Quando ainda se recolhem os estilhaços do despontar eleitoral das forças radicais, autoritárias e antidemocráticas, como efeito secundário das eleições presidenciais em Portugal, é mais fundamental que nunca recordar como em quase 50 anos de democracia se foram ultrapassando as dificuldades e as barreiras de quem a ela quis opor-se, para também agora, de forma serena mas determinada, dar uma resposta política à altura.
No passado sábado participei na primeira conferência de um ciclo organizado pela Academia 86, com o apoio do Partido Socialista através da iniciativa Centro-Esquerda, da Fundação Mário Soares e da delegação do PS no Parlamento Europeu, sob o signo “Construir o futuro europeu, inspirado nos valores de sempre”.
Na reflexão que a participação me motivou a fazer lembrei-me dos combates de ideias que travei nos primeiros anos da revolução para defender a democracia quer dos que tinham uma visão centralista e de partido único inspirada no modelo soviético, quer dos que nunca aceitaram a quebra de privilégios que uma democracia representativa significava para os beneficiários do regime deposto.
Foi no Alentejo que a bipolarização de forças foi, por esse tempo, mais intensa. Acredito que as votações acima da sua média nacional que o candidato da extrema-direita conseguiu, na região, nas últimas eleições presidenciais foram, em parte, uma reação à erosão da presença dos serviços públicos no território, um protesto pela falta de oportunidades nas zonas mais diversificadas, e resultaram também de uma perceção politicamente aumentada de insegurança e inveja relativa à etnia cigana, mas agregaram também muitos votos que vaguearam nas últimas décadas entre a abstenção ou o voto útil nos partidos democráticos mais à direita.
Tal como nos tempos do PREC (Período Revolucionário em Curso), seria um erro se, agora, a resposta política aos resultados da extrema-direita no Alentejo não separasse aqueles que têm de ser ouvidos e compreendidos nas suas razões e motivações daqueles (muitos menos) que têm de ser confrontados na sua ideologia e valores antidemocráticos.
A consolidação democrática por essa altura foi em muito determinada pela perspetiva da adesão à então Comunidade Económica Europeia. Recordo-me bem, era ainda muito jovem, dos cartazes que colei e dos debates que tive sob o signo “a Europa connosco”. Foi possível então associar a ideia de Europa à ideia de paz, liberdade, proteção social e progresso económico.
Num momento em que as forças antidemocráticas tentam aproveitar-se das dificuldades acrescidas geradas pela pandemia para atacar de novo a democracia, é fundamental que a resposta europeia, desenhada de forma articulada e solidária, se concretize com sucesso para que, na Conferência sobre o Futuro da Europa, a forma como os problemas concretos dos cidadãos tiver sido respondida com qualidade seja a inspiração para uma modernização institucional adequada aos novos tempos tecnológicos, energéticos, económicos, sociais e políticos.
Eurodeputado