A regulação é um pilar fundamental para em democracia conseguir combinar economias de mercado com sociedades que sejam orientadas por valores matriciais de equilíbrio, justiça e transparência. As fronteiras entre a decisão política e a ação reguladora estão legalmente definidas e embora exista sempre alguma fluidez nas linhas separadoras, o modelo de economia de mercado regulada foi-se desenvolvendo em quase todos os setores fundamentais para o funcionamento das economias e das sociedades democráticas.
A globalização dos mercados, o aparecimento de operadores poderosos e fortemente transnacionais, a aceleração das transformações nos modelos de negócio induzida pela aceleração tecnológica e a mudança da natureza de muitos serviços profissionais especializados, tem vindo a desafiar este equilíbrio. Em todo o mundo e também em Portugal, temos assistido a exemplos em que a articulação entre o tempo da política colide com o tempo da regulação, atrapalhando-se mutuamente com prejuízo para o objetivo final do bom funcionamento do sistema económico.
No caso da Energia, que tem estado aliás particularmente em foco nas últimas semanas com a subida em flecha dos preços, quando verificamos as dinâmicas que a isso conduziram nos mercados europeus, facilmente identificamos zonas cinzentas entre a decisão política e a regulação.
O Conselho Europeu da passada semana procrastinou na tomada de uma decisão que teria um efeito conjuntural imediato no equilíbrio do mercado da energia, ao não adotar o princípio das compras conjuntas, em particular do Gás. O momento de transição vivido pela Alemanha explica em larga medida este hiato num caminho que tem vindo a ser de mais cooperação e solidariedade em domínios estratégicos.
Ao analisar as propostas da Comissão Europeia para enfrentar o aumento dos preços da energia, o Conselho convidou a proponente a analisar o funcionamento dos mercados do gás e da eletricidade e o mercado das licenças de carbono, como apoio da Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados.
Para além das variações em sentidos opostos da procura e da oferta, têm-se verificado nesses mercados fortes indícios de especulação e comportamentos de negociação que, reconhecem os líderes de governo em comunicado, podem exigir novas medidas regulamentares.
Ao mesmo tempo o Conselho deu aval às medidas de mitigação do impacto nas famílias e nas empresas desse aumento dos preços, já adotadas pelos Estados-membros e comprometeu-se, em conjunto com a Comissão Europeia a adequar as medidas de médio e longo prazo e os volumes de investimento na produção, armazenamento e conetividade de forma que a transição energética e a descarbonização se faça no quadro de um sistema energético resiliente e capaz de fornecer energia a preços acessíveis às famílias e às empresas.
Esta panóplia de decisões é um sinal claro de que o Conselho percebeu que a questão dos preços da energia na Europa deixou de ser possível de controlar apenas com boa regulação. É preciso fazer escolhas políticas duras e assertivas. Não vai ser fácil, mas não há outro caminho.