Se me é permitido retomar o Dia do Pai, quero aqui recordar a minha infância, quando na escola inventava presentes para oferecer ao homenageado. Na verdade, porque não tive a meu lado um pai, oferecia-os sempre à minha mãe.
Em todos os dias especiais há um oportunismo comercial, consumista e vulgar que invade o nosso universo familiar. Muitas crianças, pela mão de um adulto, oferecem perfumes, relógios, gravatas ou carteiras. Porque as circunstâncias que atravessamos se revelam propícias à reflexão sobre a forma como vivemos estes dias e porque os presentes estão cada vez mais caros, aqui fica um momento de partilha, quem sabe útil e pertinente.
Houve um Dia do Pai em que eu não tinha presente para oferecer, porque não tinha havido aulas. Resolvi por isso tratar do assunto: meti mãos à obra e dediquei-me a colher flores. Durante longos minutos percorri os campos à volta do meu prédio e, aqui e ali, fui colhendo as mais bonitas que encontrei. Amarrei o molho com um cordel e ofereci-o à minha mãe. Porém, ela ficou espantada quando se percebeu da realidade – eram vulgares ervas daninhas misturadas com cardos e alguns insetos – que lhe agradaram mesmo assim. Tinha cinco anos e fiquei muito feliz por a minha mãe ter gostado. Era o dia dela. Era o Dia do Pai.
Mas porque gosto de apresentar soluções variadas, além deste meu episódio que podia ter corrido pior, quero partilhar um outro, até porque pode ser que ajude alguém a encontrar um presente original que celebre este dia.
Há muito tempo, um homem castigou a sua filha de seis anos por ter desperdiçado um rolo de papel de embrulho dourado. O dinheiro era pouco, razão pela qual o homem ficou furioso ao ver a menina a embrulhar uma caixa com aquele valioso papel. Apesar de tudo, na manhã seguinte, a menina pegou no embrulho, entregou-o ao pai e disse-lhe que era um presente para ele. O pai, envergonhado por causa da reação do dia anterior deu-lhe um beijo e agradeceu, mas voltou a zangar-se quando viu que a caixa estava vazia. Gritou com a criança e perguntou-lhe se ela não sabia que quando se oferece um presente a alguém, guarda-se qualquer coisa dentro da caixa. A menina olhou-o com lágrimas nos olhos e, soluçando, pediu-lhe desculpa explicando que a caixa não estava vazia: no dia anterior tinha deitado muitos beijinhos lá para dentro. A caixa estava cheia deles.
O pai quase morreu de vergonha, abraçou a menina e suplicou-lhe que o perdoasse.
Dizem que o homem guardou a caixa dourada ao lado da sua cama por muitos anos, e, sempre que se sentia triste, chateado ou deprimido, pegava na caixa e dela retirava um beijo imaginário, recordando o amor que a sua filha ali tinha guardado.
Porque os meus pequeninos ainda não sabem ler, não vão ter consciência deste texto, pelo menos por agora. Porém, pode ser que um dia o encontrem e se detenham na sua leitura. Assim, quero que saibam que lhes agradeço publicamente a circunstância maravilhosa de me terem ensinado a ser pai, mesmo depois de o ter aprendido com a minha mãe. Além disso, também lhes deixo aqui, muitos beijinhos guardados nas reticências (…)
Professor e investigador