Tarda lex, sed lex


Porque se discutem há tanto tempo questões ligadas diretamente ao combate à corrupção e não existe uma espécie de acordo de regime sobre elas?


“No que diz respeito à corrupção política, existe falta de pressão da opinião pública.”
Luís de Sousa, in Público

Não vou fazer nenhuma análise à decisão de Instrução do juiz Ivo Rosa sobre a denominada Operação Marquês porque não tenho competência jurídica para o fazer. Reservo essa tarefa para os juristas, alguns deles já com opinião publicada e, como sabemos, as opiniões dividem-se.

Vale a pena, no entanto, seguindo a opinião de Viriato Soromenho-Marques, num artigo do Público, fazer “o debate político que não fizemos sobre o caso Sócrates, mas que temos de fazer.”

Voltando ao artigo do Público que venho citando, Luís de Sousa, professor do ISCTE e consultor da Comissão Europeia sobre políticas de prevenção da corrupção, afirma: “Falha a punição eleitoral, os atores de controlo não têm estado à altura, estão mal formatados e recursos são escassos”.

Pergunta-se: Porque se discutem há tanto tempo questões ligadas diretamente ao combate à corrupção e não existe uma espécie de acordo de regime sobre elas? O que leva a nossa classe política, ou parte dela, a adiar constantemente o que devia ser urgente e inadiável?

Porque não se encontrou ainda, depois dos vários chumbos do Tribunal Constitucional, uma versão de lei sobre o enriquecimento ilícito que possa ser aprovada?

Porque não se altera o prazo de prescrição dos crimes de corrupção, aumentando-o?

Porque não se decide, de uma vez, dividir os megaprocessos, ao mesmo tempo que se dão mais meios ao Ministério Público, humanos e técnicos, para que seja possível concretizar as investigações e produzir acusação em tempo razoável?

Porque não se criam as equipas mistas especializadas para processos de especial complexidade, como propõe a ex-Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal? 

Adivinha-se, para já, mais um megaprocesso, o caso BES. Será que alguma lição da Operação Marquês se vai tirar, para aplicar neste processo?

A Justiça é, como sabemos, o principal pilar do Estado de Direito. Quando o pilar treme, é a democracia que sofre.
Nesta matéria, não há inocentes.

A forma como a Operação Marquês foi conduzida é um exemplo triste do que não pode voltar a acontecer. Foram fugas de informação plantadas pela acusação e pela defesa, partes importantes do processo divulgadas pela imprensa, com especial relevo para as escutas. Foram guerras entre juízes, que, aliás, ainda continuam. 
O processo tornou-se público muito antes de o dever ser e, por isso, transformou-se num julgamento popular.
Independentemente da decisão que o tribunal tomará um dia sobre este caso, já há condenados.
A Justiça é, para já, um desses condenados.

Jornalista