Ver na RTP2 a série COBRA e descobrir as diferenças com a crise provocada pela pandemia


A intriga política é gerada por gente pequenina e ambiciosa que, verdadeiramente, não tem alternativas políticas para oferecer e apenas se preocupa em preservar ou alcançar o poder para favorecer melhor os seus e as vantagens que de que estes sempre se serviram.


A RTP2 passou, depois do noticiário da noite, uma interpelante série de ficção chamada COBRA.

Como quase todas as séries inglesas, é incisiva, mas sóbria, na maneira como aborda os diferentes problemas que retrata.

Nela se efabula a ocorrência de uma tempestade solar que afeta a energia e os sistemas elétricos de vários países, produzindo um apagão geral, incluindo no Reino Unido, onde a história se passa.

A situação só pôde ser colmatada de imediato através de geradores gigantes, mas, nesse país e nesse momento, não os havia em número suficiente, ficando uma das suas zonas geográficas à espera de um que viesse da Alemanha.

As situações de catástrofe e bloqueio da vida normal da sociedade e da economia, daí derivadas, assemelham-se, em muito, às causadas pela atual pandemia.

Os diversos episódios procuram retratar a gestão da crise que um governo britânico conservador, liderado por primeiro ministro moderado e democrata, tenta fazer no meio de um clima de quase guerra civil; uma situação acicatada pela ala direita do seu governo que, por via dos serviços secretos que influencia, instrumentaliza a ação de milícias fascizantes e, também, as reivindicações de um sindicato de motoristas liderado por um populista de esquerda.  

De alguma maneira, tudo remete para o que se viu no Capitólio dos EUA, mas o cenário em que os acontecimentos da série se desenrolam parece ainda mais angustiante e – pasme-se – quase mais verídico do que o que sucedeu na realidade naquele país.

O quadro de catástrofe é, na série, empolado por uma comunicação social ávida de notícias impactantes em que alguns jornalistas mais sérios se deixam, numa primeira fase, manipular, embora haja outros que parecem estar, desde sempre, diretamente ligados à conjura que parte de dentro do próprio governo.

Para alimentar um clima de suspeição permanente e verrinoso, capaz de minar a legitimidade e autoridade do primeiro-ministro e do seu núcleo de colaboradores mais próximos, um dos membros do gabinete e a chefe dos serviços secretos entretêm-se a espiar e a divulgar nos media casos pessoais e familiares que os afetam seriamente, mesmo que, em rigor, nada tenham a ver com a ação governativa.

Apesar de a contenção e coragem demonstradas pelo primeiro-ministro na forma como, inicialmente, encara a situação, a sucessão de eventos graves leva-o a ter de tomar medidas cada vez mais duras e imediatamente impopulares, para permitir o retorno à anormalidade da vida em algumas zonas do país mais afetadas e procurar conter a conjura política interna que o desestabiliza e que é provocada pelo mero interesse partidário de uns quantos ambiciosos concorrentes.

A situação é, entretanto, propositada e espetacularmente apresentada nos media coniventes com a conjura como uma espontânea insurreição popular causada pela insatisfação com a ação do Governo.

Aqui uma primeira lição da série: a ação determinada e orientada das forças populistas, ampliada pela manipulação de media irresponsáveis ou coniventes, pode empurrar as forças conservadoras moderadas para soluções mais musculadas, quando não antidemocráticas.

Na altura em que escrevo, a série parece ter terminado a sua exibição sem que, no seu final, se chegue a uma conclusão óbvia.

Mesmo assim, atrevo-me a aconselhar os responsáveis políticos, do governo e da oposição, os jornalistas e comentadores a que a vejam e reflitam sobre ela: é muito atual.

É, porém, sobretudo, para os cidadãos que a série é dirigida.

Ela habilita-os a perceber melhor o que sucede em muitas situações desta natureza, a distinguir o uso mesquinho e empolado de casos e casinhos, distorcidos e acessórios, dos problemas reais que há, verdadeiramente, que evidenciar, analisar e procurar resolver para bem de todos.

A intriga é, sobretudo, gerada por quem – gente pequenina e ambiciosa – verdadeiramente, não tem alternativas políticas para oferecer e apenas se preocupa em preservar ou alcançar o poder para favorecer melhor os seus e as vantagens de que estes sempre se serviram.

É, porém, tal gente que, quase sempre por interesse, outras vezes por mera vaidade e desejo de protagonismo fácil, desencadeia o vento que cria a tempestade que depois não domina, não raro também a envolve e até destrói.

Através do visionamento desta série poderão, porventura, os cidadãos aperceber-se mais facilmente do que é a pura intriga política e mediática com que os querem entreter, evitando assim que se concentrem nos problemas deveras importantes e que, verdadeiramente, lhes importam.

A intriga mediática corrente quase nunca tem a ver com a necessária e exigente crítica de fundo a muitas opções de governação, que propiciam e agravam as situações de catástrofe que hoje afligem bastantes países e povos.

É nessas opções e não nos erros menores e nos casos pessoais dos políticos de todas as cores que deveriam os cidadãos concentrar a sua atenção mais séria e a sua apreciação mais exigente.

Apesar de ter terminado já, não sei – já disse – como acaba, verdadeiramente, a história desta série televisiva, nem sei como evoluirão outras situações mais reais que constatamos quotidianamente no mundo.

Sei, todavia, que o guião de uma e de outras, com mais ou menos ficção à mistura, tem sido e é sempre o mesmo.

