Manifestação. Juiz anti-confinamento junta apoiantes no Castelo de Palmela e é acusado de desrespeitar a GNR

Manifestação. Juiz anti-confinamento junta apoiantes no Castelo de Palmela e é acusado de desrespeitar a GNR


GNR assegura que sensibilizou juiz controverso para normas em vigor. César Nogueira, da APG/GNR, lembra que “as leis estão estabelecidas”. A advogada Suzana Garcia afirma que Fonseca e Castro não deve voltar à magistratura.


Três dias depois de o presidente do Conselho Superior da Magistratura (CSM) ter considerado “corrosivo para a imagem da justiça” o posicionamento negacionista assumido pelo juiz Rui Fonseca e Castro, fundador do grupo “Juristas Pela Verdade” e da associação “Habeas Corpus”, entretanto suspenso do Tribunal de Odemira, o magistrado conhecido por se opor ao estado de emergência juntou alguns apoiantes no castelo de Palmela.

Ao i, o tenente-coronel João Fonseca, porta-voz da GNR, diz que a manifestação “cumpriu o formalismo do dever de comunicação à Câmara Municipal da área competente”.

Porém, “no local, desde o início, e verificando-se que os participantes não faziam uso de máscara de proteção individual nem cumpriam o distanciamento social, a Guarda adotou uma atuação ponderada, tendo o promotor da manifestação sido sensibilizado para a necessidade de todos os participantes cumprirem o distanciamento social e fazerem o uso de máscara, de acordo com o estabelecido legalmente”.

Face à “inobservância das normas em vigor”, a força de segurança identificou 13 manifestantes, “não tendo sido possível identificar todos por motivos de ordem operacional”. Foi igualmente elaborado um auto de notícia e os factos foram remetidos ao Tribunal Judicial de Setúbal. O tenente-coronel evidenciou ainda que foram também elaborados 12 autos de contraordenação por não utilização de máscara quando não garantido o distanciamento social.

Um gigante adormecido “É com uma enorme felicidade que vejo cada vez mais pessoas com coragem para se apresentarem publicamente contra a ditadura sanitária, corrupta e pedófila que ocupa temporariamente o poder”, escreveu Fonseca e Castro na página de Facebook da associação Habeas Corpus, assegurando que a adesão ao protesto “trata-se da confirmação de uma certeza” que já tinha, de que “a população portuguesa é um gigante adormecido que está paulatinamente a sair do seu torpor para vir resgatar a Nação das mãos de uma desprezível associação criminosa”.

Na mesma publicação, o magistrado clarificou que “se, por um lado, a GNR de Palmela já tem histórico de interferência em manifestações, por outro, a sua atuação contrasta diametralmente com a postura exemplar da GNR de Sagres, cujos militares lá presentes mostraram fidelidade ao seu juramento de ‘servir e proteger’” e, por isso, prepara queixas-crime contra os militares da GNR que “tentaram intimidar e interferir na manifestação”.

Em entrevista ao i, César Nogueira, Presidente da Associação de Profissionais da Guarda (APG/GNR), declarou que “sendo ele a pessoa que é, por desempenhar o cargo de juiz, tenta afrontar – não só desrespeitar – as forças de segurança”.

“Esse senhor deve ter alguma agenda que desconhecemos” “O direito de manifestação está consagrado, mas existem regras que não fomos nós que criámos, estão estabelecidas”, salientou o dirigente, adicionando que “esse senhor deve ter alguma agenda que desconhecemos, mas o que é certo é que desrespeitou os camaradas que estavam no local e que, a nosso entender, agiram muito bem e procederam em conformidade”.

Nos vídeos veiculados no “Grupo Apoio ao Dr. Rui Fonseca e Castro (Juiz)”, que contava com quase 4000 membros à hora de fecho desta edição, é possível percecionar que variados manifestantes se opuseram à consulta do cartão do cidadão pelos militares presentes e, inclusivamente, insistiram que os mesmos abandonassem o local.

