EUA: “When they go low, we go high.” Será que foi assim?


Uma coisa é estarmos numa conversa de café, e mesmo assim há limites, e poder haver estes excessos linguísticos. Num debate presidencial, nem na América nem no fim do mundo tal desrespeito deve acontecer. Falhou muito o candidato democrata.


Foi a antiga primeira-dama dos Estados Unidos da América, Michelle Obama, que proferiu a frase “When they go low, we go high”. Decorria a Convenção do Partido Democrata, no ano de 2016, quando, face a ataques políticos que considerara “de baixo nível” contra a candidata que apoiava, Hillary Clinton, referiu a ideia de que face ao baixo nível republicano os democratas iriam responder com elevação no tom e no conteúdo do debate.

Passados 4 anos, e cumpridos os debates entre os candidatos à Presidência Americana, o Republicano Trump e o Democrata Biden, e a Vice-Presidentes, Mike Pence e Kamala Harris, será que os democratas mantiveram a elevação que Michelle Obama prometia? E será que os Republicanos mantiveram a toada?

Não. O nível foi baixíssimo e isso tem reflexos negativos em todo o globo terrestre. A toada política mundial circunda muito em torno do que se vive e pratica na política americana. É uma constatação, é uma tradição política que a Europa já assumiu sem assumir há muitas décadas.

Comecemos pelo “baixo nível” dos Democratas. Biden, que já foi um dos candidatos a candidato pelos Democratas, em 1988, contra Dukakis (que viria a ser a nomeação Democrata e posteriormente a perder contra o Republicano George W. Bush), tendo saído dessa corrida pela vaga democrata por plagiar um discurso do britânico Neil Kinnock, agora, em 2020, não plagiou nada de bom pela democracia. Chamou mesmo “mentiroso e palhaço” em pleno debate a Donald Trump.

Uma coisa é estarmos numa conversa de café, e mesmo assim há limites, e poder haver estes excessos linguísticos. Num debate presidencial, nem na América nem no fim do mundo tal desrespeito deve acontecer. Falhou muito o candidato democrata.

Seguramente este não era o “We go high” que Michelle Obama apregoou há 4 anos sobre a postura do seu Partido.

Mas os Republicanos, pela voz do atual Presidente Donald Trump, estiveram a alto nível de responsabilidade? Não. Como é possível, até pelas notícias vindas a público, até horas depois de Mike Baker e o The New York Times mostrarem ao mundo trocas de informação e mensagens de grupos pró-supremacia branca, o agora candidato republicano Donald Trump não condenar os movimentos de supremacia branca? Isto seria possível em 2015? Claro que não. Infelizmente, o mundo mudou na política americana, mudou para pior escala e menor elevação ou seriedade democrática.

Naturalmente que a espuma dos dias irá focar a suma do debate na quantidade de vezes que um aparentemente cansado Joe Biden (77 anos) se repetiu nas ideias e, claramente, demonstrou menos energia e vitalidade face a um “jovem” Donald Trump (74 anos). É notório, não é questão de escolha.

Em suma, foi um debate perdido de ideias. Sem respeito algum e com uma ineficácia de apelo à participação cívica incrível. Foi quase tudo mau. Não ficou uma ideia dos Democratas nem se registou uma conquista dos Republicanos. Foi um vazio como há muito não havia memória na política americana.

Face ao vazio do debate presidencial, viraram-se todas as atenções para o debate entre os candidatos a Vice-Presidentes que obrigou qualquer português a fazer noitada hoje.

Nos democratas ficou uma grande expetativa no que Kamala Harris (55 anos) poderia fazer contra o republicano Mike Pence (61 anos). Pensou muito americano que, contra um “ultra-conservador” Pence os liberais como Kamala Harris poderiam ter campo aberto para vencer o debate. Esqueceram-se os analistas que Kamala Harris está mesmo muito longe da ala mais à esquerda do partido Democrata onde pontifica a jovem (esta sim, de 30 anos) Alexandria Ocasio-Cortez, por exemplo. Esqueceram-se ainda, os que pensavam numa polarização de debate ideológico, que Kamala Harris está muito alinhada com Biden em várias matérias, mesmo naquelas mais fraturantes como na questão que envolve os polícias americanos e que não seria por aí que iria romper e conquistar uma ala mais progressista do seu eleitorado. Longe da ala mais progressista do Partido Democrata, que outrora apoiou inclusive a candidatura de Bernie Sanders, a candidata a Vice-Presidente dos Democratas não aniquilou Mike Pence. Longe disso, foi uma liberal muito conservadora até.

Porém, e ainda bem para a democracia, o debate desta madrugada pareceu mesmo um pilar de ponderação. Ainda bem, ao estilo da escola de Atenas (quase com togas e tudo). Se Mike Pence passou algum tempo a desviar-se das perguntas difíceis à sua Administração Trump, Kamala Harris também perdeu grande parte dos 90 minutos de debate à defesa e apenas venceu numa clara imagem de energia que contrasta com o seu candidato a Presidente, Joe Biden. Talvez, nesse campo, tenha empatado a soma dos dois debates.

