Critérios mais apertados para a reabertura

Critérios mais apertados para a reabertura


Especialistas definiram matriz de indicadores para balizar reabertura, mas setores são decididos pelo Governo. Linha vermelha deverá ser fixada nos 240 casos por 100 mil habitantes. Portugal está agora com 132.


O plano para o desconfinamento é anunciado na quinta-feira e os critérios para balizar a reabertura ficaram esta semana definidos entre os especialistas ouvidos regularmente pelo Governo, que apresentarão a matriz numa nova reunião do Infarmed agendada para segunda-feira à tarde. Como o Nascer do SOL noticiou na semana passada, os peritos ouvidos habitualmente no Infarmed têm estado a trabalhar em patamares de risco em função de indicadores que agora irão além do nível de contágio por concelho, o critério adotado pelo Governo no final do ano passado para aplicar o recolher noturno durante a semana e medidas restritivas ao fim de semana nos concelhos de maior risco.

Agora, os critérios propostos são mais abrangentes e mais apertados e as campainhas vão tocar mais cedo.

Além da incidência de novos casos por 100 mil habitantes a 14 dias e a 7 dias, os especialistas consideram que o modelo de avaliação de risco deve ter em conta o número de doentes em UCI e a evolução do índice de transmissão (RT) como indicadores principais e indicadores secundários como a taxa de positividade, com avaliação nacional, regional e por concelho, quando se aplique. O consenso, pedido por António Costa, é de que a abertura deverá ser faseada e avaliada antes de abrir um novo setor de atividade, sendo que a garantia do Governo tem sido de que se começará pelas escolas. Mantendo-se a atual evolução, poderá acontecer na segunda quinzena de março para alunos do pré-escolar e eventualmente dos primeiros ciclos mas, ao que o Nascer do SOL apurou, a ideia é que, abrindo um setor que comporte elevada mobilidade, como é o caso de 1,2 milhões de alunos, a abrir mais atividades deverão ser de baixo risco. Por exemplo, alargar numa primeira fase fruição de espaços ao ar livre.

O plano anunciado esta semana na Alemanha, que confinou mais cedo e agora está a reabrir com uma situação epidemiológica muito idêntica à portuguesa, dá uma ideia do que esperar, mesmo que os patamares e atividades possam não ser idênticos: o plano anunciado esta semana por Angela Merkel prevê a reabertura gradual nas regiões que registam uma incidência inferior a 50 casos por 100 mil habitantes a 7 dias, em intervalos de 15 dias. Começaram por reabrir escolas básicas na semana passada e cabeleireiros, fechados há mais de dois meses, esta semana. Na próxima semana começa a reabrir o comércio não essencial. A 22 de março, mantendo-se a incidência abaixo dos 50 casos por 100 mil habitantes, poderão depois começar a reabrir museus, salas de espetáculos e restaurantes, com marcação e lotações limitadas. Só daqui a um mês poderá contar-se com eventos. Na Alemanha, a parte técnica definiu que as medidas restritivas serão reintroduzidas se durante três dias for ultrapassada uma incidência acumulada semanal de 100 novos casos por 100 mil habitantes.

 

Intervir mais cedo

Por cá, a visão da maioria dos especialistas vai também no sentido de se intervir mais cedo do que aconteceu ao longo dos últimos meses, para prevenir uma escalada de casos – e a esta altura o recrudescimento de casos no centro e leste da Europa tem estado a aumentar a apreensão. Se no fim do ano passado o patamar para medidas mais apertadas eram concelhos com mais de 480 casos por 100 mil habitantes a 14 dias, o Nascer do SOL apurou que o consenso vai no sentido de que a linha vermelha se situe nos 240 casos por 100 mil habitantes e que mesmo antes haja balizas de referência, proposta que, caso seja aceite pelo Governo, significará um reapertar de medidas mais precoce do que aconteceu no último trimestre de 2020.

