O PSD celebrou 48 anos de história. Aqueles, como eu, seus militantes, têm, no cômputo geral, muito boas razões para se sentirem orgulhosos de pertencerem a esta instituição. Isso não impede que se reconheça que estamos perante uma encruzilhada e que tempos difíceis estão pela frente, a menos que se aborde com ousadia os desafios da representação a que o partido não tem satisfatoriamente dado resposta.
O Partido Social Democrata sofreu um duro revés nas eleições legislativas, as quais, para além da inesperada maioria absoluta do Partido Socialista, produziram uma profunda transformação no campo político não-socialista.
Ao PSD, após esse ato eleitoral e em função dos seus resultados, caberia abrir um processo de reflexão – que ainda não teve lugar -, de modo a apurar as causas estruturais e conjunturais da estagnação eleitoral do partido, definir com clareza o seu papel na sociedade portuguesa e lançar as bases para uma reforma do seu modo de funcionamento, tornando-o mais favorável à participação dos cidadãos, mais plural e inclusivo na relação com os militantes, em suma, modernizando-o. Como pode o PSD liderar o campo reformista se não for capaz de imprimir esse mesmo cunho na sua dinamização interna? Como pode atrair e representar os setores mais pujantes da sociedade se, tal qual o PS ou perto disso, se deixar amordaçar pela inércia, consumindo-se em lutas de poder, como se os seus líderes permanecessem perpetuamente ungidos pela possibilidade de chegarem a primeiro-ministro? Importa, em concreto, reafirmar a visão de um PSD reformista e plural, composto por várias correntes e fortalecendo-se nas mesmas, que se ergue como adversário primacial da infértil e perigosa hegemonia do PS na sociedade portuguesa, a qual, a intensificar-se, desequilibrará definitivamente o sistema. O PSD tem que estar preparado para ganhar eleições, mas de pouco servirá fazê-lo se não ganhar o coração e a mente dos portugueses, pois isso permitirá que as grandes questões do país continuem a ser colocadas nos termos que promovem o conformismo e que oferecem respostas assentes numa tacanha lógica de curto-prazo. Uma lenta gestão do declínio.
Seria desejável que esse processo tivesse ocorrido previamente à eleição da nova liderança – não tendo sido, ainda estamos a tempo – e necessário que venha a compreender a realização de um congresso extraordinário, também de cariz estatutário, que se constitua como um esforço coletivo do partido e que a todos responsabilize.
O que não é desejável é que o PSD atravesse esta crise, por resignação ou preguiça, como um mero incidente conjuntural, sem quaisquer consequências nos desafios que se avizinham e não obrigando a qualquer exercício reflexivo, declinando toda essa responsabilidade a uma futura liderança do PSD, a qual terá já desafios de grande alcance. O PSD, a seu bem e das direções que o venham a liderar, não se pode esgotar nesses mesmos órgãos de cúpula, nem impor a cada um dos seus líderes uma aura messiânica, cujo peso contribui muitas vezes para acelerar os processos de desgaste e desilusão da militância, colocando dificuldades na afirmação perante o país. Dito isto, desejo, e estou crente, pelo menos no que respeita aos dois candidatos – de quem só tenho boas observações a fazer – que o divisionismo de bons e maus, imaculados ou sujos, sociais-democratas puros ou oportunistas, como muitos foram apodados, cesse definitivamente, pois onde reina o agravo pessoal, a frieza e crueldade nas relações humanos e não prospera o respeito mútuo e o companheirismo solidário, não há argamassa das ideias que derrote tal desunião.
O PSD tem muito para dar ao país. E o país precisa, mas o PSD tem que se fazer útil e encontrar, tal como o fez com Sá Carneiro, Cavaco Silva e Passos Coelho o seu devir, uma razão de ser, um desígnio que ilustre o papel que historicamente lhe tem sido cometido na sociedade portuguesa.