A preguiça das cegonhas


São dignas as cegonhas. Têm aquela pose de juiz conselheiro, as cabeças pensativas dependuradas de pescoços magníficos. Deixaram de ter um lugar para onde ir quando o Inverno chega na sua pressa de chuvas? Desistiram de emigrar, burguesas acomodadas a uma vida de casa posta no segundo andar vindo do firmamento que recobre a Terra?


As cegonhas já não vão e vêm. Caíram no tédio da sedentariedade, edificando ninhos como prédios nos postes de eletricidade por todos os caminhos que ligam Alcácer à Comporta, ao Pego, ao_Carvalhal, a Tróia. Desprezam o poema de Pessoa que considerava triste quem vive em casa, contente com o seu lar.

Desprezam a canção de Charles aznavour, o Aznavourian: “Quel que soit le printemps, les cigognes reviennent/Tant de fois, le cœur gros, je les ai vues passer/Elles berçaient pour moi des rêveries anciennes/Illusions d’un enfant dont il n’est rien resté”. Não as vejo em bandos se não muito raramente e esses bandos esvoaçam em círculos como se o céu não fosse infinito e não tivessem todo o azul por sua conta até esse lugar das minhas ilusões de infância das quais já nada mais resta.

São dignas as cegonhas. Têm aquela pose de juiz conselheiro, as cabeças pensativas dependuradas de pescoços magníficos. Deixaram de ter um lugar para onde ir quando o Inverno chega na sua pressa de chuvas? Desistiram de emigrar, burguesas acomodadas a uma vida de casa posta no segundo andar vindo do firmamento que recobre a Terra? Hoje, por todo o lado há cegonhas. Até nos meus caminhos de Águeda para a Barra, Eirol e São João de Loure, Eixo e Azurva. Fito-as daqui para o lado de lá do Sado numa vontade de entender a sua desistência da errância. Eu, que tenho por dentro o desejo de ir, de ir sempre, até que algum dia deixe de voltar. Se calhar é isso.

Em vez de ir, vieram. Vieram e vieram, Primavera atrás de Primavera, até ao dia em que se esqueceram de regressar ao local de todas as partidas. “Quel que soit le printemps, les cigognes reviennent…”  Não, não vêm mais. Ficam apenas amarradas à sua pacificação de postes. Eu, que acabei de chegar ao país triste, sinto já em mim a ânsia de ter de novo aquele sonho de um erguer de asa que envie no movimento de transladação que a angústia me exige. Impedindo definitivamente que a erma noite adormeça em mim.


A preguiça das cegonhas


São dignas as cegonhas. Têm aquela pose de juiz conselheiro, as cabeças pensativas dependuradas de pescoços magníficos. Deixaram de ter um lugar para onde ir quando o Inverno chega na sua pressa de chuvas? Desistiram de emigrar, burguesas acomodadas a uma vida de casa posta no segundo andar vindo do firmamento que recobre a Terra?


As cegonhas já não vão e vêm. Caíram no tédio da sedentariedade, edificando ninhos como prédios nos postes de eletricidade por todos os caminhos que ligam Alcácer à Comporta, ao Pego, ao_Carvalhal, a Tróia. Desprezam o poema de Pessoa que considerava triste quem vive em casa, contente com o seu lar.

Desprezam a canção de Charles aznavour, o Aznavourian: “Quel que soit le printemps, les cigognes reviennent/Tant de fois, le cœur gros, je les ai vues passer/Elles berçaient pour moi des rêveries anciennes/Illusions d’un enfant dont il n’est rien resté”. Não as vejo em bandos se não muito raramente e esses bandos esvoaçam em círculos como se o céu não fosse infinito e não tivessem todo o azul por sua conta até esse lugar das minhas ilusões de infância das quais já nada mais resta.

São dignas as cegonhas. Têm aquela pose de juiz conselheiro, as cabeças pensativas dependuradas de pescoços magníficos. Deixaram de ter um lugar para onde ir quando o Inverno chega na sua pressa de chuvas? Desistiram de emigrar, burguesas acomodadas a uma vida de casa posta no segundo andar vindo do firmamento que recobre a Terra? Hoje, por todo o lado há cegonhas. Até nos meus caminhos de Águeda para a Barra, Eirol e São João de Loure, Eixo e Azurva. Fito-as daqui para o lado de lá do Sado numa vontade de entender a sua desistência da errância. Eu, que tenho por dentro o desejo de ir, de ir sempre, até que algum dia deixe de voltar. Se calhar é isso.

Em vez de ir, vieram. Vieram e vieram, Primavera atrás de Primavera, até ao dia em que se esqueceram de regressar ao local de todas as partidas. “Quel que soit le printemps, les cigognes reviennent…”  Não, não vêm mais. Ficam apenas amarradas à sua pacificação de postes. Eu, que acabei de chegar ao país triste, sinto já em mim a ânsia de ter de novo aquele sonho de um erguer de asa que envie no movimento de transladação que a angústia me exige. Impedindo definitivamente que a erma noite adormeça em mim.