Uma nota positiva para o Republicano Mike Pence. Conseguiu em 90 minutos fazer o que o Presidente Donald Trump não conseguiu fazer em 4 anos pela história e ideias Republicanas. Conseguiu passar uma mensagem clara na ideia sobre o quão é importante a liberdade de escolha para os americanos, criticou duramente a carga fiscal que os democratas apregoam vir a impor e questionou ainda o futuro da empregabilidade num hipotético tempo pós-reforma ambiental que os democratas têm defendido – sem grande conteúdo ou propostas práticas – para afetar a cética e débil imagem do Presidente Donald Trump nestas matérias.

Obviamente que o 2º debate foi melhor que o 1º debate. Mas ambos, na prática, ficaram a anos-luz de um “bom debate”. Que saudades terá a história democrática americana e mundial de um discurso de Obama, John Fitzgerald Kennedy ou Abraham Lincoln.

O que fica para decisão então? Será que fica por decidir a matéria em torno dos indecisos? Não. Não existem indecisos entre votar Biden ou Trump. Está tão polarizada a guerrilha ideológica que as questões são só: “Vou abster-me ou votar em Trumpo?” ou “Vou abster-me ou votar em Biden?”. Não há transferência de votos neste momento. Portanto, essa matéria não está em cima de mesa de debate.

Então, se não há indecisos entre os candidatos, os debates foram esclarecedores para vincar quais diferenças de programa político? Não. Não houve grande debate de ideias, excluindo algumas pequenas vitórias de Mike Pence e outras de Kamala Harris, esta madrugada, não houve um verdadeiro debate esclarecedor do ponto de vista programático.

Os “Low” debates serviram para combater, dentro de cada partido, pela participação entre convertidos e semi-convertidos. Há quem, dentro dos Republicanos, esteja muito incomodado em ir votar Trump. E, paralelamente, há quem nos Democratas esteja muito incomodado em ir votar Biden.

É da natureza das coisas. A polarização americana secou a migração de votos de lado a lado. Só importa apelar a que “não fiquem em casa” mesmo que insatisfeitos com os seus representantes claramente identificados.

Não houve perda de tempo em que assistiu, com entusiasmo, a ambos os debates. Houve, seguramente, a consciencialização que na política mundial há carência de moderados. De figuras agregadoras que conciliem a apresentação de propostas à inclusão de vontades. De quem consiga, de facto, “go high” num debate e na sua ação política.

Mas, porém, os maus exemplos também servem de exemplo para se fazer caminho. Que se aprenda a lição, também cá, deste lado do atlântico.

Carlos Gouveia Martins

EUA: “When they go low, we go high.” Será que foi assim?


Uma coisa é estarmos numa conversa de café, e mesmo assim há limites, e poder haver estes excessos linguísticos. Num debate presidencial, nem na América nem no fim do mundo tal desrespeito deve acontecer. Falhou muito o candidato democrata.


Foi a antiga primeira-dama dos Estados Unidos da América, Michelle Obama, que proferiu a frase “When they go low, we go high”. Decorria a Convenção do Partido Democrata, no ano de 2016, quando, face a ataques políticos que considerara “de baixo nível” contra a candidata que apoiava, Hillary Clinton, referiu a ideia de que face ao baixo nível republicano os democratas iriam responder com elevação no tom e no conteúdo do debate.

Passados 4 anos, e cumpridos os debates entre os candidatos à Presidência Americana, o Republicano Trump e o Democrata Biden, e a Vice-Presidentes, Mike Pence e Kamala Harris, será que os democratas mantiveram a elevação que Michelle Obama prometia? E será que os Republicanos mantiveram a toada?

Não. O nível foi baixíssimo e isso tem reflexos negativos em todo o globo terrestre. A toada política mundial circunda muito em torno do que se vive e pratica na política americana. É uma constatação, é uma tradição política que a Europa já assumiu sem assumir há muitas décadas.

Comecemos pelo “baixo nível” dos Democratas. Biden, que já foi um dos candidatos a candidato pelos Democratas, em 1988, contra Dukakis (que viria a ser a nomeação Democrata e posteriormente a perder contra o Republicano George W. Bush), tendo saído dessa corrida pela vaga democrata por plagiar um discurso do britânico Neil Kinnock, agora, em 2020, não plagiou nada de bom pela democracia. Chamou mesmo “mentiroso e palhaço” em pleno debate a Donald Trump.

Uma coisa é estarmos numa conversa de café, e mesmo assim há limites, e poder haver estes excessos linguísticos. Num debate presidencial, nem na América nem no fim do mundo tal desrespeito deve acontecer. Falhou muito o candidato democrata.

Seguramente este não era o “We go high” que Michelle Obama apregoou há 4 anos sobre a postura do seu Partido.

Mas os Republicanos, pela voz do atual Presidente Donald Trump, estiveram a alto nível de responsabilidade? Não. Como é possível, até pelas notícias vindas a público, até horas depois de Mike Baker e o The New York Times mostrarem ao mundo trocas de informação e mensagens de grupos pró-supremacia branca, o agora candidato republicano Donald Trump não condenar os movimentos de supremacia branca? Isto seria possível em 2015? Claro que não. Infelizmente, o mundo mudou na política americana, mudou para pior escala e menor elevação ou seriedade democrática.

