Carta aberta aos juízes do Palácio Ratton!


Nos últimos dias, os portugueses ficaram a saber que os Juízes do Tribunal Constitucional, através de um parecer que os próprios entregaram à Assembleia da República na sequência de uma proposta do Partido Social Democrata, classificaram a potencial mudança da sede desse órgão de soberania para Coimbra como um “grave desprestígio”.


Consideraram os juízes, hoje faustosamente instalados no Palácio Ratton, que a "transferência seletiva da sede de um órgão de soberania, baseada em qualquer critério que não seja o da natureza e dignidade constitucional das funções que desempenha, não poderia deixar de constituir um grave desprestigio", que teria uma "carga simbólica negativa" e degradaria “a perceção pública da autoridade, autonomia e relevância do órgão".

Para justificarem essa tomada de posição realçaram uma secular verdade, referindo, pois, que "num país com uma tradição antiga de centralismo, em que os órgãos de soberania sempre tiveram a sede em Lisboa, a transferência da sede do TC contribuirá certamente mais para desprestigiar o órgão do que para criar uma nova centralidade fora da capital".

Tal pletora da nação havia sido já diagnosticada, anteriormente, em 1879, por Eça de Queirós na sua sátira à classe política nacional “O Conde D’Abranhos”. Esse diagnóstico assume hoje mais pertinência do que nunca, uma vez que a maleita, em face da posição do TC que nos foi dada a conhecer nos últimos dias, se terá endemizado e achacado o mais alto órgão judicial da nação.

Mesmo assim, caros juízes, para que não restem dúvidas de qualquer ordem e antes de nos debruçarmos sobre quaisquer outras virtudes do vosso esmerado e brilhante parecer, concordamos no manifesto eleitoralismo da proposta do Partido Social Democrata. Por demais evidente pela ausência, nesse ou em qualquer outro partido, de uma qualquer linha de pensamento ou programa estratégico de promoção de políticas demográficas para a coesão territorial. Pese embora isso, teve essa proposta o condão de expor, por um lado o centralismo bacoco carcerado entre as nossas elites e, por outro lado, de dar à luz o vosso magnânimo parecer.

Esse ilustre parecer fez-nos perceber que a maleita centralista não é o fruto das políticas da época ou da ausência delas: é mais grave, é uma entropia cultural! Essa maleita centralista carcerada, tanto entre as elites como entre o povo deslumbrado pela sereia centralista, ameaça tolher irremediavelmente o futuro do país como um ente uno e coeso.

Desde logo, talvez por motivos dessa maleita que vos achaca, esquecem os senhores juízes que uma qualquer manifestação de descentralização não pode, por si só, contribuir para a criação de novas centralidades, nem para o desprestígio de órgãos de soberania. Isso não é nada mais do que uma mentira muitas vezes repetida.

Por oposição àquilo que preceituam, essas manifestações de descentralização dignificam os órgãos de soberania descentralizados, pois cumprem, para além da sua missão, a mui nobre missão de dignificação dos territórios. Neste ponto, não se esqueçam que só um território digno pode ser atrativo para quem nele viva ou se pretenda fixar.

Ademais, tão pouco pode ser verdade que a capital do país seja inerente ao valor simbólico do TC ou de qualquer outro tribunal. Se assim for mandem-se já encerrar todos os tribunais fora de Lisboa (!) e contestem-se já todas as decisões do TC. Isto, pois, a opinião expressa pelos senhores juízes nesse reverendo parecer coloca irremediavelmente em causa o exercício do ius imperium dos tribunais em todo o território nacional e, por mero acaso, também ela desprestigia manifestamente o órgão de soberania que humildemente servem. 

Do mesmo modo, tão pouco é verdade que devam os senhores juízes estar preocupados com a proximidade da vossa instituição a outros “órgãos de soberania que exercem as funções política e legislativa”. Na verdade, tal proximidade, porventura promiscuidade, não é nada mais do que uma remanescência terceiro-mundista de uma elite judicial que se esqueceu que a sua missão primária é a de servir e estar próxima dos cidadãos que servem: todos os portugueses.

Por fim, caros guardiões da Constituição da República Lisboeta, a medida do prestígio que arreigam a esse órgão de soberania não é da vossa disponibilidade, nem da instituição que servem. Essa medida de prestígio é dos portugueses, é da Constituição da República Portuguesa, é de Portugal!

Por isso, clame-se aos sete ventos: Mude-se o TC para Coimbra, para Miranda do Douro, para Penela, para Melgaço, para o Fundão, para Ferreira do Alentejo! Mude-se para qualquer lado! Mas mude-se!

Caso contrário, a pletora que nos atinge poderá matar, obviamente de modo irremediável, a nação e nas vossas mãos ficarão as provas do seu assassinato.

P.s: Saudemos, por fim, os votos vencidos de 3 juízes do TC.

 

Fernando Belezas
Presidente da Rural Move – Associação para a promoção  do Investimento nos Territórios de Baixa Densidade
15 de setembro de 2019

 


Carta aberta aos juízes do Palácio Ratton!


