do alto da minha varanda vejo o sado. Do alto da minha varanda vejo as casas brancas de Alcácer e os arrozais. Do alto da minha varanda só não vejo o mundo inteiro por causa da curva loxodrómica. Do alto da minha varanda vejo este país de merda. Não leves a mal Portugal. Sempre nos demos bem. De todo o dinheiro que ganhei, dei-te metade. Ou mais.
Estamos quites? Tens sol e mar, obrigadinho. Tenho milhares de amigos que são teus filhos, mas isso é apenas uma migalha no meio de onze milhões de invejosos e infames. Vejo-te adorar deuses de papel e fico triste. Já não há Gamas nem Albuquerques, já não há um desígnio de Índia, essa sim, minha mãe, meu pai, minha primeira grande verdade onde espero morrer um dia. A tua Justiça velhaca perseguiu-me de cada vez que escrevi a verdade e ficou do lado dos criminosos.
Essa instituição bacoca, mazomba e fascista a que chamas Ministério Público e continua inimputável, sentando-se ao lado do juiz nos julgamentos como que para nos esfregar na cara a falta de equidade dos nossos tribunais, permitiu que durante dez anos me roubassem uma filha. Francisca, minha estrela de olhos azuis como os da tua bisavó Manuela, um dia olharás à volta, para toda a tua família falsa e feia, que foi em rebanho desprezível de cabrestos às ordens da tua mãe, que é a expressão mais concreta do ódio, mentir em tribunal, e perguntarás. “Por que é que não sou parecida com nenhum de vocês?”
Não é apenas a genética, céu de toda a minha inocência, é o íntimo execrável da maldade onde cresceste à sombra de uma marioneta de pai de faz-de-conta e sem dignidade. Ah, pois. Pergunto eu a este Portugal de três sílabas de plástico para ser mais barato, como dizia O’Neill, devo-te o quê? O sofrimento cáustico e diário da tua absoluta ignorância e do teu desprezo canalha? Devo-te o Sol que nem sequer é teu? Da minha varanda vejo o Sol. E oSol entra em mim e em mim fica como o consolo quente de um país tão profunda e maldosamente triste, cujas leis permitem que se roubem filhos aos pais. Como se o sofrimento tivesse fundo…