Porque faltam professores nas escolas?


Há anos que sucessivos documentos do PS e do Governo prometem estudos sobre a sustentabilidade da carreira docente. É uma proposta requentada para todas as ocasiões mas completamente desacreditada por um ministro que ainda no ano passado considerava a substituição de professores como “necessidades pontuais”


A resposta é complexa mas não é desconhecida. Uma combinação explosiva de envelhecimento da classe docente, desvalorização da carreira e precarização dos professores mais jovens tem vindo a criar uma bomba relógio. À depreciação dos professores nas escolas, da sua autonomia, da sua especialidade, e retribuição justa do seu trabalho, corresponde a falta de reconhecimento social que é necessária para atrair novos profissionais. O processo é palpável, concreto e perigoso.

Ninguém se devia encostar à proteção de um passado em que esta desvalorização social foi deliberada e calculada a partir da Av. 5 de Outubro (onde durante muitos anos esteve instalado o Ministério da Educação). É evidente que houve aqui muita gente que se enganou e perdeu o controle da situação.

Não pretendo fazer arqueologia e por isso vou cingir-me aos mais recentes. Em 2012, o anterior ministro Nuno Crato afirmou numa entrevista que havia professores a mais e a sua redução seria inevitável. É justo reconhecer que se esforçou por isso: o Tribunal de Contas identificou que “entre os anos letivos de 2010/11 e de 2014/15 a redução de pessoal docente alcançou 21,1%, em especial devido à quebra em mais de metade do número de contratados, de 33.413 para 14.496 (56,6%)”. Também recordo quando a nova maioria travou no Parlamento a ideia mirabolante de “requalificar” professores com horário zero.

A memória é útil. Há quem possa achar que Nuno Crato estava inquinado por excessos troikistas mas, já em 2019, Rui Rio insistiu na ideia: “temos professores a mais, infelizmente.” O que levou então Nuno Crato a mudar de ideias e vir agora dizer, com a maior lata do mundo, que a falta de professores “é um drama anunciado há muito tempo”?

Oportunismo, certamente. Porque a realidade o desmentiu e no ano letivo 2021/22, no segundo mês de aulas, já faltavam 691 professores nas escolas de todo o país e Alemão e Latim eram as únicas disciplinas em que não havia alunos sem docente. O problema é estrutural, sistémico e tende a agravar-se.

A questão, e agora salto para o Partido Socialista, é saber porque razão o Governo não fez nada para o evitar. Nesta matéria é espúria a conversa de que o Bloco de Esquerda ou outro partido partilham responsabilidades na inação do ministro Tiago Brandão Rodrigues: sucessivos alertas, propostas, negociações, projetos de resolução e projetos de lei foram ignorados ou chumbados pelo PS. E mesmo quando o Parlamento aprovou um projeto que obrigava o ministro a negociar com os sindicatos, o Governo fez questão de requerer a sua inconstitucionalidade.

Há anos que sucessivos documentos do PS e do Governo prometem estudos sobre a sustentabilidade da carreira docente. É uma proposta requentada para todas as ocasiões mas completamente desacreditada por um ministro que ainda no ano passado considerava a substituição de professores como “necessidades pontuais” e garantia que o sistema “está oleado e a funcionar bem”.

Faltam professores por muitas razões. Isto faz com que o problema seja impossível de resolver? Não. Alterar a norma travão, fazer uma vinculação extraordinária, apoiar professores deslocados nos transportes e habitação, reconhecer direitos aos horários incompletos, diminuir a dimensão dos quadros de zona pedagógica, rever a formação inicial, permitir a progressão na carreira… são apenas algumas das soluções negadas pelo PS.

Em vez disso, Portugal está a ser alvo de um procedimento de infração por incumprimento da legislação europeia relativa à não discriminação na contratação a termo de professores nas escolas públicas. Nesta matéria, está concluído o balanço da era de Tiago Brandão Rodrigues.

 

Deputada do Bloco de Esquerda