Teletrabalho. PS diz que empresas não têm de pagar “todas e quaisquer” despesas

Teletrabalho. PS diz que empresas não têm de pagar “todas e quaisquer” despesas


Ana Catarina Mendes defendeu no Parlamento que pagamento das despesas com luz, água e internet deve ser acordada entre empregadores e trabalhadores.


As despesas dos trabalhadores que se encontram em teletrabalho continuou a ser o ponto mais “quente” do debate levado, ontem, a plenário da Assembleia da República que discutiu na generalidade dez projetos de lei tendo em vista a regulamentação deste regime – um agendamento potestativo que partiu do Bloco de Esquerda, e posteriormente acompanhado pelo PS, PSD, PCP, CDS-PP, PAN, “Os Verdes” e pela deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Face às exigências dos partidos mais à esquerda, que defendem que as entidades empregadoras devem suportar obrigatoriamente o acréscimo das despesas dos trabalhadores com eletricidade, água e telecomunicações (posição defendida por BE, PCP e PAN), o PS defendeu que as empresas não têm de assumir “todas e quaisquer despesas” apenas por os trabalhadores estarem em contexto de teletrabalho. Posição, aliás, alinhada com a do PSD.

Neste capítulo, socialistas e sociais-democratas entendem que esse eventual pagamento não deve estar contemplado na lei e deve, por sua vez, ser definido com base num acordo entre as partes, ou seja, empregadores e trabalhadores, através de contratos individuais ou coletivos.

 

Clivagem de opiniões

A visão de PS e PSD foi alvo de críticas de José Soeiro que, logo na abertura do debate, considerou que a atual regulação do teletrabalho – que existe na lei desde 2003 – “é frágil e não protege convenientemente quem trabalha”, sendo urgente, por isso, mudá-la. O deputado do Bloco de Esquerda censurou os projetos do PS e PSD por, em vez de consagrarem obrigações, “definirem possibilidades”.

“Nas várias iniciativas que foram apresentadas, é possível identificar uma clivagem essencial. De um lado, projetos, como o do Bloco de Esquerda, que dizem que a lei deve consagrar direitos e deveres; do outro, os projetos do PS e do PSD que definem possibilidades. Discordamos totalmente desta opção, porque achamos que a lei tem de definir direitos e não enunciar hipóteses que ficam sujeitos à melhor ou pior vontade do empregador, numa negociação sempre desigual”, disse José Soeiro.

Em resposta à intervenção do bloquista, Ana Catarina Mendes, líder parlamentar do PS, afirmou que “quanto às despesas, há uma coisa que nos divide”. “Esta bancada não acha que, só por ir para casa em teletrabalho, a empresa tem de assumir todas e quaisquer despesas. Isto tem de ser objeto de matéria de acordo e tem de ser comprovado qual é o acréscimo de despesa, disse a deputada.

 

Lei “extravagante”

A proposta do PS para o teletrabalho também foi criticada por não alterar o Código do Trabalho, mas apenas criar uma regulamentação complementar. Bloco de Esquerda e PSD consideraram esta medida insuficiente. José Soeiro lamentou a proposta da bancada do PS, considerando que “esta é uma solução esquisita que vai criar ruído”.

Na resposta, Ana Catarina Mendes defendeu a opção socialista por uma lei “extravagante”, uma vez que a mesma será legislada enquanto regime autónomo do Código do Trabalho.

“Porque é que nós fazemos a lei extravagante e não colocamos pensos rápidos nos sete artigos do Código do Trabalho?” Não percebo a estranheza. Existe a lei dos acidentes de trabalho, existe a lei dos contratos sociais, existe a lei de segurança e saúde no trabalho. Alguma vez isso debilitou qualquer norma que esteja no Código do Trabalho?”, afirmou.

Perante esta posição o PSD foi mais longe e lançou a acusação de existirem neste momento duas posições contraditórias no interior do PS: a do grupo parlamentar e a do Governo que, no ano passado, iniciou uma discussão para alterações legislativas do teletrabalho no âmbito da preparação do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho.

Ana Catarina Mendes respondeu dizendo que “ninguém está a competir com ninguém, é só um PS”. Uma posição que acabou por ser secundada pelo secretário de Estado do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, presente no debate no Parlamento, que admitiu “virtualidades” nalguns outros projetos, mas escusou-se a tecer mais comentários relativamente ao teor das propostas apresentadas..

Durante o debate, todos os proponentes entregaram um requerimento à mesa da Assembleia da República para pedir que as iniciativas legislativas desçam diretamente para a especialidade, não sendo assim votadas na generalidade. A baixa à comissão competente será por um período de 60 dias, podendo assim todas as iniciativas legislativas serem validadas para o processo legislativo.

 

Um questão de timing

Outra crítica dirigida ao PS é o facto de estar a propor a regulamentação do teletrabalho antes da discussão com os parceiros sociais, em sede de Concertação Social. A deputada do PSD, Lina Lopes, acusou o PS de “começar a casa pelo telhado” ao avançar com uma proposta no parlamento sem debater com os parceiros sociais e a avançar com uma iniciativa “avulsa” e “em cima do acontecimento”.

Ana Catarina Mendes respondeu dizendo que “o que está em discussão em Concertação Social, e que em nada belisca a discussão” na Assembleia da República, é o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho que inclui várias matérias laborais, entre as quais o teletrabalho. “A Concertação Social é sempre para respeitar”, garantiu a líder parlamentar da bancada do partido do Governo.