Yellow Star Company. “É uma decisão que nos deixa sem palco”

Yellow Star Company. “É uma decisão que nos deixa sem palco”


Depois de cinco anos e meio de suor, lágrimas e dedicação, a produtora Yellow Star Company foi surpreendida pela direção da Casa do Artista, que não renovou o contrato para a produtora continuar no Teatro Armando Cortez.


Os números são eloquentes: cinco anos e meio, 74 sessões, 132.456 espectadores. Mas não convenceram a nova direção da Apoiarte – Casa do Artista, que assumiu funções em março passado. “A nova direção da Casa do Artista decidiu unilateralmente não renovar o contrato que tinha com a produtora, tendo agora que abandonar as instalações até Julho”, denunciou a Yellow Star Company, através do Facebook de um dos seus responsáveis, Paulo Sousa Costa.

“Fomos convocados para uma reunião no dia 24 de março, com a nova direção, direção essa que nós apoiámos. Estávamos com expectativas que dela viessem boas notícias, tanto pela reabertura das salas de espetáculos, como pelos anos que passámos a reivindicar algumas coisas que estavam menos bem”, conta o produtor ao telefone, relembrando que a “Yellow Star Company deu “uma nova vida” àquele teatro e, ainda assim, a produtora foi confrontada com a não renovação do contrato”. “Apesar de estarmos a viver neste contexto pandémico em que a cultura é uma das principais lesadas (sempre a tentar levantar a cabeça), percebemos que era uma decisão definitiva”, explica o responsável.

Paulo Sousa Costa explica que de início foi dado o mês de julho como limite para a produtora abandonar o Teatro Armando Cortez, em Lisboa. Contudo, após a chamada de atenção por parte da produtora para o contexto pandémico, a “nova direção da Apoiarte – Casa do Artista, sensível perante o momento que o país atravessa e, particularmente, face à situação dos profissionais da cultura em Portugal, estendeu o prazo de saída da Yellow Star Company até ao final do ano”, disse ao i a nova direção.

O PORQUÊ DA RESCISÃO DO CONTRATO A justificação para o fim do vínculo prendeu-se com o facto de o novo modelo preconizar “ao invés de possuir uma companhia residente e em permanência, querer abranger uma maior panóplia de projetos criativos que possam engrandecer e diversificar a oferta da Casa do Artista, dando oportunidade de todos poderem desfrutar das condições únicas e particulares do Teatro Armando Cortez”, avançou. “Sendo que há duas companhias residentes, a nossa e a TIL (Teatro Infantil de Lisboa), foi-nos dito, nessa altura, que as duas seriam dispensadas”, declara Paulo Sousa Costa. O produtor diz que, embora seja uma decisão legal, peca por pouco humana e pouco ética, pois deixa os 20 trabalhadores da produtora sem palco. Além disso, “não deixamos de ficar estupefactos com a frieza com que nos foi dada a notícia, tendo em conta todo o trabalho que desenvolvemos ao longo de cinco anos e meio, num teatro que ninguém queria frequentar”, continua. “Não tivemos nenhuma palavra de conforto, nenhuma demonstração de gratidão. A reunião podia ter começado com um agradecimento ao nosso trabalho, mas não, foi seca: ‘Novas ideias, novas cabeças, já não contamos com vocês’”.

A nova direção esclareceu, porém, que a decisão de não renovação do contrato com a Yellow Star Company foi tomada pela equipa anterior, “na segunda metade de 2020”, tendo sido comunicada à produtora na altura, mas apenas oficializada esta semana. E, por isso, a nova direção, “apenas deu seguimento ao processo que já se encontrava em curso”, salientou.

Paulo Sousa Costa ficou surpreendido pelas razões da rescisão do contrato pois, sublinha que “em 74 espetáculos que fizemos, mais de 50 não foram nossos, foram precisamente de acolhimento, portanto, nós sempre acolhemos muitas companhias, apesar de estarmos lá como residentes”. A diversidade e o dar oportunidade a outros profissionais, defende, nunca foram problema.

AS QUESTÕES QUE FICAM POR RESPONDER “Sinto que eles agora estão a tentar afinar o discurso”, desabafa o responsável da Yellow Star Company. “Só se lembraram de que estamos a viver uma pandemia quando os interrogámos sobre o facto de nos conseguirem dispensar assim”, conta. “A partir daí começou a emergir um desagrado, tanto por parte de colegas nossos, como de pessoas que ficaram a saber, antes de isto se ter tornado público”, afirma. Segundo o responsável, atualmente “a nova direção diz-nos que nos tinham informado que nós podíamos ficar até ao final do ano. Isso não é verdade. O que eles disseram foi que ‘acaba o contrato em julho, em julho e agosto vai haver obras e, por isso, não queremos nada que não seja apenas da casa do artista’”. Mas a nova direção contrapõe: “Não tivemos nenhum manifesto de interesse nem qualquer resposta por parte da companhia”.

Sobre o projeto cultural que a nova direção pretende para o Teatro Armando Cortez, a Casa do Artista explicou ainda que solicitou propostas a diversas entidades, incluindo à Yellow Star Company, “estando agora a decorrer o processo de receção de projetos”. O produtor esclarece a questão: “O que nos disseram, já depois dessa reunião, foi que nós poderíamos continuar a fazer lá espetáculos, ou seja, não nos fechariam as portas e poderíamos enviar as nossas propostas de programação que iriam analisar e, consoante a nossa proposta, dentro de prazos razoáveis de tempo e nas condições que eles puderem, se calhar até poderíamos ficar até ao final de dezembro”. E quais são essas condições? “Nós podemos não conseguir pagar essas condições”, alerta.

Em várias publicações de Facebook, onde se vê manifestado o desagrado por parte de colegas de profissão, amigos e seguidores, a nova direção é acusada de estar a colocar “na mesa” os interesses de um dos seus membros, Paulo Dias, da UAU (empresa portuguesa dedicada ao entretenimento e especializada na conceção, produção e promoção de espetáculos, digressões e eventos) e concorrente direta da YSC. A nova direção responde que todos os membros da direção da Apoiarte – Casa do Artista são voluntários e desempenham as suas funções doando a sua disponibilidade e o seu conhecimento em prol da Instituição e do setor das artes. Dentro do seu código de ética os elementos da direção não pretendem fazer concorrência a parceiros da Instituição”.

Além de José Raposo, a nova direção da Apoiarte – Casa do Artista integra Paulo Dias, Luís Aleluia, Sofia Grillo, Conceição Carvalho, Frederico Corado, Rui Veloso, Luís Alberto, Helena Vieira e Natália Luiza. A assembleia-geral é presidida por Lauro António, contando ainda com Simone de Oliveira, Otávio Clérigo, Carlos Alberto Moniz e Isabel Damatta.