Lazio. Como nunca se vira desde o século dezanove

Lazio. Como nunca se vira desde o século dezanove


Os italianos jogam amanhã no Porto, frente ao FC Porto. A sua primeira visita a Portugal também foi às Antas, em 1977, mas para defrontar o Boavista.


No dia 14 de setembro de 1977, o Boavista, que cumpria a sua terceira presença nas taças europeias, depois de duas razoáveis prestações nas duas épocas anteriores, deparava-se pela primeira vez com um adversário italiano. Precisamente a Lazio, que joga amanhã outra vez no Porto, desta vez contra o FC Porto, para a Liga Europa. Até aí, os axadrezados tinham sempre ultrapassado a primeira eliminatória – em 1975-76 na Taça das Taças frente ao Spartak Trnava (3-0 e 0-0) e 1976-77, também na Taça das Taças, face ao CSU Galati (2-0 e 3-2). Cabia-lhe agora um osso mais duro de roer logo na primeira eliminatória da Taça UEFA, a Lazio, de Roma, comandada por um treinador brasileiro, Luís Vinícius de Menezes, que chegara a Itália como jogador em meados dos anos-50 e nunca mais deixara o país. Na época anterior ficara-se pelo quinto lugar da Série A (o último a dar acesso à Europa) mas regozijara-se por ter dado acesso à equipa principal a três jovens talentos das escolas do clube, Bruno Giordano, Lionello Manfredonia e Andrea Agostinelli. Não era, decididamente, uma equipa com grande experiência internacional. Depois da presença, em 1950, na Taça Latina, surgira esporadicamente nas Taças das Cidades com Feira em 1970-71 (afastada logo na primeira ronda pelo Arsenal) e nas Taças UEFA de 1973-74 e 1975-76, sem passar da segunda eliminatória. Também não seria esse ano de 1977 que o faria, caindo aos pés do Lens, mas em setembro, quando veio a Portugal, não podia sabê-lo.

Treinado por Fernando Caiado, o Boavista, perante a exiguidade do Bessa de então, preferiu pedir as Antas emprestadas. Vinicius, por seu lado, avisou de véspera que não viria a Portugal jogar na retranca, como a imprensa nacional anunciava aludindo ao tradicional cattenacio. Disse e cumpriu. A Lazio cedo tomou conta do jogo e exigiu a máxima atenção de uma defesa porfiada composta pelo guarda-redes Sousa mais Trindade, Mário João, Artur e Alberto. Confiava Caiado no contra-golpe e, sobretudo, na velocidade de Albertino e de Moinhos. Foi precisamente Albertino que construiu o lance concluído pelo brasileiro Jorge Gomes, aos 36 minutos. Depois foi preciso resistir e muito. À italiana, se calhar. Mas o resultado não se moveu.

A goleada Satisfeitos, naturalmente, no final do encontro, os axadrezados sentiam que poderiam discutir a eliminatória no Olímpico de Roma. Ninguém poderia tirar-lhes tal sonho.

Fernando Assis Pacheco, um dos meus queridos mestres do jornalismo, esteve no jogo da segunda mão, no dia 29 de setembro. A equipa das camisolas esquisitas, como lhe chamou um dia Walter Zenga, guarda-redes do Inter, foi espezinhada por 5-0. Logo aos 7 minutos, já Lorenzo Garlaschelli fazia o 1-0 e igualava a eliminatória. Depois, os italianos foram por ali fora: 2-0, Bruno Giordano (13), 3-0, Garlaschelli (20); 4-0, Bruno Giordano (53) e 5-0 outra vez por Bruno Giordano (87), a grande figura da equipa que se manteria fiel à Lazio durante dez anos antes de ser contratado pelo Nápoles e jogar ao lado de Maradona.

Assis Pacheco tinha um chiste muito particular na sua escrita. E deixou ficar registado: “No final, os dirigentes romanos diziam aos homens do Porto – ‘auguri’ (felicidades). Uma saudação mecânica, um abraço de plástico encenado sobre a consternação de homens como o capitão Valentim Loureiro, dirigente com anos de prática, ou, exemplo mais próximo da relva, Alberto, o licenciado em economia que fez de ‘stopper’ dos portugueses sem grandes possibilidades de travar a porfiada ofensiva dos ‘lazialli’. Perguntei a um colega italiano: ‘Há quantos anos a Lazio não marca cinco golos?’ Respondeu-me, encolhendo os ombros: ‘Para aí desde o século dezanove!’”

Para os romanos, a eliminatória seguinte seria, no mínimo, macabra. Depois de terem vencido o Lens, em casa, por 2-0, foram enxovalhados em França sem piedade: 6-0!