“Esteve ali em causa a própria dignidade dos profissionais que estavam a trabalhar e tentaram fazer cumprir aquilo que está decretado. Num regime democrático existem regras, mas este senhor pensa que temos de viver numa anarquia”, continuou o cabo ao serviço do posto de Lever, em Vila Nova de Gaia, explicitando que Fonseca e Castro “quer impor a sua opinião à força”. E, para atingir esse fim, Fonseca e Castro usa o estatuto de juiz, acredita César Nogueira. “Certamente que os colegas dele não se reveem nessa postura e, mais uma vez, digo que utiliza a capa para contornar as regras”, afirmou, constatando que “pela posição que assume, quem o acompanha tenta adotá-la para estar minimamente salvaguardado”.

Nas imagens partilhadas no Facebook, nota-se que Fonseca e Castro evocou uma eventual detenção, por parte da GNR, e, na ótica do presidente da APG/GNR, o autor dos célebres cadernos de minutas que lançou para supostamente salvaguardar os direitos dos cidadãos em pleno estado de emergência, “tentou que houvesse uma detenção para sair dali como mártir”.

“Ele quer ter palco e, através destas ações, arranja-o. É um mau exemplo para a sociedade. Se viver uma pandemia já é difícil, uma pessoa destas que tenta arranjar protagonismo torna tudo ainda mais complicado”, remata César Nogueira, concluindo que “aquilo que a APG/GNR pede é que haja consequências porque não vale tudo”.

“Quem lhe dera chegar ao dedo mindinho de Magina da Silva” Quem partilha do mesmo ponto de vista é a advogada e ex-comentadora televisiva Suzana Garcia, candidata pelo PSD à Câmara Municipal da Amadora. “Além de tudo aquilo que ele fez, alguém que promove um ajuntamento num cenário de pandemia, com regras de confinamento do conhecimento geral e diz que as máscaras têm efeitos nocivos quando sabemos que são barreiras de proteção, não pode desempenhar o cargo de juiz”, afirma.

“Vivemos em sociedade, temos sempre de nos preocupar com valores sociais. Não vale tudo para que um ponto de vista prevaleça”, avançou a advogada. “Ao ser confrontado por uma força de segurança, muito me entristece que um juiz se abespinhe com a mesma”, revelou. “Dizer que não consente que seja feita a identificação dos manifestantes e pedir que os militares sejam retirados do local constitui um fator de perigo para as pessoas que lá estavam e para a perceção que todos têm da justiça”, referiu, provando que tal seria mau pronunciado por um cidadão-comum, mas torna-se “ainda mais grave” sendo dito por um juiz.

“Apesar da aparência de coragem e valentia, se ele não concorda com a lei, não tem de ir contra a pessoa que está a aplicar a mesma – não deve matar o mensageiro, no sentido figurativo –, mas sim contactar o Governo, que legislou sobre esta matéria”, sugeriu a advogada, que considera que “alguém que incita um cidadão ao incumprimento das regras do estado de emergência” não deve exercer “tão importante função”.

Recorde-se que, no início de março, o Nascer do Sol noticiou que Fonseca e Castro havia sido acusado de incentivar os cidadãos a fazer queixa das forças de segurança através da publicação de um caderno de minutas, por meio da página Juristas Pela Verdade, que visava conferir a todos quantos vivem as “graves restrições ao exercício de direitos, liberdades e garantias […] a possibilidade de fazerem valer” os mesmos “com ou sem recurso a serviços advocatícios”.

Neste sentido, Suzana Garcia declarou que entendeu que “as forças de segurança estão a ser afrontadas para que seja criado um incidente artificial e algumas pessoas se tornem mártires”. Acerca do dever de reserva associado aos magistrados, a antiga comentadora rematou que “um juiz administra a justiça em prol dos cidadãos, portanto, tem de estar num patamar de insuspeição e imparcialidade que ele não tem estado”.

Não é a primeira vez que Fonseca e Castro afronta as autoridades. Após, no final de março, a Polícia de Segurança Pública ter feito queixa ao Conselho Superior de Magistratura, levando a que o juiz fosse suspenso das funções que exercia no Tribunal de Odemira, Fonseca e Castro disse de Magina da Silva, diretor nacional da PSP: “É um queixinhas, parece uma menina a chorar”. De seguida, desafiou Magina da Silva para um combate de MMA, mixed martial arts.
Sobre este evento, Suzana Garcia é assertiva: “Quando ele diz que está a ajudar as pessoas a valerem os seus direitos perante um ataque violento, se isso é assim, então ataque o Estado. Quem lhe dera chegar ao dedo mindinho de Magina da Silva”, rematou.