Alma Europeia


Portugal, país atlântico e global pode e deve ter aliás um papel importante na salvaguarda da alma europeia, também no que diz respeito à sua capacidade de promoção ativa da paz no seu território e no mundo.


Em semana de eleições autárquicas, partilho um forte apelo à participação cívica de todos no exercício democrático, com a consciência que a separação entre os patamares de decisão europeia, nacional e local que alguns proclamam é pura retórica, sobretudo quando se trata de dar respostas concretas às necessidades das pessoas e volto neste texto, como prometido, ao tema do futuro da União Europeia (UE) e ao debate sobre o Estado da União que decorreu no passado dia 15 de setembro em Estrasburgo.

As reações dos comentadores ao discurso da Presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen merece reflexão. A maioria considerou o discurso longo, exaustivo e sem novidades. Foi um discurso que passou pelos múltiplos temas chave para o futuro da União, com análises focadas e sem “sound bytes”, a não ser o anúncio do programa de mobilidade para jovens que não estão a estudar ou a trabalhar, intitulado ALMA, que acabou por inspirar todo o discurso e também o título deste texto, destinado a proporcionar a esses jovens uma experiência profissional temporária noutro Estado-Membro.

É curioso que quem acusa, muitas vezes com razão, o discurso político de estar poluído de “sound bytes”, tenha sentido agora tanto a sua falta na intervenção de Ursula, mesmo que essa falta se tenha ficado mais a dever à contenção forçada pela proximidade das eleições alemãs, do que por uma genuína opção alternativa de comunicação.

Do meu ponto de vista o ponto mais fraco do discurso da Presidente da CE não foi a falta de anúncios sonantes, mas a fragilidade do compromisso para pôr em prática as respostas para muitos dos problemas que diagnosticou. A comunicação política para ser credível tem que ser percetível e monitorizável na linha do tempo necessária para a concretização, incluindo a transparência das dotações orçamentais origens e das suas.

Na intervenção que pude fazer no debate felicitei a Presidente por ter aprendido a lição de que a alma europeia é solidária, como mostrou o sucesso relativo do combate conjunto à pandemia, quando comparado com a reação egoísta e desgarrada à crise financeira anterior e convidei-a a tirar uma segunda lição; a solidez orçamental é importante, mas os garrotes impostos pelos mais fortes aos mais fracos matam o sentimento europeu e esvaziam o poder impulsionador de caminhos como aqueles que ela propôs, designadamente o aprofundamento da União da Saúde, da União para a liderança tecnológica nos semicondutores, da União para a justiça social e fiscal, da União para o comércio justo, da União para a juventude e da União para a igualdade de género.

Deixei para o fim a União da Defesa. Se dúvidas ainda restassem sobre a importância do seu reforço, a formação de uma aliança EUA – Austrália – Reino Unido no seio da NATO, selada pelo fornecimento de submarinos do primeiro à segunda em detrimento de um fornecedor da União Europeia, obriga a UE a aumentar o seu peso e a sua voz no seio da organização. Portugal, país atlântico e global pode e deve ter aliás um papel importante na salvaguarda da alma europeia, também no que diz respeito à sua capacidade de promoção ativa da paz no seu território e no mundo.

 

Eurodeputado do PS