Sergio Mattarella, de 80 anos, não fazia questão de ser reeleito como Presidente italiano, mas lá aceitou, após os partidos não se entenderem quanto a quem seria o seu sucessor. O complexo sistema de eleição presidencial de Itália – onde, ao contrário da maior parte das democracias, não existe uma eleição direta, havendo um colégio eleitoral, composto por 1009 deputados, senadores ou representantes regionais – ficou bloqueado, sem qualquer candidato que conseguisse apoio suficiente, até Mattarella aceitar manter-se no seu posto. Mas a disputa foi amarga, ameaçando quebrar a coligação entre os populistas do Movimento Cinco Estrelas (M5S), e o Partido Democrático (PD), de centro-esquerda.
Já o primeiro-ministro Mario Draghi, um tecnocrata que tem a ingrata tarefa de manter a parceria entre os dois partidos, viu-se em maus lençóis. Até Mattarella reconsiderar, Draghi até era um dos poucos candidatos com uma hipóteses série de chegar ao posto de Presidente, que é sobretudo cerimonial, mas vem com um mandato de sete anos. Draghi acabaria por ser derrotado quando até boa parte dos seus apoiantes consideraram que fazia mais falta à frente do Governo, para supervisionar a recuperação da pandemia.
Em vez de conseguir a presidência, Draghi – que até se tentava apresentar como novo rosto da Europa, rivalizando com o Presidente Emmanuel Macron, após a saída de cena de Angela Merkel – deu por si a liderar um Governo muito mais vulnerável, após umas presidenciais que deixaram o M5S à beira de eleições internas, que podem acabar com a rutura da sua coligação de Governo.
As negociações para as eleições presidenciais italianas são sempre descritas como sendo cheias de maquinações maquiavélicas, orquestradas nos gabinetes do Parlamento, mas também nos restaurantes e bares em redor, à porta fechada. Mas desta vez foi particularmente duro e cheio de reviravoltas, levando a imprensa italiana a apelidá-las de “Quirinale Games” – referência ao palácio presidencial – em homenagem da popular série Squid Game, da Netflix.
No final de contas, Mattarella, uma figura muito popular em Itália, relutantemente obteria 759 votos, este sábado, bem mais que os 505 de que precisava para ser reeleito. “Um enorme obrigado ao Presidente Mattarella pela sua generosa escolha”, declarou o líder do PD, Enrico Letta, grande impulsionador da recandidatura do Presidente.
Mattarella fora apresentado como uma solução para garantir estabilidade política, mas o estrago pode ter sido demais. “A questão é se o ingrediente chave do Governo de Draghi – uma ampla maioria, com vários partidos – ainda lá estará daqui a uns dias”, salientou Francesco Galietti, da consultora Policy Sonar, à AFP. “Se não, a situação rapidamente se tornará insustentável”, alertou.
Já a direita italiana não está muito mais estável que o Governo. O antigo primeiro-ministro Silvio Berlusconi ainda foi apontado como uma solução de unidade da extrema-direita ao centro-direita,, mas não se entenderam, deixando este campo ainda mais dividido.