Temos testemunhado frequentemente situações em que alguns cristãos se afirmam perante decisões governamentais, políticas e sociais. Assim foi e assim continua a ser.
Podemos recordar o que aconteceu recentemente perante a aprovação da lei da eutanásia, com o aborto, em relação ao casamento homossexual e diante de outros temas fraturantes onde a ética ou a moral têm uma palavra a dizer.
Ao longo da vida marcamos presença e afirmamo-nos partindo de tomadas de posição. Defendemos o nosso ponto de vista e porque acreditamos ser este o melhor dos caminhos, pretendemos que os outros sigam as nossas ideias como verdades absolutas.
A realidade é que facilmente deparamos com exemplos de afirmação no campo da orientação sexual, religiosa, política, filosófica e até clubística. Para muitos, ser de esquerda, de direita, homossexual, vegetariano ou do Benfica, parece traduzir a razão da sua existência, balizando as suas decisões. Esta forma de estar aparenta ser verdadeiramente redutora. Tão redutora como a orientação escolhida por aqueles que se afirmam pelas funções que desempenham ou pelos cargos que ocupam. Como se uma veste, um título ou uma função definisse o indivíduo. É que os cargos podem ser ocupados por qualquer um de nós, enquanto que cada um é insubstituível como pessoa.
Ainda a propósito dos cristãos, gostava de citar uma carta que remonta aos primeiros tempos do Cristianismo, na qual se explica que “os cristãos não se distinguem dos demais homens, nem pela terra, nem pela língua, nem pelos costumes. Nem, em parte alguma, habitam cidades peculiares, nem usam alguma língua distinta, nem vivem uma vida de natureza singular. Habitando cidades Gregas e Bárbaras, conforme coube em sorte a cada um, e seguindo os usos e costumes no que toca o vestuário, o regime alimentar e o resto da vida, revelam unanimemente uma maravilhosa e paradoxal constituição no seu regime de vida político-social. Habitam pátrias próprias, mas como peregrinos. Participam de tudo, como cidadãos, e tudo sofrem como estrangeiros. Toda a terra estrangeira é para eles uma pátria e toda a pátria uma terra estrangeira.
Casam como todos e geram filhos, mas não abandonam à violência os recém-nascidos. Servem-se da mesma mesa, mas não do mesmo leito. Encontram-se na carne, mas não vivem segundo a carne. Moram na terra e são regidos pelo céu. Obedecem às leis estabelecidas e superam as leis com as próprias vidas. Amam todos e por todos são perseguidos. Não são reconhecidos, mas são condenados à morte; são condenados à morte e ganham a vida. São pobres, mas enriquecem muita gente; de tudo carecem, mas em tudo abundam. São desonrados, e nas desonras são glorificados; injuriados, são também justificados. Insultados, bendizem; ultrajados, prestam as devidas honras. Fazendo o bem, são punidos como maus; fustigados, alegram-se, como se recebessem a vida.”
Por isto, não importa o que dizemos ao mundo diante das câmaras, dos microfones ou nas páginas dos jornais. Importa sim, não fazer o que está errado e ser testemunho do que está certo.
Professor e investigador