O ministério da solidão


Estudos médicos afirmam que o isolamento social tem graves consequências físicas e mentais e é um elevado fator de risco de doenças cardíacas, diabetes e cancro.


Na solidão, cada um sente o que é.” 
Arthur Schopenhauer 

O Governo japonês criou recentemente o Ministério da Solidão. O objetivo é ajudar as pessoas que estão isoladas em casa por causa da pandemia. Os números mostram que os suicídios no Japão aumentaram em 2020 – cerca de 21 mil mortos. 

Ainda segundo dados oficiais, em outubro de 2020, o número de suicídios no Japão foi superior ao número de mortes por covid-19 desde o início da pandemia.

A medida não é inédita.

Em 2018, Theresa May, chefe do Governo britânico, criou um ministério para, segundo justificou, tratar da “triste realidade moderna”: a solidão”.

Em 2017, um estudo afirmava que cerca de 9 milhões de pessoas se sentiam sozinhas na Grã-Bretanha. 

Estudos médicos afirmam que o isolamento social tem graves consequências físicas e mentais e é um elevado fator de risco de doenças cardíacas, diabetes e cancro. 

Nos Estados Unidos, a solidão é já considerada uma verdadeira “epidemia”, pelo número de pessoas afetadas e pelas suas consequências. Uma investigação conduzida pela Associação Americana de Psicologia, em 2017, considera que a solidão pode tornar-se um problema de saúde pública maior do que a obesidade. 

Segundo dados da GNR, em Portugal, cerca de 42 mil idosos vivem sozinhos, normalmente isolados em aldeias pouco povoadas e longe da família. 

Num estudo do Observatório da Sociedade Portuguesa, da Universidade Católica, realizado em 2016, num painel de 973 indivíduos, 70 por cento afirmou não se sentir só. 

Sendo, ao que tudo indica, uma realidade menos grave do que a de outros países, a verdade é que a pandemia terá certamente agravado este sentimento de solidão. 

E, quando falamos de solidão, esquecemos muitas vezes os adolescentes que, segundo o coordenador do estudo, Adalberto Carvalho, citado pela Rádio Renascença, “são mais afetados pela solidão do que os idosos”, acrescentando, no entanto, que “têm uma vantagem: Saem mais precocemente de estado de solidão do que os idosos”.

“Quando se passa da idade da infância à aproximação da idade adulta há um desligamento relativamente aos referenciais familiares e a busca de novas referências – amigos, companheiros – o que implica uma rutura em relação ao passado que muitas vezes não é preenchida com as novas aquisições, o que traz fenómenos muito graves de solidão que explicam o suicídio adolescente, um fenómeno que existe e é muitas vezes ignorado”.

Seria bom que os governos se começassem a preocupar com temas como este. São assuntos reais, vividos por pessoas reais, que pagam impostos e que querem saber como é gasto o dinheiro que dão ao Estado. 

Na verdade, por cá, a ideia seria, por exemplo, criar o Ministério da Ineficácia e do Desperdício. 

Assim, em vez de se correr constantemente a reboque de notícias ou da pressão pública – como é o caso recente da aprovação pelo INFARMED do medicamento para a fibrose quística, depois de um apelo nas redes sociais e de uma petição pública assinada por 74 488 cidadãos –, talvez se prevenissem situações e, sobretudo, se gastasse o dinheiro de todos nós com critério, parcimónia e eficácia. 

Jornalista