FC Porto-Benfica. Os dois pugilistas foram seis vezes ao tapete até que um desistiu

FC Porto-Benfica. Os dois pugilistas foram seis vezes ao tapete até que um desistiu


1939 – Taça de Portugal. Depois de terem perdido no Porto por 1-6, os encarnados viraram a segunda mão para 6-0. E aí começou a balbúrdia. Os portistas saíram de campo e regressaram a casa.


Do Campeonato de Portugal para a sua sucessora, a Taça de Portugal, a memória foi curta. Como vimos ontem, nos quartos-de-final da última edição do Campeonato de Portugal com este nome, Benfica e FC Porto disputaram uma eliminatória rija (FC Porto, 4 – Benfica, 2; Benfica, 7 – FC Porto, 0) que, infelizmente, deu mosquitos por cordas e cenas de pancadaria generalizada, com expulsões em número aproximado ao número de golos.

Um ano mais tarde, os dois adversários (ia a escrever inimigos) voltaram a encontrar-se, desta vez nas meias-finais da edição inicial da Taça de Portugal. Os portistas tinham contas a ajustar e estavam dispostos a fazê-lo logo na primeira mão, no Estádio do Lima, no dia 11 de junho de 1939. Uma mole de gente apertava-se como sardinha em lata para não perder pitada do que iria passar-se no retângulo do jogo. Foi com alguma surpresa que os jogadores do Benfica foram sendo aplaudidos à medida que entravam em campo. Tréguas? Haveria finalmente o bom senso de não transformar um jogo de futebol numa luta livre corpo a corpo?

Logo aos sete minutos, Lopes Carneiro fez o 1-0 e a tarde portista ficou um pouco mais azul. Definitivamente, Gaspar Pinto, Teixeira, António Vieira e Feliciano Barbosa estão metidos em sarilhos. Já para não falar do keeper António Martins. O futebol ofensivo do FC Porto ganhava contornos de vendaval. Pinga e Costuras não tinham um momento de sossego, esgravulhavam por aqui e por ali em busca de buracos na defesa lisboeta. Vieira lesiona-se, tem de sair por alguns minutos. 2-0 por Costuras, aos 16 minutos.

Alexandre Brito põe gelo sobre o vulcão do Lima, reduzindo aos 22 minutos. O jogo será resolvido no segundo tempo. E de que maneira. Logo no início (46 m), Pinga faz o 3-1. O Benfica encolhe-se. Sente-se inferior ao adversário. O 4-1 surge aos 62 minutos por Carlos Nunes. De imediato, um golpe terrível para os forasteiros, com Francisco Ferreira a falhar um penálti. Foi a condenação. Costuras (69 m) e Carlos Nunes (81) fecham o placar em 6-1. “O Benfica, na primeira parte, jogou de igual para igual com os portuenses. Embora estes dominassem mais, os vermelhos produziram no último quarto de hora um futebol brilhantíssimo”, escrevia um dos cronistas da época. “No segundo tempo, após a grande penalidade falhada e a resposta com o quarto golo do Porto, os portuenses jogaram com especial relevo durante longos minutos. Quando o Benfica reagiu, já era tarde”. Levavam para Lisboa uma tarefa impossível.

 

Balbúrdia

O que se passou no Campo das Amoreiras no dia 18 de junho ficou para sempre marcado na história do futebol português. E não por boas razões. Tal como acontecera no Porto, o estádio estava à pinha. Quando as equipas se alinharam em frente à bancada principal, o capitão dos portistas, Carlos Nunes, ergueu e agitou uma enorme bandeira do seu clube. O povo não gostou. O ambiente, inicialmente tranquilo, descambou.

Há velocidade e dureza de parte a parte. Uma dureza por vezes excessiva. O Benfica cai sobre o seu adversário, Soares dos Reis é obrigado a um punhado de defesas complicadas, Valadas, rematador exímio, vai tentando a sua sorte seja de que zona do campo for. O primeiro golo só surge aos 26 minutos, por Espírito Santo. É com esse resultado que chega o intervalo. Inquietos, os adeptos do Benfica vociferam. Do lado portista, a confiança é grande. Têm ainda quatro golos de vantagem.

Aos 55 minutos, penálti contra o FC Porto. Os jogadores rodeiam o árbitro António Palhinhas, pedem explicações, reclamam com veemência. Soares dos Reis defende o primeiro remate de Valadas, mas este faz o 2-0 na recarga.

A defesa nortenha perde o tino. Cinco minutos mais tarde, Feliciano Barbosa aponta o terceiro golo. Os encarnados sentem que a missão impossível que traziam do Lima pode tornar-se possível. Espírito Santo (65 m) e Rogério de Sousa (68) empurram a equipa para o 5-0. Só falta um golo! O ataque encarnado esmaga a defesa contrária como se fosse um torno. Aos 71 minutos, Valadas faz o 6-0 e o jogo entra num estertor moribundo. Francisco Reboredo e António Santos são expulsos por reclamarem da legalidade do sexto golo benfiquista. Subitamente, do alto do palanque presidencial, vem a ordem de um diretor do FC Porto para que os seus jogadores abandonem o campo. Os espetadores estão incrédulos. O capitão Maia de Loureiro, dirigente federativo, tenta inverter a situação e faz os possíveis para que os portistas regressem ao campo. Mas não há nada a fazer. “Esta atitude dos jogadores portuenses não se justifica pois o jogo, à parte certa dureza em vários momentos, nunca foi violento”, escreveu quem lá esteve. “O resultado de 6-0 a favor do Benfica a um quarto de hora do fim do jogo é absolutamente justificado”. Disso não quiseram saber os rapazes da Invicta. Pura e simplesmente, regressaram a casa. Vencidos, mas não convencidos.