Uma notícia de última página no i dava conta de que tinha sido criada o movimento Unidos contra o Desperdício, que “junta entidades públicas, empresas e pessoas para aproveitar comida boa que de outro modo iria parar ao lixo”.
A notícia acrescenta que “um dos rostos do movimento” é Isabel Jonet, mulher extraordinária, presidente do Banco Alimentar contra a Fome.
A boa notícia não esconde, no entanto, uma realidade bem menos feliz, bem descrita por outra extraordinária mulher, a provedora de Justiça, Maria Lúcia do Amaral. Quando questionada no último Prós e Contras sobre o que considerava ser o problema número um da sociedade portuguesa, respondeu: “Expectativas de vida não muito aliciantes. Pobreza. Não obstante todo o caminho que fizemos, não resolvemos as bolsas de pobreza que persistem e que são as maiores responsáveis pela falta de dinamismo da nossa sociedade”.
Somos, de facto, dos mais pobres entre os mais ricos. E, apesar disso, somos também daqueles que mais desperdiçamos talentos, oportunidades e, sobretudo, valores.
De facto, Unidos contra o Desperdício devia ser um desígnio nacional.
A excessiva partidarização da nossa vida social tem afastado de cargos importantes gente competente e bem preparada, para favorecer militantes e apoiantes, muitas vezes incompetentes e de ética duvidosa.
A lentidão na aprovação de medidas duras e eficazes no combate contra a corrupção, tem criado um perigoso sentimento de desconfiança no sistema, porta aberta ao crescimento de tentações antidemocráticas.
João Paula Batalha, que liderou até há poucos dias a associação cívica Transparência e Integridade, afirmou numa entrevista ao Expresso que o plano de combate à corrupção apresentado pelo Governo é “manifestamente insuficiente, porque assenta, em grande medida, em mecanismos que o próprio Governo despreza, nomeadamente a criação de códigos de conduta ética na administração pública e no setor privado”. E acrescenta: “São mecanismos que o próprio primeiro-ministro despreza, como demonstra o caso do Benfica”.
Esta e muitas outras associações cívicas produzem assinalável trabalho que, na maior parte das vezes, nem sequer é considerado pelos diferentes executivos. Mais um exemplo de desperdício.
Finalmente, um dos casos mais evidentes é a da saída para o estrangeiro de milhares de portugueses que não encontram oportunidades de trabalho condignas no seu país.
O Governo criou o Programa Regressar para incentivar o regresso de emigrantes. Segundo números do Instituto de Emprego e Formação Profissional citados pelo Jornal de Notícias foram registadas 1400 candidaturas, a maior parte de pessoas que saíram de Portugal entre 2011 e 2015. Só para ficarmos com a ideia da percentagem de sucesso do programa, basta recordar que naquele período – 2011/2015 – saíram de Portugal, com caráter permanente, cerca de 240 mil pessoas.
Desperdiçamos diariamente o melhor que Portugal tem: os portugueses.
Jornalista