Com o calor do verão, as populações do Interior Norte e Centro são de novo ameaçadas pelo terror dos incêndios florestais.
Vem logo à memória o ano trágico de 2017, em que 125 portugueses morreram queimados, bem como os outros anos negros de 2003, 2005 e 2011 em que também se perderam vidas humanas e um enorme património material.
E se é certo que as tragédias de 2017 constituíram um verdadeiro “murro no estômago” para todos os portugueses, mesmo para a maioria que vive nas zonas urbanas do litoral, não é menos certo que as políticas públicas implementadas desde então foram um desastre para as populações do minifúndio do Interior.
Porque essas políticas massacraram ainda mais os, já de si tragicamente massacrados, pequenos proprietários rurais do minifúndio do Interior Norte e Centro.
Eis alguns exemplos desse massacre, duma população envelhecida e empobrecida, decretado pelos governantes do alto dos seus gabinetes com ar condicionado em Lisboa:
Obrigar a cortar a suas expensas árvores e matos até 15 de março de cada ano, sem que o Governo tenha antes providenciado qualquer logística de recolha e utilização dessa biomassa.
Sendo que tecnicamente isso é um completo desperdício de meios e recursos porque, com as habituais chuvas de abril e maio, chegados a junho as ervas e matos já cresceram ainda com mais força!
E para quem viu as suas propriedades destruídas pelo fogo, o que a nova legislação fez foi apenas complicar ainda mais a vida de quem precisa de dar alguma lógica à sua gestão.
Não tendo quaisquer apoios para o abate e remoção da madeira ardida, os proprietários são ainda massacrados com mais coimas se quiserem replantar árvores para que os seus terrenos não se convertam em “mato grosso”.
O “terrorismo burocrático” em vigor chegou ao ponto de se exigirem licenças para replantação de áreas ardidas inferiores a meio hectare!
Esta situação é um verdadeiro atentado às anunciadas prioridades políticas do Governo português e da Comissão Europeia:
a) A Coesão Territorial, promovendo as regiões economicamente mais desfavorecidas e de maior desertificação humana;
b) A utilização das florestas como sumidouro indispensável de CO2, para o que se terá de aumentar a respetiva área em 40% até 2040.
Ao destruir a sustentação económica de 25.000 Km2 de terrenos rurais do Interior Norte e Centro, a legislação publicada depois das tragédias de 2017 está a agravar ainda mais a desertificação do Interior.
Por isso se faz um novo apelo à ministra da Coesão Territorial, bem como a mais de uma dezena de ministros e de secretários de Estado que têm por missão o “desenvolvimento do interior”, a “administração interna”, o “desenvolvimento rural”, as “florestas”, a “energia”, o “ambiente” e o “desenvolvimento humano”para se concentrarem em duas medidas essenciais para reforçar a confiança entre o poder político e as populações do minifúndio do Interior, e combater de forma verdadeiramente eficaz o terror dos incêndios florestais:
Agravar as penas para os crimes de fogo posto rural, que constituem, além das tragédias humanas, um grave atentado à meta definida pelo Governo da neutralidade carbónica até 2050. Para que não possa haver mais condenados em tribunal por estes crimes que depois saem em liberdade porque lhes é aplicada uma pena suspensa;
Utilizar os Fundos Europeus para promover um sistema coordenado de recolha e utilização segura dos sobrantes de biomassa em zonas rurais. Como já se faz no Concelho de Viseu a partir da iniciativa do saudoso António de Almeida Henriques.
E apoiar a instalação de mais centrais térmicas a biomassa para produzir mais eletricidade renovável, com a vantagem neste caso de não ser intermitente ao contrário do que acontece com as eólicas e solares. Neste aspeto, as declarações recentes da ministra da Coesão Territorial, de apoiar a reconversão da Central Térmica a carvão de Abrantes para vir a utilizar biomassa da região do Pinhal Interior, são encorajadoras. Mas exigem um estudo aprofundado da logística para a recolha na região da biomassa necessária.
Assim se limparia a floresta, evitando a propagação dos incêndios, e se poupariam muitos dos 260 milhões de euros que todos os anos são gastos para “combater os fogos florestais”. Com aviões, helicópteros, autotanques e a queima de milhares de toneladas de combustíveis fósseis…
Portugal tem tido nos últimos 22 anos um desempenho económico desastroso, e a devastação a que tem sido sujeito o Interior rural é disso um exemplo paradigmático.
Urge pois tomar medidas eficazes para utilizar os novos Fundos Europeus para que a floresta seja uma fonte de riqueza para o país, e dela beneficiem as populações rurais do Interior Norte e Centro.
Assim o exige uma Democracia de Qualidade.
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade