Piados mediáticos


Hoje, poucos conhecem as artes filosóficas e naturais e por isso preferem recorrer a uns passarinhos que por aí andam e que contam coisas.


A arte de ler e interpretar sinais remonta aos primórdios da história da humanidade. Há sinais no céu, no rosto, nas mãos, nas cartas…

Já todos ouvimos ou lemos as previsões ditadas por quem interpreta os astros, o tarô ou a bola de cristal. Mas, de todas elas, a que me mais me espanta é a do passarinho. Porém, antes de falar nele, permitam-me uma breve consideração.

A influência do macrocosmo no microcosmo constitui a lógica primordial para os que estudam o mecanismo e o funcionamento da natureza. Assim se popularizou a celebre lei da correspondência: “O que está em cima é como o que está em baixo, o que está fora é como o que está dentro”. Deste modo, acreditamos que tudo obedece a ciclos e repetições, cuja regra foi criada a partir de um padrão divino. Conhecer as formas e as fórmulas permite-nos dominar, antever e até mudar.

A arte de desvendar o futuro é condenada na Bíblia, dado que nela se proíbe qualquer espécie de adivinhação. São Tomás de Aquino é um dos teólogos que se preocuparam com o tema astrológico, defendendo a astrologia natural e o estudo do movimento dos planetas e das estrelas. Condena a astrologia judiciária, que pretende prever a sorte dos acontecimentos futuros e revelar o destino marcado para cada pessoa – pretensão esta que, segundo o teólogo, determinaria quer a ausência de mérito quer de culpa, entrando, pois, em contradição com a doutrina do livre-arbítrio.

No passado, qualquer problema da vida quotidiana poderia ser resolvido através do conhecimento oculto na natureza. Assim, o homem do Renascimento vê o mundo natural como sendo um poço de segredos, uma autêntica farmácia onde se encontra a cura para o corpo e para o espírito. A utilidade prática deste conhecimento podia abranger as áreas medicinais, domésticas e técnicas. Os segredos medicinais tratavam problemas de saúde; os domésticos preocupavam-se com a elaboração de perfumes, sabonetes e incensos; e os técnicos provocavam fascínio e admiração pelos seus efeitos maravilhosos. Estes revelavam as fórmulas para o fabrico de cores, efeitos pirotécnicos e construção de artifícios que superavam as leis da lógica e da natureza. Aceder à lógica da filosofia oculta era conhecer a terra, as plantas, os animais, os metais… Mas, para aqueles que nada percebem destas ciências ditas ocultas, o melhor será recorrer ao passarinho de que vos falava no início do artigo de hoje.

Afinal, o que é isto do passarinho?

Hoje, poucos conhecem estas artes filosóficas e naturais de que vos falei e por isso preferem recorrer a uns passarinhos que por aí andam e que contam coisas. Aliás, é daí que vem a expressão “foi um passarinho que me contou”. Confesso que ainda não conheci o dito passarinho, até porque, caso o conhecesse, talvez me tornasse um comentador dedicado. A propósito, importa a espécie de passarinho ou serve uma ave qualquer?

Pelo sim pelo não, comprei uma bola de cristal…

 

Professor e investigador