Os deputados chilenos aprovaram hoje o processo de destituição do Presidente do país, Sebastian Piñera, devido a supostas irregularidades na venda de uma empresa mineradora através de um paraíso fiscal, revelada pela investigação internacional Pandora Papers.
Após quase 24 horas, os deputados decidiram por 78 votos a favor, 67 contra e três abstenções que o processo de destituição irá avançar para o Senado, órgão que vai julgar o Presidente.
Enquanto na Câmara de Deputados bastou uma maioria simples para o processo seguir, no Senado a destituição exige a aprovação por dois terços do total dos senadores.
Piñera "agiu procurando benefício próprio e da sua própria família, utilizando informações a que teve acesso graças às suas funções de Presidente", denunciou o deputado socialista Jaime Naranjo, que passou 15 horas a ler um texto de 1.300 páginas, pedindo "o fim da impunidade".
"Peço-vos, senhores deputados, que rejeitem esta injusta e inadmissível acusação constitucional", disse, por sua vez, o advogado do Presidente, Jorge Gálvez.
Sebastian Piñera, um dos líderes políticos que apareceram no Pandora Papers – a investigação conduzida pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ) -, negou qualquer conflito de interesses na venda da empresa de mineração a um amigo próximo e afirmou a sua "total inocência".
O Presidente de direita, um dos homens mais ricos do Chile, referiu que em 2017 já teria havido "uma investigação aprofundada do Ministério Público" e que se tratava de "um caso encerrado pela justiça".
No entanto, o Ministério Público alegou que os factos relativos à venda e compra da empresa "não foram expressamente contemplados" na decisão de indeferimento de 2017.
De acordo com uma investigação dos meios de comunicação chilenos CIPER e LaBot, membros do ICIJ, a Minera Dominga foi vendida ao empresário Carlos Alberto Délano, amigo do chefe de Estado, por 152 milhões de dólares (131,1 milhões de euros), transação realizada nas Ilhas Virgens Britânicas.
O pagamento da transação foi feito em três tranches e continha uma cláusula polémica, que condicionava o pagamento final "ao não estabelecimento de zona de proteção ambiental na área de atuação da mineradora, como pediam os grupos ambientalistas", adiantou a investigação, sublinhando que o Governo de Sebastian Piñera acabou por falhar em proteger a área onde a concessionária iria atuar.
Para o deputado Tomas Hirsch (Ação Humanista, esquerda), o Presidente Piñera "evitou assim que uma área única do planeta fosse declarada reserva natural, apenas para promover os seus interesses pessoais".
Mesmo que não passe no Senado, a aprovação do processo de destituição na Câmara de Deputados terá um impacto político nas eleições gerais, marcadas para 21 de novembro.
Embora faltem apenas quatro meses para o final do mandato do atual Presidente, a oposição pretende aprovar a sua destituição, para o impedir de se candidatar a cargos públicos nos próximos cinco anos.
A defesa do Presidente argumenta que Piñera não participa na administração de nenhuma empresa há mais de 12 anos e que nem ele nem a família mantinham sociedades de investimento no exterior.
A venda da empresa ocorreu nove meses depois de Sebastián Piñera ter assumido o seu primeiro mandato (2010-2014).
O Ministério Público chileno também abriu uma investigação sobre a denúncia feita pelo Pandora Papers.