Hoje, pelas 19h00 do Qatar (18h00 CET, segundo a FIFA, Central European Time), isto é, 17h00 no Portugal Continental, felizmente agora abençoado por aquilo que nós chamamos de horário de Verão, Portugal entra na tômbola da mais um sorteio de uma fase final do Campeonato do Mundo de Futebol, o oitavo da sua história, o que pode não ser tão impactante como isso, mas sexto consecutivo, o que quer dizer que não falha desde o já longínquo ano de 1998.
Tudo terá lugar no Exhibition and Convention Center de Doha (que parece suster-se em ramos de árvores), essa espécie de floresta de arranha-céus espelhados debruçada sobre uma das baías do Golfo Pérsico, quase face a face com Abu Dhabi, outro dos gigantes de ferro forjado desta Arábia super-capitalista, onde numa noite de Sharezades, com milhões de estrelas no céu, em Aspire Park, me puseram na frente uma bossa de camelo guisada que tinha o perfume do cravinho e uma percentagem de gordura capaz de obrigar um urso a usar fio dental. Não sei se a bossa era nova, mas sabia a velha. Não fiquei adepto. Comi heroicamente como cabe a alguém que se chama Afonso, nome que Albuquerque espalhou por essa zona do mundo colada ao verbo pavor. Não havia como recusar.
Pois muito bem, hoje, 29 dos 32 finalistas do próximo Mundial vão saber quem lhes toca pela frente na fase de grupos da competição que terá início no próximo dia 21 de Novembro, 13 horas locais, no Estádio de Al Bayt, em Al Khor, imaginem só quanta água correrá dos rios para o mar até lá.
Sabe-se que, por ser país organizador, o Qatar terá o direito de ser a equipa 1 do Grupo A. Em seguida, tomam posse como cabeças de série os melhores sete qualificados instalados no topo da tabela do ranking da FIFA publicado a 31 de Março, ou seja, ontem. E aí, Portugal puxa dos galões e cumpre o seu papel, juntamente com Bélgica, Brasil, França, Argentina, Inglaterra e Espanha. Aqueles com que, de certeza, não irá jogar para já. A Itália também está no topo do ranking, mas como resolveu não ir, não conta. Como a Europa pode e manda e, assim sendo, apurou 13 selecções, não é possível cumprir (só em relação aos europeus, atenção!) a regra básica de que equipas do mesmo continente sejam sorteadas para o mesmo grupo. É o que dá ter mais olhos do que barriga.
Grupos
Os grupos da primeira fase vão do A ao H. Se os cabeças-de-série estão aí, publicados supra, o Pote Dois será ocupado, como é óbvio, pelas equipas seguintes da tal classificação no ranking: Dinamarca, a nona, logo atrás de Portugal, Holanda (que se quilhe lá isso dos Países Baixos), Alemanha, Suíça, Uruguai e Croácia, para já. O Pote Três conta com Irão, Japão, Sérvia, Polónia, Japão, Coreia do Sul e Marrocos, idem. O pote 4 é para os que sobram: Equador, Arábia Saudita, Gana e Camarões. Isto assim muito por alto. Por exemplo, Senegal e_Canadá tanto podem ir parar aos potes 2 e 3 ou 3 e 4, respectivamente. Isto porque ainda há mais play-offs para decidir, agora que os play-offs são uma éspécie de pão nosso de cada dia. Um deles porá frente a frente o segundo melhor classificado da Confederação a América do Norte, Central e Caraíbas (a sair de Estados Unidos, México ou Costa Rica) com o vencedor da finalíssima da Oceânia, entre Nova Zelândia e Ilhas Salomão. O segundo está à espera que as coisas se acalmem na Ucrânia de forma a que, finalmente, o Escócia-Ucrânia que já devia ter tido lugar há uma semana possa decidir face ao País de Gales o último apurado europeu. Finalmente, o último play-off asiático, entre Austrália (que resolveu mudar de continente sob benção da FIFA) e Emirados Árabes Unidos, ditará o adversário do último dos possíveis classificados da América do Sul, o Peru.
Fazer prognósticos com bolinhas que rodam dentro de uma espécie de aquários é coisa que não cabe na cabeça de ninguém. Aliás, sorteio é sorteio, venha quem vier, Portugal sabe, neste momento, que vai ter de garantir um dos primeiros dois lugares do grupo em que calhar para poder seguir para o tal mata-mata de que Luiz Felipe Scolari gostava de falar. Lembram-se do Oliveira da Figueira, essa curiosíssima personagem dos livros do Tintin, portuguesinho de gema capaz de vender dunas no deserto em O País do Ouro Negro? Essa sim, é a figurinha mais provável que nos surgirá pela frente a todos os que, daqui a oito meses entrarmos de peito aberto na grande aventura de seguir um Mundial num país com 11.437km2. Ou seja, praticamente um terço do Alentejo…