Livro. Já não houve espondóforos a chamarem para estes Jogos do Silêncio

Livro. Já não houve espondóforos a chamarem para estes Jogos do Silêncio


Leónidas de Rodes e Fanas de Pelene tiveram o povo grego a aplaudi-los em Olímpia. Em Tóquio, as bancadas vazias não saúdam os vencedores.


Nunca ninguém soube nem nunca ninguém saberá explicar a intrínseca magia dos Jogos Olímpicos. E foram tantos que o tentaram, são tantas as páginas escritas em sua glória, a glória dos que vão mais longe e mais alto e são mais fortes. Podem ter tirado o público das bancadas de Tóquio, mas o coração dos atletas que se defrontam batem acelerados como jamais.

Já se passaram cinquenta e sete anos, assim mesmo, por extenso, desde que os Jogos Olímpicos se disputaram na capital do Japão. Agora voltaram. Com um ano de atraso em relação ao previsto já que a pandemia continua a assolar o mundo, de tal forma que as autoridades sanitárias japonesas, com o apoio inequívoco do governo, aderiram a medidas drásticas para estes Jogos do Silêncio.

É tempo também, como de costume, visitar a História. Correr maratonas já corridas, saltar em comprimento comprimentos que já não se medem, recordar as personagens de um universo que se repete de quatro em quatro anos mas tem raízes milenares que nos levam à Grécia antiga.

A Fundação Olímpica Para a Cultura e Património decidiu publicar um livro simples, essencialmente prático e informativo: A História dos Jogos Olímpicos. Não contem, ao folheá-lo, com traços da mais clássica das literaturas. Temos atletas, recordes, destaques. Desde a I Edição da Era Moderna, em 1896, em Atenas (cidade que chegou a sonhar receber todas as edições seguintes dos Jogos, sem imaginar, na altura, que se tornariam, durante vários anos, num complemento lúdico das grandes feiras universais, tal como aconteceu em Paris, em St. Louis e em Londres), até hoje, desfilam pela nossa frente aqueles que ganharam o direito à imortalidade. 28 edições de Jogos Olímpicos, desde essa inicial de Atenas à última, no Rio de Janeiro, em 2016. Avisa-se, logo à partida: “Criado com a ajuda do Museu Olímpico e do Comité Olímpico Internacional, este livro é uma viagem pela história dos Jogos Olímpicos Modernos, desde a primeira celebração simples em Atenas, até ao espetáculo magnífico dos nossos dias”.

Quatro anos. Se, nos dias de hoje, os Jogos têm lugar de quatro e quatro anos (com esta exceção de cinco provocada pelo covid), é porque nos primórdios também assim acontecia. Em honra de Zeus, na cidade de Olímpia, onde se erguia a estátua do rei de todos os deuses esculpida por Fídias e foi considerada uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo, os espondóforos – mensageiros olímpicos – iam de cidade em cidade instigando os seus melhores atletas a participarem, só homens, atenção, às mulheres nem sequer era permitido assistir às provas. O kotinos era o prémio dos vencedores – uma coroa entrançada por folhas silvestres de oliveira. Mas não apenas. Ficavam também reconhecidos como heróis dos seus lugares, figuras inatingíveis como semideuses. A glória olímpica caía nas costas dos melhores como uma capa de imperador das hordas populares.

Leónidas de Rodes – que venceu três provas de corridas entre 164 e 152 a.C. (o estádio – que tinha a extensão do recinto –, o diaulo – que tinha a dupla extensão do recinto – e o hoplitódromo – uma corrida em que os atletas participavam fardados) – e Fanas de Pelene, o primeiro a vencer essas três provas numa só edição, a de 514 a.C., ficaram para sempre na recordação dos gregos. É na forma como entendemos a diferença abissal do Homem ao longo dos séculos, que os Jogos Olímpicos se nos afiguram como uma demonstração da evolução física da raça. Tudo o que se possa aprender sobre eles é, também, uma aprendizagem sobre as raízes da própria Humanidade. Milhares de anos os contemplam.