São várias as autarquias pelo país que gastaram dezenas e até centenas de milhares de euros em aquisições de computadores portáteis para o ensino à distância. Uma pesquisa feita pelo i no portal Base permite-nos perceber que no total – mesmo depois de o Governo ter anunciado a compra de equipamentos para este fim – dezenas de municípios portugueses já gastaram perto de dois milhões de euros para que os alunos dos seus concelhos pudessem participar nas aulas online, decretadas pelo confinamento iniciado em janeiro. No entanto, importa referir que este valor poderá ser maior, tendo em conta que nem todos os contratos podem estar ainda publicados no portal.
Pela ronda feita pelo i, uma das câmaras que mais dinheiro investiu foi a de Cascais que gastou quase 383 mil euros em 1.000 packs para os alunos do concelho que incluem um portátil, uma mala e um rato. O anúncio desta compra e respetiva entrega foi feita no início deste mês e é justificada pelo facto de os computadores do Governo ainda não terem chegado. “A administração central (ministério da Educação) entregou apenas 3.500 equipamentos para um universo de 38 mil alunos (público e privado). Assim, a autarquia teve de garantir que nenhum aluno escalão A e B do ensino público de Cascais ficasse para trás perante novo período de ensino à distância. Comprou 1.000 portáteis e 700 tablets”, explica ao i, o gabinete de comunicação da autarquia.
A mesma fonte diz estar então a aguardar “até ao final de março”, conforme prometido pelo ministério, a chegada dos restantes computadores.
Em relação aos que já foram adquiridos pela autarquia terão depois outro final: “Vão ser encaminhados para cidadãos seniores que se encontram sozinhos, sendo esta uma forma de ajudar a combater a solidão nestes tempos de pandemia. Existe também a possibilidade de algum equipamento permanecer nas escolas”.
No caso da Câmara Municipal da Amadora, a autarquia diz ao i que o investimento ascendeu aos 396.857 euros para a compra de 1.042 computadores portáteis e 15 webcams e routers.
Questionada pelo i se a necessidade desta compra se prende com o facto de os computadores prometidos pelo Governo ainda não terem chegado, a CMA diz que são um complemento. “A Câmara Municipal da Amadora […] voltou a associar-se às escolas na procura de respostas aos desafios que a modalidade de ensino à distância coloca”.
A autarquia liderada por Carla Tavares diz ainda que estes equipamentos foram disponibilizados aos agrupamentos de escolas do concelho, “a quem cabe a tarefa de identificar os alunos sem os meios necessários para o acesso ao ensino presencial e ceder, a título de empréstimo os computadores”. “Estes equipamentos vêm complementar os já existentes em cada agrupamento de escolas, bem como os que foram entregues pelo ministério da Educação”.
A câmara diz ainda que entregou, até à data, no âmbito do processo de modernização tecnológica, 383 tablets nos agrupamentos de escolas.
Em Tondela, no distrito de Viseu, o investimento nestes equipamentos foi já feito na primeira vez que os alunos tiveram de ficar em casa, como explicou ao i, José António Jesus, presidente daquela autarquia. “O município o que fez nesta fase foi aplicar a entrega de computadores que já tinha comprado na primeira fase de desconfinamento cujo valor de aquisição nessa circunstância oscilou entre 25 a 30 mil euros”.
Nessa altura, em que ainda não havia resposta do ministério da Educação no que diz respeito à distribuição do material informático, o município de Tondela “aplicou esta distribuição em articulação com os agrupamentos, junto de alunos que têm ação social escolar e, ao mesmo tempo, também junto daqueles que pudessem estar em situação de maior fragilidade do ponto de vista de acesso, nomeadamente tendo em conta a rede de comunicações”.
Além dos computadores, esta autarquia do centro do país disponibilizou ainda pens de acesso à internet. “Quando isto foi feito não havia ainda a distribuição de equipamento informático por parte do poder central. Agora quando voltou o confinamento, voltou a aplicar-se a esses alunos carenciados”, diz José António Jesus.
E os computadores do Estado? “Neste momento, tanto quanto se sabe, já nomeadamente em relação ao ensino secundário têm vindo a chegar os recursos disponibilizados pelo Ministério da Educação de forma gradual”, conta o autarca.
Em Montalegre, Vila Real, a autarquia também avançou com mais de 33 mil euros para que todos os alunos do concelho pudessem ter acesso a um computador e poder estudar.
Orlando Alves, presidente desta autarquia, diz ao i que seria “de mau grado estarmos convencidos e termos a certeza que o Governo que vai fazer a aquisição de muitos computadores para chegar a todas as escolas”.
Mas justifica esta afirmação: “Trata-se de um processo moroso”. E porque a câmara de Montalegre não quis agravar a condição destes alunos do interior e que “essa demora viesse a ter uma incidência negativa a repercutir-se negativamente no aproveitamento escolar das nossas crianças”, avançou com a compra.
Quando chegarem os computadores do Governo, os já comprados pela câmara serão dados às escolas para que sejam distribuídos pelos alunos que venham a entrar na escola mais tarde.
No entanto, Orlando Alves é claro: “O Governo está a trabalhar muito bem. Só quem não está dentro dos processos da contratação é que pode sonhar que os computadores chegam de uma hora para a outra. Não é assim. É um processo moroso e, por ser moroso e porque quem vive no interior tem que sentir que pelo menos tem um órgão de proximidade como é uma câmara que está virada para a resolução dos problemas das pessoas, a Câmara Municipal de Montalegre foi o que fez”, criando então condições para “não agravar ainda mais as desigualdades entre litoral e interior, entre ricos e pobres”.
Outros casos
Em Nelas, no distrito de Viseu, a câmara investiu cerca de 85 mil euros na compra destes equipamentos para os estudantes e diz que conseguiu atingir 100% de cobertura no ensino digital com todos os 1.388 alunos do 1.º ciclo ao ensino secundário com acesso a um computador ligado à internet.
A título de exemplo juntam-se ainda os municípios de Mértola (19.188 euros), Gondomar (344.400 euros), Almada (11.300 euros), Coimbra (650 mil euros) e Resende (7.840 euros), entre os vários por todo o país que tiveram de se chegar à frente neste investimento.
Mais de 145 mil computadores entregues
Até ao momento, o Governo já entregou nas escolas cerca de 145 mil computadores, disse o ministério da Educação ao i. Quando ao valor gasto, ultrapassa os 134 milhões de euros. “Os contratos efetuados relativos à totalidade de computadores já comprados estão todos publicitados no portal BASE e ultrapassam os 134 milhões de euros, só em computadores”, avança ainda a tutela.
Em janeiro deste ano, o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, anunciou que foram comprados mais 335 mil computadores que seriam “em breve” entregues nas escolas, os quais se juntam aos 100 mil que foram distribuídos pelos alunos no anterior período.
Mais tarde, a oposição criticou o Governo pelo atraso e o ministro da Educação foi claro: “Os computadores não estavam guardados num armazém, nem aqui nem na China. Não há stock, tiveram de ser feitos para cada encomenda, e isto é um problema mundial”.