O Governo anunciou nova fornada de apoios. Como sempre, as letras minúsculas é que deitam tudo a perder. Desde logo, os números são sempre enormes, imbatíveis: desta feita, 7.000 milhões. Sucede, como é hábito, que à lupa as distorções são mais nítidas. Desse montante, apenas 1000 milhões são a fundo perdido, o restante são diferimentos fiscais. Não paga hoje, paga amanhã. É útil? Sim, é. Mas enquadrá-los sem mais no catálogo dos apoios é muito mais desenhado para causar boa impressão do que para outra coisa qualquer. Basta ver que, por exemplo, um desses apoios se traduz no adiamento do pagamento especial por conta, um imposto que não é mais que a antecipação de lucros futuros. Aliás, um dos responsáveis do Ministério das Finanças afirmou que o impacto nas contas públicas desta medida seria zero. Claro, é um mero adiamento. Causa espanto, por outro lado, que se anunciem apoios quando se começa o processo de desconfinamento. Isso significa, sabendo que o desconfinamento melhorará as condições de funcionamento da economia, que os apoios prestados até aqui foram muito insuficientes e que as empresas em geral, em particular nalguns sectores, como a restauração ou a hotelaria, entre muitos outros, não suportam mais a privação de recursos a que a ausência de apoio consequente do Estado as tem votado. Isso sucede porque há apoios que excluíram quem não deviam, outros ainda estão para ser aprovados e pagos, outros ainda nunca viram a luz do dia. Mas, a par destas, da insuficiência da máquina do Estado, avulta outra razão, mais decisiva, mais estruturante: a dívida pública. Quem tem finanças públicas sãs está a apoiar, porque nos tempos de crescimento económico geriu com responsabilidade as contas públicas, quem não tem, como nós, e nisto infelizmente somos mesmo dos piores, vê-se perante o abismo de não conseguir estancar as perdas da economia e do emprego. Vejam o caso da Alemanha e de muitos outros. E depois verifiquem a nossa situação e concluam.
Por isso, ao contrário de outros, precisamos da bazuca e de todos os outros apoios, porque vivemos, por opção própria, por escolha da sociedade, durante muitos anos, a não entender – e às vezes continuo a pensar que nada mudou – a fábula da cigarra e da formiga. Durante anos, com alguma presunção, ouvi políticos a debitar a respeito disso e achava um argumento muito básico, confesso. Não é básico, mas sim simples, perceptível e óbvio. Infelizmente, o óbvio, ao contrário do que se diz, tem que ser dito. Em Portugal, muitas vezes.
Deputado