Agora que o PCP voltou a sublinhar a importância do 25 de novembro, por via da sua insustentável posição face à invasão e guerra na Ucrânia, resultado do impulso tresloucado do todo poderoso líder da Federação Russa, ficou claro, para alguns, aquilo de que nos livrámos com uma equação de poder formatada com pressupostos incompatíveis. Imagine-se que não havia maioria absoluta, mas o quadro era o da solução de governo registrada entre 2014 e 2021. Bem sei que em Portugal gostamos de ter a memória curta e que os protagonistas políticos apostam também nessa ficha. O próprio PCP, para alguns, agora PZP, dada a proximidade do Z que as tropas e os mercenários de Putin utilizam na agressão à Ucrânia, está a contar com a falta de memória de alguns para resgatar mais uns votitos no próximo ato eleitoral, depois da hecatombe das legislativas.
Entre a forma e a substância, o PCP foi há muito capturado pela forma, apesar de manter de forma cega a substância e de, pela cegueira ideológica, navegar num mar de incoerências.
Na forma, colocou um conjunto de jovens em lugares chave no parlamento para transmitir uma ideia de renovação enquanto reforçava a ortodoxia mais empedernida nas orientações e na ação direta e indireta, sobretudo através da ditadura da maioria na CGTP e nos restantes satélites.
Na substância para inverter a sensação real de perda autárquica embalou no canto do acesso ao arco do poder, suportando uma solução de governo, com pressupostos com os quais não concordava (NATO e União Europeia), só para erradicar o inimigo interno, a direita.
O PCP precisa de inimigos para se alimentar. O grande capital, o imperialismo americano, Bruxelas, as políticas de direitas, a bipolarização, o raio que os parta e tantos outros chavões verborreicos que, ano após ano, ouvimos debitados por quem na ação local da gestão das comunidades não hesita em contraditá-los, nomeadamente na sintonia com o funcionamento do mercado. O caricato nesta deriva suicidária do PCP e dos seus dirigentes é que nada do que estão a fazer seria permitido na União Soviética ou na própria Federação Russa de Putin. Nesses contextos, o PCP não poderia falar, discordar, argumentar ou estar ausente do plenário do parlamento, sem correr o risco de uma ida à esquadra ou de uma viagem sem retorno até um Gulag, dos antigos ou dos sucedâneos atuais. Sim, no País dos Sovietes de Lenine ou de Estaline, como na Rússia de Putin, o PCP nem podia piar e é tudo isso que também está em causa, como acontece noutras latitudes ideológicas da sua família. Quem discorda, está calado, quieto, amocha ou é fustigado pela força bruta dos regimes não democráticos de facto.
Nunca como agora fez tanto sentido dizer que o PCP está do lado do problema. Já fazia, quando se percebia que as soluções ideológicas propostas em muitas ocasiões, quase sempre de dar, de conferir direitos ou recursos, eram incompatíveis com a participação de Portugal na União Europeia e a presença na NATO. Aliás, a argumentação utilizada pelo PCP para zurzir na construção europeia, naquilo que apelidam de alienação de soberania e na sujeição aos ditames de Bruxelas não tem comparação com a brutalidade da anulação de vontade própria das nações debaixo da asa da então União Soviética e agora da Federação Russa. Zero independência. Zero autonomia. Zero liberdade e democracia.
O PCP precisa de pretextos, de inimigos e de papões. Para ir para a rua, para alimentar lutas sem nexo com as dinâmicas dos tempos modernos, para continuar a sua senda ideológica e para dar nota da sua existência. Não digo que não tenha razão em algumas das preocupações na área laboral, na produção nacional ou na situação social, mas o PCP coloca-se sempre do lado do problema para depois apresentar soluções que amiúde são sustentáveis, viáveis ou possíveis.
No caso da Ucrânia, ao lado da agressão russa de Putin apresentada como consequência e não causa, o PCP enfrenta uma comoção nacional de indignação, facilmente convertida no mercado de transações verbais da economia planificada em que vive numa acusação de anticomunismo. Mais uma oportunidade para agregar as hostes e agitá-las contra os inimigos, agora que deixaram de estar na órbita do arco da governação, onde estiveram por conveniência política de alguns, por mera sobrevivência, agora cimentada numa maioria absoluta. Será que também aqui é só de sobrevivência política que estamos a falar? Procurar manter o que se tem, fidelizar o apego dos militantes, para, a partir de uma posição alegadamente ideológica, avançar para a luta face aos inimigos internos (anticomunistas) e externos (Bruxelas e os americanos). É poucochinho. Um disparate inenarrável. Do que nos livrámos!
Abril que comemoramos hoje, pela quadragésima oitava vez, trouxe-nos a liberdade e a democracia. Houve comunistas importantes para o combate à ditadura e para a revolução, mas o que deveria estar presente hoje era o esforço de corrigir o que funciona mal e o que ainda não foi feito, no quadro da nossa participação na construção europeia, com valorização da Lusofonia e tendo em conta as nossas alianças internacionais, democráticas e de direito internacional. Em vez disso, respondemos a emergências e a pouco mais do que o quotidiano, sem visão, sem rasgo e sem responder aos problemas estruturais. Em parte, coletivizámos uma atitude à PCP, andamos quase só atrás do prejuízo. É pouco para tanta ambição de Abril.
Viva o 25 de Abril! Fascismo nunca mais! E ele anda por aí…
NOTAS FINAIS
A ESPIRal medalhística de marcelo. Banalizar a instituição Presidência da República e as suas expressões não é bom para a República. Marcelo parece determinado em prosseguir a deriva. Agora com as condecorações generalizadas a propósito de Abril. É igual cumprir e derivar do cumprimento, incumprindo? Que sinal para a sociedade?
OS AFIAMBRADOS DO COSTUME. A pequenez é um exercício de liberdade de expressão. Em Portugal, temos algumas figuras públicas que estão sempre na mira para dar expressão ao desporto nacional do afiambramento. Por tudo e por nada, à primeira oportunidade, essas personagens, por mais diversos que sejam os sinais, levam. O Secretário Geral da ONU, António Guterres, e Cristiano Ronaldo, são alguns dos que estão sempre na mira. E liberdade para fazer mais e melhor? Não?
O QUE ELES ANDAM PARA AQUI A FAZER. Bem sei que em perda, soa sempre a desculpa, mas o que a Federação Portuguesa de Futebol e a Liga Portugal andam para aí fazer, por ação e por omissão, só pode dar disparate. A falta de critérios de arbitragem, de senso e de sentido de defesa do fenómeno desportivo só acaba quando ocorrer uma fatalidade? A geometria variável do critério, que já se instalara nos media, é agora uma praga generalizada. É miserável!