A junção da Justiça com a Administração Interna


A junção da Justiça com a Administração Interna é extremamente perigosa para o Estado de Direito, precisamente pela confusão que estabelece entre valores fundamentais do Estado, como a Justiça e a Segurança, que muitas vezes conflituam entre si.


A demissão do Ministro da Administração Interna, depois da conclusão do inquérito do Ministério Público relativo ao acidente na A6, determinou uma remodelação do Governo, feita a dois meses das eleições legislativas, passando a Ministra da Justiça a acumular simultaneamente a pasta da Administração Interna. 

Provavelmente essa junção foi sempre uma possibilidade considerada pelo Primeiro-Ministro que já em Fevereiro de 2015, antes das eleições que lhe permitiram formar o seu primeiro Governo, salientava as vantagens da junção das duas pastas num mesmo Ministério, em ordem a ter sob a mesma tutela a Polícia Judiciária, que depende do Ministério da Justiça, e a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, que dependem do Ministério da Administração Interna.

No entanto, quando formou Governo no final de 2015, António Costa não concretizou essa solução, colocando Constança Urbano de Sousa como Ministra da Administração Interna e Francisca Van Dunem como Ministra da Justiça. Em Outubro de 2017, depois dos incêndios de Pedrógão Grande que determinaram a demissão de Constança Urbano de Sousa, António Costa voltou a não juntar os dois Ministérios, optando por nomear Eduardo Cabrita, então Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, para o lugar de Ministro da Administração Interna.

Agora, com a demissão de Eduardo Cabrita, António Costa determina finalmente a acumulação das pastas da Justiça e da Administração Interna, com a escolha da Ministra da Justiça para ocupar também a pasta da Administração Interna. Nas justificações que deu para essa escolha, o Primeiro-Ministro salientou que a Ministra da Justiça teria “larga experiência na Administração Interna”, uma vez que “durante toda a sua vida, na qualidade de magistrada, teve uma relação muito próxima com as forças de segurança”.

Para além disso, “ao nível europeu, partilha o Conselho da Justiça e dos Assuntos Internos com o Ministro da Administração Interna”, pelo que “com facilidade, vai assumir a pasta da Administração Interna por um período de quase dois meses até às eleições. Depois disso, teremos um novo modelo de Governo, mais curto, mais ágil, mais adequado aos tempos que estamos a viver”.

Estas justificações do Primeiro-Ministro dão a entender que a junção da Justiça com a Administração Interna é uma solução para continuar no futuro, no tal “novo modelo de Governo, mais curto, mais ágil”. Só que a junção da Justiça com a Administração Interna é extremamente perigosa para o Estado de Direito, precisamente pela confusão que estabelece entre valores fundamentais do Estado, como a Justiça e a Segurança, que muitas vezes conflituam entre si. Precisamente por esse motivo, os magistrados não devem ter “uma relação muito próxima com as forças de segurança”, até porque podem ter que investigar abusos policiais e violações de direitos humanos cometidos por essas forças.

E muito menos deve estar sob a tutela da mesma Ministra a Polícia Judiciária, que tem funções de investigação criminal, e a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, que têm por função garantir a segurança e a ordem pública. Imagine-se a imagem que passaria a nível internacional se ocorresse neste momento um episódio como a morte do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk nas instalações do SEF. A primeira coisa que se salientaria a nível mundial seria que a autoridade policial que iria investigar o crime e a autoridade policial sob investigação tinham exactamente a mesma tutela governamental.

O país vai viver durante dois meses num estado de excepção atípico, com um parlamento dissolvido, incapaz de fiscalizar a actividade do Governo, que se mantém na plenitude de funções. Agora ficam nas mãos da mesma Ministra as competências para assegurar a ordem pública e as competências governamentais relativas à justiça, que deve precisamente defender os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos neste período tão complexo. Manifestamente que esta não parece ser uma solução adequada para o regular funcionamento das instituições democráticas em Portugal.

