos oceanos. Se muitos locais estão já considerados em risco, também no início deste ano foi feita uma nova descoberta: uma missão científica apoiada pela organização para a Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas descobriu um dos maiores recifes de corais do mundo, na costa do Taiti e saudável. Parece uma obra de arte: os corais chegam a ter dois metros de diâmetro e têm o formato de rosas. O recife está localizado entre 30 a 65 metros abaixo do nível do mar, tendo aproximadamente 3km de extensão e até 65 metros de largura. “A descoberta no Taiti sugere que existem muitos recifes de corais bem abaixo de 30 metros, na área conhecida como a zona do crepúsculo do oceano”, disse na altura a UNESCO.