Recorde-se que o Governo começou por anunciar o regresso ao estado de contingência a 15 de setembro e nessa altura foram limitados ajuntamentos a dez pessoas e foi também nessa altura proibida a venda de bebidas alcoológicas depois das 20 horas, mas o país continuou no regresso à normalidade com a abertura das escolas. Estava-se então com uma incidência de 80 casos por 100 mil habitantes a 14 dias, com cerca de 4 mil novos casos a cada duas semanas. Um mês depois, o Governo anunciou o estado de calamidade, com proibição de circulação à noite, multas mais pesadas e limitação de casamentos e batizados a 50 pessoas. Nessa altura, o país estava com uma incidência de 210 casos por 100 mil habitantes e a partir daí não parou de aumentar.  A 6 de novembro, quando foi decretado de novo o estado de emergência com restrições nos concelhos com mais casos, registava-se já uma incidência cumulativa a 14 dias de 528,9 casos por 100 mil habitantes e novo modelo de alarme agora deverá apitar mais cedo. O objetivo: evitar que os cuidados intensivos voltem a ficar pressionados, o que obriga a cancelar atividade programada nos hospitais depois de já dois períodos de interrupção. Os intensivistas apontaram como limite para o SNS poder funcionar 285 camas de UCI dedicadas à covid-19, com uma ocupação de 85%, o que significa que quando se atingem os 242 doentes com covid-19 em cuidados incentivos começa-se a pisar a linha vermelha.

Nesta altura, há ainda mais de 300 doentes com covid-19 em UCI mas as projeções são de que a meio de março possam já ser menos de 200.

 

RT está a subir desde 12 de fevereiro

Depois do pico de infeções em janeiro, o número de novos casos tem continuado a diminuir e o país atingiu esta sexta-feira a incidência cumulativa a 14 dias mais baixa desde o final de setembro. Nas últimas semanas foram diagnosticados no país 13 mil novos casos de covid-19 – e, recorde-se, no pico de contágios chegou a haver uma média de 12 mil casos por dia –, o que significa, agora, uma incidência cumulativa a 14 dias de 132 casos por 100 mil habitantes e uma incidência semanal de 54 casos por 100 mil habitantes. Um balanço positivo do confinamento e que coloca Portugal entre os países europeus com melhor situação epidemiológica. O fator de preocupação é que  ainda antes de o país desconfinar o RT já tem estado a subir ligeiramente desde 12 de fevereiro, sinal de que se está a ‘reactivar’ a transmissão, como descreveu esta semana o epidemiologista Manuel Carmo Gomes. Enquanto o R continua abaixo de 1, tendencialmente os casos continuam a diminuir mas mais lentamente. De acordo com o relatório semanal do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge divulgado esta sexta-feira, entre 24 e 28 de fevereiro o RT situou-se a nível nacional em 0,71 quando chegou a ser de 0,66, o valor mais baixo desde o início da epidemia. É agora 0,72 na região Norte, 0,63 na região Centro, 0,68 na região Lisboa e Vale do Tejo, 0,73 na região Alentejo, 0,79 na região Algarve, 1,02 na região autónoma dos Açores e 1,15 na região autónoma da Madeira e a subir em todas.

O aumento da mobilidade nas últimas semanas já foi um fator de apreensão deixado na última reunião e acentuou-se. Mantendo-se esta tendência, o país pode chegar ao momento de desconfinamento já com o RT mais perto de 1, com um planalto de casos. Com a descida ganhou no entanto folga, o que pode fazer uma diferença substancial.

A República Checa é de novo o país com maior incidência a nível europeu, com mais de 1300 novos casos por 100 mil habitantes. No fim de janeiro, o mínimo a que conseguiu esmagar a curva foram 800 casos por 100 mil habitantes.

 

Mais uma variante

A incógnita é perceber que impacto terão as novas variantes da dinâmica da epidemia e entre os especialistas a ideia é a de que em janeiro, podendo ter havido algum efeito, foi residual. Portugal vai começar a reabrir com a nova variante inglesa já dominante, mais transmissível e agora também já associada no Reino Unido a um aumento da severidade da doença. Em janeiro, segundo o estudo feito então pelo INSA, representava 16% das amostras de SARS-CoV-2 sequenciadas e agora representa 58%. As variantes sul-africana e brasileiras, também já confirmadas em Portugal mas que não estão disseminadas, são também mais transmissíveis.  Além disso, a variante brasileira tem sido associada a mais casos de reinfeção e é uma das que tem suscitado preocupação por a eficácia das atuais vacinas poder ser menor.

Entretanto, nesta semana, as autoridades britânicas alertaram para uma nova variante, com a mesma mutação (E484K) que as variantes sul-africana e brasileira, e que foi associada à capacidade do vírus para escapar aos anticorpos. Foram identificados 16 casos.