A junção da Justiça com a Administração Interna


A junção da Justiça com a Administração Interna é extremamente perigosa para o Estado de Direito, precisamente pela confusão que estabelece entre valores fundamentais do Estado, como a Justiça e a Segurança, que muitas vezes conflituam entre si.


A demissão do Ministro da Administração Interna, depois da conclusão do inquérito do Ministério Público relativo ao acidente na A6, determinou uma remodelação do Governo, feita a dois meses das eleições legislativas, passando a Ministra da Justiça a acumular simultaneamente a pasta da Administração Interna. 

Provavelmente essa junção foi sempre uma possibilidade considerada pelo Primeiro-Ministro que já em Fevereiro de 2015, antes das eleições que lhe permitiram formar o seu primeiro Governo, salientava as vantagens da junção das duas pastas num mesmo Ministério, em ordem a ter sob a mesma tutela a Polícia Judiciária, que depende do Ministério da Justiça, e a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, que dependem do Ministério da Administração Interna.

No entanto, quando formou Governo no final de 2015, António Costa não concretizou essa solução, colocando Constança Urbano de Sousa como Ministra da Administração Interna e Francisca Van Dunem como Ministra da Justiça. Em Outubro de 2017, depois dos incêndios de Pedrógão Grande que determinaram a demissão de Constança Urbano de Sousa, António Costa voltou a não juntar os dois Ministérios, optando por nomear Eduardo Cabrita, então Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, para o lugar de Ministro da Administração Interna.

Agora, com a demissão de Eduardo Cabrita, António Costa determina finalmente a acumulação das pastas da Justiça e da Administração Interna, com a escolha da Ministra da Justiça para ocupar também a pasta da Administração Interna. Nas justificações que deu para essa escolha, o Primeiro-Ministro salientou que a Ministra da Justiça teria “larga experiência na Administração Interna”, uma vez que “durante toda a sua vida, na qualidade de magistrada, teve uma relação muito próxima com as forças de segurança”.

Para além disso, “ao nível europeu, partilha o Conselho da Justiça e dos Assuntos Internos com o Ministro da Administração Interna”, pelo que “com facilidade, vai assumir a pasta da Administração Interna por um período de quase dois meses até às eleições. Depois disso, teremos um novo modelo de Governo, mais curto, mais ágil, mais adequado aos tempos que estamos a viver”.

Estas justificações do Primeiro-Ministro dão a entender que a junção da Justiça com a Administração Interna é uma solução para continuar no futuro, no tal “novo modelo de Governo, mais curto, mais ágil”. Só que a junção da Justiça com a Administração Interna é extremamente perigosa para o Estado de Direito, precisamente pela confusão que estabelece entre valores fundamentais do Estado, como a Justiça e a Segurança, que muitas vezes conflituam entre si. Precisamente por esse motivo, os magistrados não devem ter “uma relação muito próxima com as forças de segurança”, até porque podem ter que investigar abusos policiais e violações de direitos humanos cometidos por essas forças.

E muito menos deve estar sob a tutela da mesma Ministra a Polícia Judiciária, que tem funções de investigação criminal, e a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, que têm por função garantir a segurança e a ordem pública. Imagine-se a imagem que passaria a nível internacional se ocorresse neste momento um episódio como a morte do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk nas instalações do SEF. A primeira coisa que se salientaria a nível mundial seria que a autoridade policial que iria investigar o crime e a autoridade policial sob investigação tinham exactamente a mesma tutela governamental.

O país vai viver durante dois meses num estado de excepção atípico, com um parlamento dissolvido, incapaz de fiscalizar a actividade do Governo, que se mantém na plenitude de funções. Agora ficam nas mãos da mesma Ministra as competências para assegurar a ordem pública e as competências governamentais relativas à justiça, que deve precisamente defender os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos neste período tão complexo. Manifestamente que esta não parece ser uma solução adequada para o regular funcionamento das instituições democráticas em Portugal.