Parecendo no início que todas as forças políticas dispensavam eleições antecipadas quando, no final da campanha, parecia que todos as desejaram, a verdade é que poucas vezes como agora se acentuaram fenómenos raramente registados em actos precedentes.
Desse ponto de vista, terá sido positiva a consulta popular, actualizando métricas colectivas quanto à composição, base de apoio e formação de um novo governo, quanto à mudança de matriz na afectação de recursos a favor do Estado, em detrimento dos bolsos dos contribuintes e dos cofres das empresas.
Olhemos para algumas relevâncias deste período eleitoral:
– O primeiro, a conjugação entre a vontade de afirmação dos partidos representados escassamente na Assembleia e a novidade e variedade das suas mensagens, capaz de afirmar um bloco à direita com direcção e pluralismo.
Daí a surpresa do ainda primeiro-ministro, depois de ziguezagues estratégicos, ter chegado à conclusão que os astros se tinham concertado e que, defenestrada a matriz do combate pela maioria absoluta, ainda ficava uma alternativa de governo à direita.
Por outro lado, constituiu nota de bizarria eleitoral, a chamada “invenção da proximidade”, entre partidos de nenhuma coincidência doutrinária e histórico/conjuntural, aliás negada pelos próprios.
– O segundo, passou pelo estabelecimento de uma narrativa clara e natural, mas alternativa, entre António Costa e Rui Rio.
Poucos ficaram com dúvidas quanto aos mundos diferentes que representam. A forma como de um lado se continua a querer assentar a vida em sociedade com efeito na “riqueza” retirada aos cidadãos, tudo dirigido pelo poderosíssimo Estado; ao mesmo tempo que houve a coragem de proclamar a prevalência da sociedade focada no investimento e na criação de riqueza, como condição prévia à distribuição subsequente daquilo que se cria e não do que se pede emprestado.
– O terceiro aspecto diz respeito a um fenómeno de concorrência de partidos e propostas que não se tinha sentido antes. Olhando a redução que era feita ab initio acerca de qualquer discussão sobre liberalismo, tem a maior relevância o que foi alcançado a este nível, acentuando a carga ideológica/doutrinária, pela primeira vez de uma forma consolidada e compreensível.
Deste ponto de vista, o acto eleitoral de ontem, pode ter sido um ponto de viragem num certo imobilismo de projecto do regime que se sentia há muito e no acolhimento de que uma certa prevalência do discurso de esquerda terminou.
Fica por saber e hoje será claro se Portugal irá mudar a partir das pessoas e das ideias, ou se os portugueses assistem rendidos ao entardecer da nossa sociedade.
O balanço final de sexta-feira não pareceu deixar dúvidas.
Em certo sentido a um Portugal de bancos alimentares consolidados e bancos fiduciários falidos, outra via terá que acontecer e destas eleições terá saído.
Covilhã, janeiro de 2022