Uma azul que não há


Os dias passaram a ser claros, quase transparentes. Olhar para o céu dói num ponto qualquer por detrás dos olhos, exatamente como sucedia quando via, na minha frente, a limpidez do teu sorriso. Os pardais invadiram-me a varanda e lutam sem quartel pelos bagos de milho que lhes deixo no parapeito. Deve haver bagos mais…


Os dias passaram a ser claros, quase transparentes. Olhar para o céu dói num ponto qualquer por detrás dos olhos, exatamente como sucedia quando via, na minha frente, a limpidez do teu sorriso. Os pardais invadiram-me a varanda e lutam sem quartel pelos bagos de milho que lhes deixo no parapeito. Deve haver bagos mais apetitosos do que outros já que chegam e sobram para todos eles. Talvez seja um tom de esperança, aquele azul de que o céu é feito, aquele azul hoje tão azul que é como o azul de Caetano Veloso, um azul que não há.

Contamos os dias para que nos devolvam a liberdade, prometida para fins de abril, mês da liberdade. Ou se calhar para início de maio, mês das Rosas. É difícil despegar o olhar deste tom tão plácido. Como dizia Verlaine: “O céu por cima do telhado é tão azul e tão calmo”.

O Príncipe dos Poetas, viciado no absinto, perdido na miséria pelas ruas de Paris, amargurado até ao azedume mas impedindo que a mágoa invadisse a clareza da sua poesia. “Oh! c’est triste! – Et toi-même, est-ce pas! es touchée/D’un si dolent tableau, bien que ton oeil frivole/S’amuse au papillon de pourpre et d’or qui vole/Au-dessus des débris dont l’allée est jonchée”. Não encontro, por mais que esforce a vista, essa borboleta de ouro e púrpura que voa sobre as ruínas do amor que juncam a avenida. Era, também ela, um sinal de esperança que enternecia quem olhava para um quadro triste. Tantas horas de solidão não mataram a poesia. Tantas horas de silêncio não mataram a poesia. Tanta distância do carinho e da ternura que foram ficando pelo caminho não mataram a poesia. Translúcida, uma pequena sombra pousa sobre o Sado como se fosse apenas uma gaivota cansada. Até nesse pousar há poesia, se quisermos continuar a acreditar nela no meio desta luta contra o monstro invisível dos nossos medos. Tanto caminho ainda por percorrer sem a certeza de haver um paraíso ao fundo…

Uma azul que não há


Os dias passaram a ser claros, quase transparentes. Olhar para o céu dói num ponto qualquer por detrás dos olhos, exatamente como sucedia quando via, na minha frente, a limpidez do teu sorriso. Os pardais invadiram-me a varanda e lutam sem quartel pelos bagos de milho que lhes deixo no parapeito. Deve haver bagos mais…


Os dias passaram a ser claros, quase transparentes. Olhar para o céu dói num ponto qualquer por detrás dos olhos, exatamente como sucedia quando via, na minha frente, a limpidez do teu sorriso. Os pardais invadiram-me a varanda e lutam sem quartel pelos bagos de milho que lhes deixo no parapeito. Deve haver bagos mais apetitosos do que outros já que chegam e sobram para todos eles. Talvez seja um tom de esperança, aquele azul de que o céu é feito, aquele azul hoje tão azul que é como o azul de Caetano Veloso, um azul que não há.

Contamos os dias para que nos devolvam a liberdade, prometida para fins de abril, mês da liberdade. Ou se calhar para início de maio, mês das Rosas. É difícil despegar o olhar deste tom tão plácido. Como dizia Verlaine: “O céu por cima do telhado é tão azul e tão calmo”.

O Príncipe dos Poetas, viciado no absinto, perdido na miséria pelas ruas de Paris, amargurado até ao azedume mas impedindo que a mágoa invadisse a clareza da sua poesia. “Oh! c’est triste! – Et toi-même, est-ce pas! es touchée/D’un si dolent tableau, bien que ton oeil frivole/S’amuse au papillon de pourpre et d’or qui vole/Au-dessus des débris dont l’allée est jonchée”. Não encontro, por mais que esforce a vista, essa borboleta de ouro e púrpura que voa sobre as ruínas do amor que juncam a avenida. Era, também ela, um sinal de esperança que enternecia quem olhava para um quadro triste. Tantas horas de solidão não mataram a poesia. Tantas horas de silêncio não mataram a poesia. Tanta distância do carinho e da ternura que foram ficando pelo caminho não mataram a poesia. Translúcida, uma pequena sombra pousa sobre o Sado como se fosse apenas uma gaivota cansada. Até nesse pousar há poesia, se quisermos continuar a acreditar nela no meio desta luta contra o monstro invisível dos nossos medos. Tanto caminho ainda por percorrer sem a certeza de haver um paraíso ao fundo…