Naturalmente que a espuma dos dias irá focar a suma do debate na quantidade de vezes que um aparentemente cansado Joe Biden (77 anos) se repetiu nas ideias e, claramente, demonstrou menos energia e vitalidade face a um “jovem” Donald Trump (74 anos). É notório, não é questão de escolha.

Em suma, foi um debate perdido de ideias. Sem respeito algum e com uma ineficácia de apelo à participação cívica incrível. Foi quase tudo mau. Não ficou uma ideia dos Democratas nem se registou uma conquista dos Republicanos. Foi um vazio como há muito não havia memória na política americana.

Face ao vazio do debate presidencial, viraram-se todas as atenções para o debate entre os candidatos a Vice-Presidentes que obrigou qualquer português a fazer noitada hoje.

Nos democratas ficou uma grande expetativa no que Kamala Harris (55 anos) poderia fazer contra o republicano Mike Pence (61 anos). Pensou muito americano que, contra um “ultra-conservador” Pence os liberais como Kamala Harris poderiam ter campo aberto para vencer o debate. Esqueceram-se os analistas que Kamala Harris está mesmo muito longe da ala mais à esquerda do partido Democrata onde pontifica a jovem (esta sim, de 30 anos) Alexandria Ocasio-Cortez, por exemplo. Esqueceram-se ainda, os que pensavam numa polarização de debate ideológico, que Kamala Harris está muito alinhada com Biden em várias matérias, mesmo naquelas mais fraturantes como na questão que envolve os polícias americanos e que não seria por aí que iria romper e conquistar uma ala mais progressista do seu eleitorado. Longe da ala mais progressista do Partido Democrata, que outrora apoiou inclusive a candidatura de Bernie Sanders, a candidata a Vice-Presidente dos Democratas não aniquilou Mike Pence. Longe disso, foi uma liberal muito conservadora até.

Porém, e ainda bem para a democracia, o debate desta madrugada pareceu mesmo um pilar de ponderação. Ainda bem, ao estilo da escola de Atenas (quase com togas e tudo). Se Mike Pence passou algum tempo a desviar-se das perguntas difíceis à sua Administração Trump, Kamala Harris também perdeu grande parte dos 90 minutos de debate à defesa e apenas venceu numa clara imagem de energia que contrasta com o seu candidato a Presidente, Joe Biden. Talvez, nesse campo, tenha empatado a soma dos dois debates.

Uma nota positiva para o Republicano Mike Pence. Conseguiu em 90 minutos fazer o que o Presidente Donald Trump não conseguiu fazer em 4 anos pela história e ideias Republicanas. Conseguiu passar uma mensagem clara na ideia sobre o quão é importante a liberdade de escolha para os americanos, criticou duramente a carga fiscal que os democratas apregoam vir a impor e questionou ainda o futuro da empregabilidade num hipotético tempo pós-reforma ambiental que os democratas têm defendido – sem grande conteúdo ou propostas práticas – para afetar a cética e débil imagem do Presidente Donald Trump nestas matérias.

Obviamente que o 2º debate foi melhor que o 1º debate. Mas ambos, na prática, ficaram a anos-luz de um “bom debate”. Que saudades terá a história democrática americana e mundial de um discurso de Obama, John Fitzgerald Kennedy ou Abraham Lincoln.

O que fica para decisão então? Será que fica por decidir a matéria em torno dos indecisos? Não. Não existem indecisos entre votar Biden ou Trump. Está tão polarizada a guerrilha ideológica que as questões são só: “Vou abster-me ou votar em Trumpo?” ou “Vou abster-me ou votar em Biden?”. Não há transferência de votos neste momento. Portanto, essa matéria não está em cima de mesa de debate.

Então, se não há indecisos entre os candidatos, os debates foram esclarecedores para vincar quais diferenças de programa político? Não. Não houve grande debate de ideias, excluindo algumas pequenas vitórias de Mike Pence e outras de Kamala Harris, esta madrugada, não houve um verdadeiro debate esclarecedor do ponto de vista programático.

Os “Low” debates serviram para combater, dentro de cada partido, pela participação entre convertidos e semi-convertidos. Há quem, dentro dos Republicanos, esteja muito incomodado em ir votar Trump. E, paralelamente, há quem nos Democratas esteja muito incomodado em ir votar Biden.

É da natureza das coisas. A polarização americana secou a migração de votos de lado a lado. Só importa apelar a que “não fiquem em casa” mesmo que insatisfeitos com os seus representantes claramente identificados.

Não houve perda de tempo em que assistiu, com entusiasmo, a ambos os debates. Houve, seguramente, a consciencialização que na política mundial há carência de moderados. De figuras agregadoras que conciliem a apresentação de propostas à inclusão de vontades. De quem consiga, de facto, “go high” num debate e na sua ação política.

Mas, porém, os maus exemplos também servem de exemplo para se fazer caminho. Que se aprenda a lição, também cá, deste lado do atlântico.

Carlos Gouveia Martins