Dean Stockwell. O ator da era clássica de Hollywood

Dean Stockwell. O ator da era clássica de Hollywood


Começou a sua carreira com apenas sete anos de idade, colecionou mais de cem filmes, afastou-se dos grandes ecrãs para se tornar hippie e chegou mesmo a trabalhar numa agência imobiliária. O astro do cinema clássico de Hollywood morreu na passada segunda-feira, deixando marcada a sua carreira de 70 anos.  


“Eu odeio admiti-lo, mas não consegues desempenhar um papel a menos que esteja algures na tua psique (mente). As pessoas não entendem o quão vasto é o subconsciente. É como o infinito”, dizia o ator americano que já possuía uma carreira de 70 anos. 

O seu nome é conhecido por várias gerações, daqueles que acompanhavam as produções cinematográficas desde a década de 40, passando pelos fãs das séries televisivas, onde integrou o elenco de clássicos da ficção, como Quantum Leap, produção dos anos 80, e Battlestar Galactica, o remake da série da década de 70, responsável por fazer nascer uma nova era da ficção científica.

Agora, Hollywood despede-se daquele que, apesar de ter sido um ícone, não teve uma carreira estável. Começando enquanto criança no universo cinematográfico, tendo depois transitado para a vida adulta continuando a aparecer na sétima arte, Dean afastou-se do cinema, tornou-se hippie e até chegou a trabalhar numa imobiliária. Com 85 anos, o artista morreu esta segunda-feira na sua casa, de causas naturais.

Uma criança talentosa Filho dos atores Harry Stockwell e Nina Olivette, e irmão mais novo de outro ator, Guy Stockwell, nascido a 5 de março de 1936, Dean Stockwell começou a representar prematuramente, com apenas sete anos.

O seu pai fazia parte da Broadway em Oklahoma!, quando ouviu falar de uma peça, Innocent Voyage, de Paul Osborne, que procurava atores infantis. Como resultado, a mãe de Stockwell levou os seus dois filhos ao casting e tanto Guy como Dean tiveram logo sucesso. Apesar da participação de Stockwell ter sido pequena e a peça ter tido um curto prazo, a sua beleza e ar angelical valeram-lhe um contrato com o estúdio MGM, o maior de Hollywood.

O MGM acabou por escalar o jovem artista para um pequeno papel em The Valley of Decision, em 1945, um melodrama popular. Tempos depois, o produtor Joe Pasternak resolveu “aumentar a fasquia”, oferecendo-lhe um papel maior em Anchors Aweigh (considerado o seu primeiro filme), onde o ator teve a oportunidade de contracenar com Frank Sinatra e Gene Kelly.

A partir daí, seguiram-se muitos outros grandes papéis: Alma Forte, em 1946, A Luz é Para Todos, em 1947, produção que ganhou o Óscar de Melhor Filme, e principalmente O Rapaz dos Cabelos Verdes, em 1948, que se revelou um importante marco contra a intolerância. 

No entanto, Stockwell achava a experiência de ser um ator difícil: “Eu não gostava de representar quando era jovem. Achava que dava muito trabalho. Claro que há filmes que gostei de gravar, a maior parte deles comédias, mas não eram filmes muito importantes… Consegui esse tipo de papéis, mas não me importei muito com eles”, afirmava o artista. E, apesar de ter continuado a carreira até à adolescência, fez uma pausa para frequentar a Alexander Hamilton High School em Los Angeles e a Universidade da Califórnia, Berkeley, cursos que também não viria a terminar.  “Estava infeliz e não me conseguia dar bem com as pessoas”, revelou mais tarde em algumas entrevistas. Durante o tempo em que frequentou a UC Berkeley, Stockwell mergulhou na música e chegou a  escrever várias pequenas composições.

Uma carreira “instável” por opção Foi em 1956, com 20 anos, que o artista resolveu regressar à representação, principalmente aos pequenos ecrãs, onde participou em A Quinta Dimensão, Alfred Hichtcock Apresenta, Matinee Theatre, Schlitz Playhouse , The United States Steel Hour, Climax! , Men of Annapolis, Cimarron City, General Electric Theatre e Wagon Train.

Contudo, foi encontrando projetos de prestígio no cinema como O Génio do Mal, em 1959, Filhos e Apaixonados, em 1960, Longa Viagem para a Noite, em 1962, e O Despertar do Amor, três anos depois, trabalhando com atores como Orson Welles, Trevor Howard, Wendy Hiller, Katharine Hepburn, Ralph Richardson, Jason Robards e Melvyn Douglas.

Pelo papel principal no filme Compulsion, em 1959, o astro recebeu o prémio de melhor ator no importante Festival de Cannes. No entanto, não foi a única vitória na categoria da aclamada premiação: pelo filme Longa Jornada Noite Adentro (1962), o artista viria a receber novamente a gratificação.

A seguir a estes sucessos, Dean abandonou a indústria cinematográfica para viver como hippie, retomando-a em 1968, com séries e alguns filmes, mas sem o mesmo fulgor artístico. “Eu usei algumas drogas e apaixonei-me muito”, contou mais tarde. “A experiência que vivi nessa fase, proporcionou-me uma visão ampla e panorâmica da minha existência que eu não tinha antes. Não me arrependo!”, revelou. 

Após trabalhar na área imobiliária no início dos anos 80, o artista relançou a sua carreira como ator secundário a partir de Paris, Texas, em 1984 e na versão de David Lynch de Dune, no mesmo ano. Seguiram-se as produções Viver E Morrer em Los Angeles, em 1985, Veludo Azul, em 1986, Jardins de Pedra, em 1987, O Caça Polícias II, em 1987 e Tucker – O Homem E o Seu Sonho e Viúva… Mas Não Muito, que culminou numa nomeação para os Óscares com o seu papel de mafioso. 

Apesar de todas estas participações, a série de ficção científica Quantum Leap, em português, O Viajante do Tempo, acabaria por se tornar o seu trabalho mais conhecido: Dean era o mulherengo Al Calavicci, o melhor amigo do doutor Sam Beckett (Scott Bakula), que em forma de holograma ajudava o viajante do tempo que encarnava uma nova pessoa em cada salto e tinha de completar uma missão, sempre na esperança de que o próximo salto o levasse de volta a casa. A série tornou-se de culto e durou cinco temporadas, até 1994.

A vida depois da sétima arte O ator deixa um legado de mais de cem títulos. Em 1992 foi homenageado com a estrela da Calçada da Fama de Hollywood e a sua última intervenção na grande tela foi no filme Perseguido, de Daniel Lusko, em 2014. Nesse mesmo ano também apareceu na série de televisão NCIS: New Orleans.

Em 2015, depois de um acidente vascular cerebral (AVC), o artista decidiu reformar-se para ficar ao lado da família e dedicar-se às artes plásticas – outra das suas grandes paixões. Através da fotografia e da colagem, Dean especializou-se na arte da aglutinação, incorporando todo o tipo de material à obra de arte.

Como artista plástico, apresentou os seus trabalhos com exposições em Museus e Galerias de Arte. Em 2010, chegou a criar um site oficial para divulgar o seu trabalho nessa área.

Stockwell foi casado duas vezes: com a atriz Millie Perkins, entre 1960 e 1962, e depois com Joy Marchenko de 1981 a 2004, com quem teve dois filhos.

“Não é a vida mais fácil do mundo, mas nenhuma vida é fácil”, acreditava o ator que agora ficará na memória de todos os apaixonados por cinema que o viram crescer, transformar-se e reinventar-se ao longo dos anos.