Aceitemos a realidade em toda a sua fria crueza – os anjos não têm sexo, mas têm papos. Vinicius de Moraes, por exemplo, era louco por papos-de-anjo. Um dia escreveu numa crónica de jornal: “A melhor coisa do mundo é comer um papo-de-anjo tendo ao lado a mulher amada”. Ruben Braga, que também era um daqueles cronistas de mão cheia, resolveu responder-lhe no Diário de Pernambuco, título que ele própria havia fundado: “O Vinicius está gagá. Então não é muito melhor comer a mulher amada tendo ao lado um papo-de-anjo?”
De mulheres amadas não escrevo aqui, talvez por um certo pudor, talvez para evitar ferir suscetibilidades. De papos-de-anjo não percebo grande coisa, apenas que ainda sinto água a crescer na boca ao recordar-me dos que o grande Oliveira, do Farta Brutos, nos trazia num carrinho de sobremesas que eram, elas todas, uma espécie de provocação ao pecado mortal da gula. Hoje em dia, muito provavelmente, Vinicius seria esculhambado na rua como pedófilo por causa de uma garota de 17 anos chamada Heloísa Eneida Menezes Paes Pinto, 1,69 de altura, olhos verdes como o mar, cabelos negros de azeviche, mais conhecida por Helô – por extenso, Garota de Ipanema. Ele sempre disse que escreveu uma letra não sobre um homem enrabichado por um traseiro bamboleante mas sobre como aquele bumbum lhe fazia lembrar as ondas mar. Helô ia todos os dias comprar tabaco para o pai numa quitanda que ficava junto ao boteco em que Vinicius e Tom Jobim sorviam chopes em quantidades federais. Mas Vinicius também nunca escondeu o seu interesse estudioso por glúteos: “Nádegas é importantíssimo! Grave, porém, é o problema das saboneteiras. Uma mulher sem saboneteira é como um rio sem pontes”. Ao que Rubem Braga bem podia ter respondido: “Ah, que vontade de escrever bobagens bem meigas, bobagens para todo mundo me achar ridículo…” Fizeram o seu esforço. Tanto um como o outro.