MUNIQUE – É uma Alemanha profundamente ferida no seu orgulho que vamos defrontar, amanhã à tarde, na Arena de Munique. A derrota frente à França por 0-1, na última terça-feira não surpreendeu ninguém. Vendo bem, a Mannshaft, tem andado a fazer figuras deprimentes, seja em jogos oficiais, como aqueles 0-6 perante a Espanha para a Liga das Nações, ou o desaire por 1-2, em casa, frente à Mecedónia do Norte, para o apuramento do Mundial, acrescentando que nos encontros de preparação para este Euro-2020 derreteu a Letónia por 7-1 mas não foi além de 1-1 face à Dinamarca.
Nunca gostei de fazer análises a jogos através da televisão, caixinha que nos oferece muitos pormenores mas vive fixada na bola e não nos revela os movimentos dos jogadores que ou não estão com ela nos pés ou não estão a lutar por ela. Infelizmente, este Europeu da maldição, a exigir testes de dez em dez minutos sob o risco de nos barrarem entrada não apenas em países como até em restaurantes, não me permite fazer o trabalho que gosto de ir, no intervalo dos jogos de Portugal, observar outras equipas. Pelo que entrevi no Alemanha-França, acresce dizer que a velha e rija seleção teutónica, dada a cargas de Cavalaria das Valquírias, é hoje uma amálgama de gente jovem com gente experiente mas que está longe, muito longe, de formar uma equipa. Os erros defensivos são constantes, o meio-campo é macio como nunca vi numa seleção alemã, a falta de qualidade em alguns setores, sobretudo o ataque onde boiam, como se num caldo morno de couves-rôxas jogadores como Havertz (depois Timo Werner) – dois moços para os quais a baliza parece não existir –, Gnabry (no centro do ataque, fora do seu lugar), ou Leroy Sané, que entrou já na fase do desespero. Já a defesa é rija como cornos de gado gelbvieh, daquele tão exportado para todo o mundo.
Sabe-se que Joachim Low não irá continuar no comando da equipa após o Euro, e a forma como teve de se haver com o esbracejar irritado dos suplentes que fez entrar (especialmente Sané) pode anunciar que os jogadores já não perdem muito tempo a respeitar as suas ideias. Ideias, aliás, que não abundam. O futebol dos alemães é teimosamente repetitivo e não revela imaginação para contornar defesas de forte capacidade física como a francesa. Claro que, frente a Portugal, essa diferença se esfuma, tendo em conta que os nossos laterais não são nenhuns abana-pinheiros, motivo porque não ficaria admirado se Danilo e William Carvalho voltassem a compor o duo de trincos de forma a fazer crescer a equipa mais uns centímetros.
Esperaria que, nesta Alemanha bizarra e bisonha, a alacridade de Sané fosse mais aproveitada. Contava com ele em campo desde início, a bater com a mão no peito e a exclamar como Rilke: “Ich bin der Eine!” (Eu sou o tal!) Mas, pelo vistos, Low não está, decididamente, para aí virado.
Diferente Muito diferente será o jogo de amanhã para Portugal em relação ao que lhe valeu mais uma vitória sobre a Hungria, por uns muito agradáveis 3-0. Se os húngaros esperaram o maior tempo que puderam que a seleção nacional se esticasse no terreno com muitos homens para poder aproveitar os espaços deixados nas suas costas, a Alemanha entrará em campo com a aflição de ganhar sob o risco de ficar de fora deste Europeu logo na fase de grupos. Ninguém terá dúvidas que o espírito militar dos germânicos virá ao de cima e que os seus batalhões estão, agora, prontos para uma guerra sem quartel, algo com que não nos costumamos dar muito bem – a história regista dez vitórias alemãs contra três portuguesas, mais cinco empates.
Muito provavelmente, porque faz parte da sua forma de ser, Fernando Santos vai mudar a equipa inicial. Há várias coisas a corrigir no carrossel ofensivo português, sobretudo a insistência de interiorizar os extremos ao ponto de ocuparem o espaço que devia ser de Bruno Fernandes que esteve estranhamente desaparecido. Mas não vale a pena deitar mão de adivinhações. Com o exército alemão a cair sobre nós desde o primeiro minuto, teremos de saber sofrer e ter a inteligência de derrubar a sua força com golpes de navalha, à moda de um marinheiro do Cais do Sodré. É preciso um Portugal malandro, afadistado, sem grandes escrúpulos? Pois é. Saltar para lá do bloco que os alemães irão empurrar até à entrada da nossa área com a vontade incontrolável que é fruto do orgulho milenar dos nibelungos… Neste caso nibelungos gigantes e não anões.