1. Estamos a atravessar mais uma quinzena de estado de emergência. As medidas devem provavelmente ser indispensáveis e adequadas, uma vez que a generalidade dos especialistas médicos as valida. Foram tomadas numa altura em que a pandemia atinge o maior pico de sempre, em Portugal. São, portanto, teoricamente, justificadas, face ao que se sabe. Constituem a profilaxia possível, enquanto não houver medicamentos ou vacinas. Há, porém, cada vez mais sinais de saturação por parte dos cidadãos comuns e dos representantes dos setores profissionais mais atingidos economicamente ou de primeira linha na guerra da saúde e da logística. No fim de semana passado, já se sentiu algum cansaço quanto ao acatamento das restrições. Estas são praticamente impossíveis de assimilar, dado o facto de poderem ser diferentes consoante o concelho. Tudo isso tem levado a que desperte uma tentação de contestar e ir desobedecendo de forma progressiva. A multiplicação desta postura pode derrapar para o incumprimento, sobretudo agora que a contingência vai igualmente estender-se aos feriados e às pontes que se aproximam. Tudo enquadrado por um normativo complexo, em sistemática e indecifrável atualização. Simultaneamente, ocorrem falhas de planificação e de comunicação a todos os níveis, enquanto se multiplicam ações de mera propaganda que nada têm a ver com a realidade e a vivência do país real. Veja-se o apelo às empresas não estatais para que estabeleçam também tolerância nas próximas pontes, o que é asfixiá-las de vez. Os portugueses acham-se gente de brandos costumes, mas não é propriamente isso que a nossa história mostra. É preciso manter a calma coletiva. É preciso justificar e mostrar que os sacrifícios que estão a ter feitos valem a pena. É preciso que haja menos ações virtuais e mais atos concretos. Agora que se fala em vacinas vai ser preciso também conhecer-se o plano da sua ministração, como se alertou nesta crónica oportunamente. E é preciso também ter noção de que, num mundo global, cada um de nós saberá ao minuto a forma como a vacinação vai decorrer no mundo, começando aqui ao lado pela Espanha. Seria inaceitável que os portugueses (que supostamente dispõem de um invejável serviço nacional de Saúde) vissem outros povos a serem vacinados, enquanto eles se confrontassem com as confusões e trapalhadas habituais. Seria grave demais e até criminoso repetir-se na vacina da covid, o que está a acontecer com a da gripe. Uma falha nesse processo, justificaria certamente que a população reagisse e perdesse de vez a paciência.
2. Hoje é dia 25 de novembro. É o dia em que, em 1975, as forças democráticas militares e civis travaram a avalanche da esquerda radical e o avanço do PCP no Alentejo, criando um estado cubano. Uns dias antes, tinha ocorrido a independência de Angola e os comunistas tinham cumprido o seu principal desígnio, podendo aliviar a pressão totalitária, o que facilitou a vitória democrática. Nunca é demais lembrarmos certas efemérides, numa fase em que o país volta a ter extremos políticos que obrigam os partidos da alternância, PS e PSD, a bipolarizar o país, aproximando-se da direita e da esquerda radicais, na procura da sobrevivência atual e futura no parlamento, sede de legitimação da governabilidade efetiva. A bipolarização pode ser clarificadora. No entanto, não é oportuna, numa altura de pandemia e de necessidade de criação de denominadores comuns sociais e económicos para travar uma calamidade. Num país de escassos recursos e com uma população basicamente centrista deve procurar-se consensos e denominadores comuns nas questões estruturais, a fim de não andarmos sempre a fazer e desfazer estratégias como se está a ver na saúde, cuja lei a esquerda mudou por mero preconceito ideológico, perdendo-se eficácia e vidas. É por não termos tido a “sagesse” de encontrar o justo equilíbrio e desperdiçarmos o pouco dinheiro que temos que estamos a ficar cada vez mais terceiro mundo, mais periféricos e mais irrelevantes na Europa. A presidência europeia que vamos iniciar talvez seja uma rara oportunidade para que se volte a incluir Portugal no mapa dos países que contam.
3. No comunismo é suposto o coletivo sobrepor-se ao individual. É assim na teoria quando se fala das massas trabalhadoras. Mas, quando se trata dos membros da nomenclatura, verifica-se que vivem gloriosamente em bolhas de privilégio, como na China, na Coreia do Norte, em Cuba ou na Venezuela, para falar apenas de casos atuais.
O indivíduo comum conta pouco ou nada nos regimes comunistas. É exatamente no quadro desse padrão de comportamento que o PCP não abdica do seu congresso em Loures. Claro que a lei o permite, e bem. Claro que as regras de distanciamento vão ser respeitadas. Ao manter a agenda, os comunistas mostram, porém, desrespeito pela vida e saúde dos outros. O percurso de desprezo pelos direitos humanos e os comportamentos atuais revelam que não mudaram substancialmente, apenas se adaptaram às circunstâncias. A preocupação que proclamam a respeito do povo deveria ter levado a um adiamento do congresso de Loures por autorrecriação e para dar o exemplo. É bom que não o tenham feito. A manutenção do congresso mostra a verdadeira e imutável natureza do PCP.
4. A forma como os partidos contactam com o cidadão suscita legitimamente muita desconfiança. Há casos de oportunismo completo como, por exemplo, os “podcast” que o PS atira aos jornalistas como um osso a um cachorro, a fim de passarem subservientemente os seus recadinhos, sem contraditório. Em contrapartida, o PSD – que ultimamente tem sido especialmente dado a insucessos comunicacionais – lançou uma iniciativa para que qualquer pessoa entre em contacto com o partido, contando a sua história, através de um email. A ideia é boa, simples e pode ser eficaz. Resta ver se, depois, tem resultados práticos no terreno, através da resolução ou da denúncia dos casos relatados. Um caso a seguir…
Escreve à quarta-feira