Verão Azul faz-nos descer ao Algarve no outono, já não pelo mar mas pelas artes

Verão Azul faz-nos descer ao Algarve no outono, já não pelo mar mas pelas artes


Festival celebra uma década dedicada à descentralização e criação em arte contemporânea.


O Algarve tem-nos dado muita coisa, a começar pela estação que muitos escolhemos para escapar ao resto da vida, e também a esse “país de restos de palavras”. Confunde-se o verão algarvio para muitos de nós com a própria infância, e até na literatura vamos encontrando essas dedadas entre um pó de lembranças que se confunde com o de dias mais largos, bem vividos. Lobo Antunes, em Conhecimento do Inferno, servia-nos essa perspetiva edénica, lembrando que “a luz do Algarve, a luz de Messines, pegava-se aos polegares tal um pó de borboletas” E acrescentava: “Se eu tocar numa casa, ou numa rua, ou num rio, a marca da minha mão fica impressa nas coisas como no barro húmido da escola, cova da palma, falanges, unhas, posso roubar um pedaço a esta tarde, levá-lo no bolso até Lisboa, tirá-lo da algibeira e ficar a olhar por muito tempo os campos desenhados pelas ondas, os cachorros cabisbaixos que trotam entre as vinhas no passo oblíquo das raposas, a tímida penumbra dos alpendres, a terra que o mar despreza como um osso inútil, um osso oco como os das aves assassinadas num voo interrompido”.

Cumpre, no entanto, não esquecer a região no resto do ano, e lembrar que, nas alturas em que chove, há outras formas de ir ao encontro daquele território. Um exemplo é o festival transdisciplinar de artes contemporâneas Verão Azul, que este ano regressa para a sua 10.ª edição, e que irá decorrer entre os dias 4 e 20 de novembro, em Lagos, Loulé e Faro. A programação este ano vai da música ao cinema, passando pela fotografia, performance e teatro, entre o que de mais experimental se faz na produção artística nacional, internacional e local.

Uma das grandes protagonistas desta edição é a fotógrafa Pauliana Valente Pimentel, que dará o arranque ao festival com a exposição de fotografia “Faro Oeste”. Nesta mostra, retrata as comunidades ciganas locais, nomeadamente as das zonas de Faro, Loulé e Boliqueime, apresentando o quotidiano destas famílias, com realce para as suas tradições, e no intuito de combater preconceitos e estereótipos racistas e xenófobos de que são constantemente alvo. A mostra permanece em exibição até 19 de dezembro, no Museu Municipal de Faro (Antigas Carpintarias).

O artista multidisciplinar Miguel Bonneville, o coletivo de música catalão ZA!, o encenador Alex Cassal, a realizadora Luciana Fina e o ilustrador António Jorge Gonçalves são outros dos artistas que se juntam ao extenso corpo de programação do festival, que conta ainda com atividades práticas para crianças e jovens, entre workshops, masterclasses, sessões para escolas e oficinas criativas.