  

  

 

  

 

Ver na RTP2 a série COBRA e descobrir as diferenças com a crise provocada pela pandemia


A intriga política é gerada por gente pequenina e ambiciosa que, verdadeiramente, não tem alternativas políticas para oferecer e apenas se preocupa em preservar ou alcançar o poder para favorecer melhor os seus e as vantagens que de que estes sempre se serviram.


A RTP2 passou, depois do noticiário da noite, uma interpelante série de ficção chamada COBRA.

Como quase todas as séries inglesas, é incisiva, mas sóbria, na maneira como aborda os diferentes problemas que retrata.

Nela se efabula a ocorrência de uma tempestade solar que afeta a energia e os sistemas elétricos de vários países, produzindo um apagão geral, incluindo no Reino Unido, onde a história se passa.

A situação só pôde ser colmatada de imediato através de geradores gigantes, mas, nesse país e nesse momento, não os havia em número suficiente, ficando uma das suas zonas geográficas à espera de um que viesse da Alemanha.

As situações de catástrofe e bloqueio da vida normal da sociedade e da economia, daí derivadas, assemelham-se, em muito, às causadas pela atual pandemia.

Os diversos episódios procuram retratar a gestão da crise que um governo britânico conservador, liderado por primeiro ministro moderado e democrata, tenta fazer no meio de um clima de quase guerra civil; uma situação acicatada pela ala direita do seu governo que, por via dos serviços secretos que influencia, instrumentaliza a ação de milícias fascizantes e, também, as reivindicações de um sindicato de motoristas liderado por um populista de esquerda.  

De alguma maneira, tudo remete para o que se viu no Capitólio dos EUA, mas o cenário em que os acontecimentos da série se desenrolam parece ainda mais angustiante e – pasme-se – quase mais verídico do que o que sucedeu na realidade naquele país.

O quadro de catástrofe é, na série, empolado por uma comunicação social ávida de notícias impactantes em que alguns jornalistas mais sérios se deixam, numa primeira fase, manipular, embora haja outros que parecem estar, desde sempre, diretamente ligados à conjura que parte de dentro do próprio governo.

Para alimentar um clima de suspeição permanente e verrinoso, capaz de minar a legitimidade e autoridade do primeiro-ministro e do seu núcleo de colaboradores mais próximos, um dos membros do gabinete e a chefe dos serviços secretos entretêm-se a espiar e a divulgar nos media casos pessoais e familiares que os afetam seriamente, mesmo que, em rigor, nada tenham a ver com a ação governativa.

Apesar de a contenção e coragem demonstradas pelo primeiro-ministro na forma como, inicialmente, encara a situação, a sucessão de eventos graves leva-o a ter de tomar medidas cada vez mais duras e imediatamente impopulares, para permitir o retorno à anormalidade da vida em algumas zonas do país mais afetadas e procurar conter a conjura política interna que o desestabiliza e que é provocada pelo mero interesse partidário de uns quantos ambiciosos concorrentes.

A situação é, entretanto, propositada e espetacularmente apresentada nos media coniventes com a conjura como uma espontânea insurreição popular causada pela insatisfação com a ação do Governo.

Aqui uma primeira lição da série: a ação determinada e orientada das forças populistas, ampliada pela manipulação de media irresponsáveis ou coniventes, pode empurrar as forças conservadoras moderadas para soluções mais musculadas, quando não antidemocráticas.

Na altura em que escrevo, a série parece ter terminado a sua exibição sem que, no seu final, se chegue a uma conclusão óbvia.

Mesmo assim, atrevo-me a aconselhar os responsáveis políticos, do governo e da oposição, os jornalistas e comentadores a que a vejam e reflitam sobre ela: é muito atual.

É, porém, sobretudo, para os cidadãos que a série é dirigida.

Ela habilita-os a perceber melhor o que sucede em muitas situações desta natureza, a distinguir o uso mesquinho e empolado de casos e casinhos, distorcidos e acessórios, dos problemas reais que há, verdadeiramente, que evidenciar, analisar e procurar resolver para bem de todos.

A intriga é, sobretudo, gerada por quem – gente pequenina e ambiciosa – verdadeiramente, não tem alternativas políticas para oferecer e apenas se preocupa em preservar ou alcançar o poder para favorecer melhor os seus e as vantagens de que estes sempre se serviram.

É, porém, tal gente que, quase sempre por interesse, outras vezes por mera vaidade e desejo de protagonismo fácil, desencadeia o vento que cria a tempestade que depois não domina, não raro também a envolve e até destrói.

Através do visionamento desta série poderão, porventura, os cidadãos aperceber-se mais facilmente do que é a pura intriga política e mediática com que os querem entreter, evitando assim que se concentrem nos problemas deveras importantes e que, verdadeiramente, lhes importam.

A intriga mediática corrente quase nunca tem a ver com a necessária e exigente crítica de fundo a muitas opções de governação, que propiciam e agravam as situações de catástrofe que hoje afligem bastantes países e povos.

É nessas opções e não nos erros menores e nos casos pessoais dos políticos de todas as cores que deveriam os cidadãos concentrar a sua atenção mais séria e a sua apreciação mais exigente.

Apesar de ter terminado já, não sei – já disse – como acaba, verdadeiramente, a história desta série televisiva, nem sei como evoluirão outras situações mais reais que constatamos quotidianamente no mundo.

Sei, todavia, que o guião de uma e de outras, com mais ou menos ficção à mistura, tem sido e é sempre o mesmo.