Na primeira quinzena de janeiro, Portugal foi atingido por uma vaga de frio que se conjugou com a impreparação estrutural da maioria do parque habitacional para fazer face a temperaturas extremas, gerado pelo pressuposto cada vez menos fiável de que somos um país de clima ameno. Daí resultou um pico natural na procura de energia, em especial de eletricidade, e um consequente disparar dos preços de mercado.
Ao mesmo tempo que muitos portugueses tiritavam de frio, ajudando a tornar ainda mais penosa a resistência aos múltiplos impactos e restrições impostos pela pandemia, foram sendo notícia o início do desmantelamento de mais uma central a carvão, a justificação do fecho de uma refinaria também com critérios de redução de emissões e o peso da componente de compensação de emissões que, no contexto do mercado do carbono, ajudou a fazer subir as contas da luz.
O cenário que descrevi de forma sucinta demonstra como foi importante criar no novo quadro de financiamento plurianual da União Europeia um potente fundo para a transição justa e, ao mesmo tempo, exorta a que medidas neste domínio sejam tomadas desde já, mesmo antes de se poderem concretizar as ações estruturais que o fundo financiará.
A pobreza energética é uma das condições de carência económica e social mais esquecida. Além da manutenção das tarifas sociais e dos apoios específicos que o Governo rapidamente definiu para ajudar a mitigar o problema, é fundamental combinar os vários programas que vão ser lançados no domínio da transição energética quer na aposta nas energias limpas, quer na promoção da eficiência para reduzir drasticamente a pobreza energética em Portugal. A transição justa tem de começar já.
O pacto ecológico europeu (Green Deal) só terá sucesso se for um pacto pelo clima e um pacto pelas pessoas. É claro que o combate às alterações climáticas e ao aquecimento global é um processo a favor das pessoas e que são os mais desprotegidos os que mais sofrem com as catástrofes, as reduções de colheitas ou a erosão da qualidade do ar, mas o processo de transformação tem de ter embebido desde o princípio o objetivo do combate às desigualdades, de forma que o mercado seja mais transparente, os novos empregos mais qualificados e mais bem distribuídos, e a pobreza energética erradicada.
Percebemos pela dinâmica dos preços no pico de frio quanto é importante e urgente uma aposta sustentável e tecnologicamente forte em soluções baseadas em energias renováveis que consigam reduzir o papel das energias fósseis na garantia da capacidade de resposta permanente dos sistemas elétricos. Tecnologias como as que poderão permitir uma produção viável de hidrogénio verde estão claramente nesse caminho. Os múltiplos programas de fomento da eficiência energética, além de todas as prioridades e benefícios conhecidos, têm de dar mais foco à reabilitação das habitações com menos condições térmicas e ocupadas por pessoas ou famílias sem capacidade de investir na sua melhoria.
O combate às alterações climáticas não perdeu importância com a pandemia e os objetivos de neutralidade carbónica são fundamentais. Não podem ser, no entanto, os mais carenciados a suportar os maiores custos da descarbonização nas suas condições de vida. É por isso que uma transição justa tem de começar já.
Eurodeputado