Recordo-me de, há uns anos, um amigo que tinha um percurso profissional brilhante me dizer que o seu currículo cabia numa folha de papel. Indicava apenas o ano da licenciatura, apontava os três cargos que constituíam os principais marcos da sua carreira – e era tudo. Uma simples folhinha de papel.
Evidentemente, este amigo pertence a uma espécie pouco comum entre nós, diria mesmo que é uma ave rara. O mais habitual é despejarem-se no currículo, sem critério, todos os títulos e cargos, artigos publicados, conferências que se proferiu (ou a que se assistiu) e o diabo a quatro.
Pior: também não falta em Portugal quem, achando que o seu currículo não é suficientemente bom ou impressionante, lhe dá uns retoques aqui e ali, embelezando-o a seu bel-prazer com factos que podem ou não ser verdade.
Temos tido alguns casos desses nos últimos tempos. Se o do procurador José Guerra foi o mais grave, dado tratar-se de um magistrado que se candidatava a um cargo internacional, o de Feliciano Barreiras Duarte foi talvez o mais caricato, uma vez que dava a entender que era investigador de uma prestigiada universidade norte-americana onde não sei se sequer alguma vez pôs os pés.
O caso acaba de ser arquivado pelo Ministério Público. “O arguido, quando invocou a qualidade de ‘visiting scholar’ (investigador convidado), agia sabendo que tal não era verdade […], não vislumbro, no momento, a possibilidade de realização de diligências que levem ao melhor esclarecimento dos factos”, esclareceu o MP. Barreiras Duarte congratulou-se com a decisão – e é compreensível. Mas não me parece que tenha muitos motivos de que se orgulhar.
Disse o filósofo chinês Lao Tsé que ninguém consegue aguentar muito tempo em bicos de pés. E como tinha razão! Mais cedo ou mais tarde, a nossa verdadeira estatura acabará por revelar-se. Mas no caso dos currículos “embelezados” julgo que ainda é pior do que isso: a tentativa de alguém se fazer passar pelo que não é faz com que, aos olhos dos outros, pareça ainda mais pequenino.