“Onde morre a vergonha nascem os expedientes desonrosos”.
Camilo Castelo Branco
No dia 18 deste mês, passaram já 12 dias (à data em que escrevo esta crónica), um carro conduzido por um motorista do ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, com o ministro a bordo, atropelou mortalmente um trabalhador que fazia a manutenção da autoestrada A6.
Segundo uma testemunha, a viatura seguia a uma “velocidade louca” e, depois do acidente, “ministro e motorista não saíram da viatura”.
Na sequência do acidente, o ministério da Administração Interna emitiu um comunicado onde afirmava que “não existia sinalização para alertar os condutores dos trabalhos de limpeza em curso na autoestrada A6”, acrescentando que “o veículo “não sofreu qualquer despiste” e “circulava na faixa de rodagem, de onde nunca saiu, quando o trabalhador a atravessa”.
Reagindo ao comunicado do MAI, a BRISA, responsável pela manutenção da autoestrada, afirma que os trabalhos estavam “devidamente sinalizados”, desmentindo assim o comunicado do MAI.
Como é evidente, todos estamos sujeitos a acidentes, deste ou de outro tipo. No entanto, tendo em conta que se trata de um acidente que causou uma vítima mortal e que está envolvido, indiretamente, um membro do Governo, o que se esperava era uma informação rápida sobre as circunstâncias do acidente. Desde logo, a velocidade em que circulava o carro que transportava o ministro.
O Ministério Público abriu um inquérito, “como sempre acontece neste tipo de situações”.
Aguardaremos até quando os resultados das perícias no local do acidente e, não menos importante, as conclusões da autópsia, no que respeita aos danos físicos causados pelo embate?
Se este acidente tivesse ocorrido na Inglaterra, por exemplo, já teríamos certamente conclusões e um ministro demissionário. Vejam-se os últimos casos ocorridos no Governo de Londres, bem menos graves.
Por cá, vence a tendência de “sacudir a água do capote”, tentar arranjar desculpas esfarrapadas, muitas vezes mentirosas, para fugir à responsabilidade.
A falta de vergonha é uma constante na política à portuguesa, mas assume especial gravidade quando atinge o próprio Governo.
George Bernard Shaw escreveu: “Um homem é tão mais respeitável quanto mais numerosas são as coisas das quais se envergonha”.
Por cá, segue-se a máxima de Sartre:
“Vergonha? Isso passa quando a vida é longa”.
Jornalista