Liga portuguesa. O regresso dos gansos

Liga portuguesa. O regresso dos gansos


Oitenta e três anos depois, o histórico clube lisboeta regressa ao principal campeonato nacional. O FC Porto fez a merecida festa.


Já não sei há quantos anos foi, seguramente mais do que 45, que vi uma equipa do Casa Pia jogar no Branca Lucas, o mítico campo do SL e Olivais, e onde alguns dos jogadores que vestiam de preto se distinguiam dos outros, pois não podiam gritar nem dizer palavrões, embora emitissem sons que mostravam alguma revolta quando as coisas não lhes corriam bem. Nesse tempo, o Casa Pia tinha vários jogadores surdos e outros mudos, mostrando que sempre foi um clube diferente.

Recorde-se que foi do Casa Pia que saíram os fundadores dos três principais clubes de Lisboa- Sport Lisboa, em 1904, mais tarde Benfica, Sporting, em 1906, e Os Belenenses, em 1919. E foi no Casa Pia que Rúben Amorim começou a sua carreira de treinador, onde estava a fazer um magnífico trabalho, até alguém questionar a sua habilitação para treinar uma equipa do segundo escalão. As burocracias são um pesadelo, mas vistas de longe ainda o são mais…

Ontem, os gansos, assim são conhecidos os antigos internados da Casa Pia que vestiam de preto, gritaram bem alto de alegria pelo regresso à Primeira Divisão do futebol português. O feito é ainda mais assinalável, atendendo a que o clube tem uma média de espetadores por jogo que não deve chegar aos mil adeptos. A acompanhar o Casa Pia na subida de divisão está o Rio Ave que, depois de um ano de interregno, regressa ao escalão máximo do futebol português. Com uma assistência média de cerca de 3 900 espetadores, o clube de Vila do Conde ficou em primeiro lugar na Segunda Liga, e remeteu o Desportivo de Chaves para o playoff, onde defrontará o Moreirense, que tentará tudo para se manter na Primeira Divisão. 

O mauzão da fita O último jogo da equipa de Sá Pinto, contra o Vizela – um derby local –, acabou com o fogoso treinador a insultar os adeptos vizinhos, tendo sido preciso a GNR intervir para acalmar os ânimos. Sá Pinto continua igual a si próprio e no final acabou por reconhecer que o que o revoltou foi os adeptos do Vizela festejarem os golos do Tondela, que caso tivesse ganho ao Boavista, teria atirado o Moreirense para a Segunda Liga: “Sou emocional e gosto das pessoas de Vizela, até gosto muito de almoçar e jantar lá, mas deixou-me triste ver isto entre vizinhos. Não quero ajudas, porque também não gosto disso, mas prefiro que se salve o vizinho que um estrangeiro ou outro mais longe. Sou assim, regionalista e nacionalista. Não resisti e confesso que me doeu e também não gostei quando os nossos adeptos começaram a dizer ‘olés, olés’”, confessou o antigo jogador e treinador do Sporting.

A B. SAD, um clube semi-fantasma, já que não tem campo nem adeptos, e que ficou com o estatuto de Os Belenenses, desce à Segunda Divisão, acompanhando do Tondela – clube que disputará a final da Taça de Portugal contra o FC Porto. 

Mas a festa, como é óbvio, aconteceu no Dragão, onde o FC Porto conquistou o seu 30.º título de campeão, acabando o campeonato com seis pontos de avanço do Sporting. Com polémicas de arbitragem ou do VAR, a equipa de Sérgio Conceição foi um justo vencedor, batendo até o máximo de pontos numa época: 91, algo que ninguém tinha alcançado.

Já o Benfica, ao alcançar o terceiro lugar, terá de ir às pré-eliminatórias da Liga dos Campeões para tentar alcançar a fase de grupos. Num ano desastrosos a nível nacional, o clube da Luz apenas se pode ‘gabar’ de ter tido o melhor marcador do campeonato: Darwin Núñez com 26 golos, seguido do iraniano Mehdi Taremi, que ao serviço do FC Porto fez 20 golos. A fechar o pódio dos goleadores ficou Ricardo Horta, do Sp. Braga, que marcou por 18 vezes. O extremo-esquerdo do Braga é apontado como o substituto de Núñez que deverá abandonar o clube da Luz.

A Liga dos últimos Por resolver fica que equipa vão à Liga das Conferências, uma espécie de campeonato da terceira divisão europeia. Se o FC Porto vencer o despromovido Tondela na final da Taça de Portugal, o Vitória de Guimarães conseguirá um lugar na nova competição europeia. É pois natural que os vimaranenses, tão senhores do seu orgulho nacional, se vejam na contingência de torcer pelo FC Porto.

Quanto à Segunda Liga, dois históricos do futebol português, Varzim e Académica de Coimbra, descem à Terceira Liga. Nunca a Académica tinha descido tão baixo, e o clube dos estudantes precisará de muito mais do que o apoio das capas negras para se reerguer.