A menos de um ano do Mundial do Qatar, um treinador português, Luís Manuel Ribeiro de Castro, está no centro dos acontecimentos. Aos 60 anos, e após a experiência ucraniana do Shaktar Donetsk, Luís Castro simplesmente, que é como todos o conhecemos, e eu o conheço desde que jogou e treinou o que será sempre o nosso Recreio de Águeda, aceitou o convite do Al-Duhail Sports Club, de Doha – para quem conhece o Qatar, há que convir que quase tudo fica em Doha, a capital. Neste momento, a equipa encontra-se no segundo lugar do campeonato (a Q-League), mas a seis pontos do líder, o Al-Saad. Hoje, defronta o Al Ahli na 11ª jornada de uma prova que é composta por doze clubes, um número substancial para um país que tem somente 11.437 quilómetros quadrados e 2,8 milhões de habitantes, sendo que apenas 313.000 são qataris e todos os restantes trabalhadores estrangeiros. Como, afinal, o Luís também é…
Como te tens estado a dar com a vida no Qatar?
Olha, eu e a minha equipa técnica estamos a dar-nos bem com aquilo que viemos encontrar aqui, no Qatar. É um país muito seguro. Sente-se essa qualidade a qualquer altura do dia. Além disso, o clube tem condições, os espaços para treinarmos são bons. Depois viemos deparar com um país onde se respira muito futebol, agora com a construção de grandes estádios, infraestruturas preparadas para o Mundial que está à porta.
Sentes que caíste para um futebol menos competitivo?
Sim. Não podemos dizer que a competitividade do futebol noQatar se aproxime da competitividade de muitos dos países da Europa, mas estamos a viver a experiência de lutarmos para sermos campeões aqui, jogámos a Liga dos Campeões Asiática, lutamos pela Taça do Emir, lutamos pela Taça doQatar, como vês temos muitas competições. E apesar desse lado menos competitivo de que falas, temos de nos focar na competitividade que nós queremos atingir e a que nos exigimos. Por isso, não quero sentir que diminui a competitividade, mas aceito que há menor qualidade num ou outro jogo. Naturalmente.
Estás no centro do futuro Campeonato do Mundo. Isso nota-se no dia-a-dia?
Sim, sim. É como estarmos no centro do mundo, nesse aspecto. As pessoas que visitam o Qatar querem saber como estão as coisas, há visitas oficiais para que os responsáveis se possam inteirar da evolução que existe para o Campeonato do Mundo. Ainda agora, na Taça Árabe, foram inaugurados estádios novos, puderam ser ajustados ao que vai ser necessário para o ano. Sim, não restam dúvidas que sentimos claramente estarmos no sítio onde se vai realizar o próximo Mundial.
Já tiveste a oportunidade de jogar nos novos estádios?
Nós não jogamos nos novos estádios. Eles foram testados na competição que eles chamam Arab Cup, a Taça da Arábia, e depois só voltarão a ser utilizados durante o Campeonato do Mundo.
Mas já os visitaste? Que tal?
Têm condições óptimas! São infraestruturas fantásticas. Tive a oportunidade de os visitar durante a Arab Cup. Os parques de estacionamentos ficam longe, tomamos um “tram” para irmos diretos para os recintos, todas as indicações são-nos dadas por voluntários de extrema simpatia. Tudo muito bem organizado. Muito bom! Vai correr bem no Mundial.
(A Arab Cup-2021 decorreu entre 30 de novembro e 18 de dezembro, altura para a qual o Mundial está agendado. Estiveram em prova 16 seleções, jogando em seis estádios diferentes, e foi a 10.ª edição da prova. A vitória final coube à Argélia que venceu a Tunísia na final. OQatar conseguiu o terceiro posto à custa do Egipto, agora treinado por Carlos Queiroz).
Achas que há condições para um bom Mundial num país tão pequeno?
O país é, de facto, pequeno, mas também muito sui generis. Vamos ter um Campeonato do Mundo no qual a maior distância entre dois estádios não vai ultrapassar os 70 quilómetros. Só em Doha há seis estádios. Algo de fantástico. Pensar que as pessoas vão poder saltar de um jogo para o outro numa questão de minutos é excitante, do ponto de vista dos espetadores que vão poder ver mais do que um jogo por dia. Todas as condições que este país oferece são muito boas. Vai ser um grande Mundial! Não tenho dúvida nenhuma!
E a questão das restrições não vai criar problemas com os adeptos?
Sinceramente, acho que nessa altura da vida do país as autoridades vão condescender um pouco. Vão existir todas as condições para que a parte cultural seja gerida de forma equilibrada. Vai haver certamente um entendimento tanto dos países que vão ter adeptos que nos visitem como do próprio governo do Qatar.
Como caracterizarias o nível do futebol do Qatar?
A seleção do Qatar já fez uma boa grande competição internacional (foi campeã asiática em 2019), participou na Golden Cup (Campeonato da América do Norte, Central e Caraíbas), fez parte do grupo de Portugal de qualificação para o Mundial, acabou de fazer uma boa Taça Árabe. Tem crescido claramente em termos competitivos, isso não se discute. Agora, claro, um Campeonato do Mundo é outra coisa, é preciso atingir níveis muito altos. A nível interno, o campeonato é renhido, há bons treinadores. Diria que já tem um nível muito interessante.
Como viste a derrota da seleção que pode pôr a presença do Mundial em risco?
A nossa seleção tem, agora, um caminho difícil. Mas é um caminho possível. Temos quatro seleções para um lugar mas eu sempre fui muito otimista em relação ao trabalho que se faz na nossa equipa e vou continuar a ser otimista. A qualidade da equipa e a qualidade de toda a estrutura da Federação Portuguesa deFutebol vai fazer com que Portugal esteja presente no Mundial do Qatar.
Tens contrato até junho – pões a hipótese de ficar?
Pois… Nós, treinadores, nunca sabemos o que vai acontecer à nossa vida. Fiz contrato só de um ano por ser um futebol, para mim, desconhecido. Não podia nem queria arriscar vir para uma zona que não conhecia no mundo com vínculo maior. Ia ficar refém do contrato, se não gostasse. Agora, neste momento estamos a meio da época. Ponho todas as hipóteses em cima da mesa.
O que é que mais te agrada aí?
O que mais me agrada aqui é a forma segura como se vive. A forma amigável como as pessoas nos tratam e nos respeitam. A qualidade de vida do país, que é grande. A cidade de Doha é óptima e vivemos o dia-a-dia com enorme tranquilidade. Luís, o treinador que no Shaktar, venceu o Real Madrid em dois jogos da Champions, vive agora a experiência exótica de um país que é um terço do Alentejo.