O desenvolvimento e a predominância clara das energias renováveis sobre as fontes fósseis ou ambientalmente insustentáveis, são já condições críticas para que o planeta continue a ser adequado à propagação e ao desenvolvimento da espécie humana e de muitas outras espécies que asseguram a sua biodiversidade. A maturidade tecnológica destas energias tem evoluído de forma extraordinária nas ultimas décadas, mas no domínio do armazenamento e distribuição ainda faltam dar passos muito importantes para aumentar a elasticidade da oferta perante as variações da procura.
O pico global de procura de energia em resultado da recuperação económica que se seguiu ao aliviar da pressão pandémica fez aumentar substancialmente os preços de mercado e em consequência, todos os custos associados às cadeias globais de produção e distribuição, gerando tensões inflacionistas e contribuindo para algumas roturas nos sistemas de abastecimento.
A crise global da energia e o primeiro impulso para o aumento significativo do seu preço de mercado é anterior à invasão da Ucrânia pela Federação Russa. Sem esse contexto de pressão sobre o preço e sobre a procura de energias fósseis de transição, Putin não teria concretizado a invasão, que sabemos hoje partiu de pressupostos errados sobre a capacidade de resistência do povo ucraniano e dos seus aliados, mas que continua a contar com o acesso à energia russa como uma das mais potentes armas de financiamento da ação e de condicionamento da reação.
Esta guerra tem muitos e complexos fundamentos ideológicos e geopolíticos, mas no plano económico é em larga medida resultado da dependência do ocidente, em particular dalguns países da UE com a Alemanha à cabeça, em relação ao gás Russo, e sendo assim, o seu vencedor final será também quem for mais resiliente a travar o braço de ferro sobre o acesso ou o bloqueio do acesso a esse gás e sobre todos os impactos sociais, económicos e políticos das diferentes decisões.
Dito isto, e ciente do profundo significado do ditado que nos diz que “em tempo de guerra não se limpam armas” compreendo que a decisão de embargar o gás russo tem que ser tomada o mais depressa possível, pelo brutal financiamento da guerra que proporciona ao invasor, mas também tenho consciência que no momento em que for concretizada tem que ter como suporte um plano articulado de contingência, que mitigue os impactos nos mais vulneráveis e contraponha aproveitamentos perigosos como o que por exemplo Marine Le Pen está a ensaiar nas Presidenciais Francesas e Orban concretizou em pleno nas eleições húngaras.
Estamos como sempre estivemos, mas ainda de forma mais clara nesta situação de conflito, ligados à corrente. Lidar com altas voltagens implica cuidados extremos. Embargar a energia russa é fundamental e urgente para defender a liberdade e a soberania, mas a fatura não pode ir só para alguns e sobretudo não pode ser passada sem salvaguardar os mais vulneráveis e desprotegidos, sob pena do apoio massivo dos cidadãos europeus à causa ucraniana ser posta em causa por populistas sem freio que foram sendo colocados no terreno para encandear a democracia na primeira oportunidade.