Nos últimos dias, os portugueses ficaram a saber que os Juízes do Tribunal Constitucional, através de um parecer que os próprios entregaram à Assembleia da República na sequência de uma proposta do Partido Social Democrata, classificaram a potencial mudança da sede desse órgão de soberania para Coimbra como um “grave desprestígio”.


Consideraram os juízes, hoje faustosamente instalados no Palácio Ratton, que a "transferência seletiva da sede de um órgão de soberania, baseada em qualquer critério que não seja o da natureza e dignidade constitucional das funções que desempenha, não poderia deixar de constituir um grave desprestigio", que teria uma "carga simbólica negativa" e degradaria “a perceção pública da autoridade, autonomia e relevância do órgão".

Para justificarem essa tomada de posição realçaram uma secular verdade, referindo, pois, que "num país com uma tradição antiga de centralismo, em que os órgãos de soberania sempre tiveram a sede em Lisboa, a transferência da sede do TC contribuirá certamente mais para desprestigiar o órgão do que para criar uma nova centralidade fora da capital".

Tal pletora da nação havia sido já diagnosticada, anteriormente, em 1879, por Eça de Queirós na sua sátira à classe política nacional “O Conde D’Abranhos”. Esse diagnóstico assume hoje mais pertinência do que nunca, uma vez que a maleita, em face da posição do TC que nos foi dada a conhecer nos últimos dias, se terá endemizado e achacado o mais alto órgão judicial da nação.

Mesmo assim, caros juízes, para que não restem dúvidas de qualquer ordem e antes de nos debruçarmos sobre quaisquer outras virtudes do vosso esmerado e brilhante parecer, concordamos no manifesto eleitoralismo da proposta do Partido Social Democrata. Por demais evidente pela ausência, nesse ou em qualquer outro partido, de uma qualquer linha de pensamento ou programa estratégico de promoção de políticas demográficas para a coesão territorial. Pese embora isso, teve essa proposta o condão de expor, por um lado o centralismo bacoco carcerado entre as nossas elites e, por outro lado, de dar à luz o vosso magnânimo parecer.

Esse ilustre parecer fez-nos perceber que a maleita centralista não é o fruto das políticas da época ou da ausência delas: é mais grave, é uma entropia cultural! Essa maleita centralista carcerada, tanto entre as elites como entre o povo deslumbrado pela sereia centralista, ameaça tolher irremediavelmente o futuro do país como um ente uno e coeso.

Desde logo, talvez por motivos dessa maleita que vos achaca, esquecem os senhores juízes que uma qualquer manifestação de descentralização não pode, por si só, contribuir para a criação de novas centralidades, nem para o desprestígio de órgãos de soberania. Isso não é nada mais do que uma mentira muitas vezes repetida.

Por oposição àquilo que preceituam, essas manifestações de descentralização dignificam os órgãos de soberania descentralizados, pois cumprem, para além da sua missão, a mui nobre missão de dignificação dos territórios. Neste ponto, não se esqueçam que só um território digno pode ser atrativo para quem nele viva ou se pretenda fixar.

Ademais, tão pouco pode ser verdade que a capital do país seja inerente ao valor simbólico do TC ou de qualquer outro tribunal. Se assim for mandem-se já encerrar todos os tribunais fora de Lisboa (!) e contestem-se já todas as decisões do TC. Isto, pois, a opinião expressa pelos senhores juízes nesse reverendo parecer coloca irremediavelmente em causa o exercício do ius imperium dos tribunais em todo o território nacional e, por mero acaso, também ela desprestigia manifestamente o órgão de soberania que humildemente servem. 

Do mesmo modo, tão pouco é verdade que devam os senhores juízes estar preocupados com a proximidade da vossa instituição a outros “órgãos de soberania que exercem as funções política e legislativa”. Na verdade, tal proximidade, porventura promiscuidade, não é nada mais do que uma remanescência terceiro-mundista de uma elite judicial que se esqueceu que a sua missão primária é a de servir e estar próxima dos cidadãos que servem: todos os portugueses.

Por fim, caros guardiões da Constituição da República Lisboeta, a medida do prestígio que arreigam a esse órgão de soberania não é da vossa disponibilidade, nem da instituição que servem. Essa medida de prestígio é dos portugueses, é da Constituição da República Portuguesa, é de Portugal!

Por isso, clame-se aos sete ventos: Mude-se o TC para Coimbra, para Miranda do Douro, para Penela, para Melgaço, para o Fundão, para Ferreira do Alentejo! Mude-se para qualquer lado! Mas mude-se!

Caso contrário, a pletora que nos atinge poderá matar, obviamente de modo irremediável, a nação e nas vossas mãos ficarão as provas do seu assassinato.

P.s: Saudemos, por fim, os votos vencidos de 3 juízes do TC.

 

Fernando Belezas
Presidente da Rural Move – Associação para a promoção  do Investimento nos Territórios de Baixa Densidade
15 de setembro de 2019