Migrantes. Portugal liberta marroquinos ilegais na Europa ao fim de 60 dias

Migrantes. Portugal liberta marroquinos ilegais na Europa ao fim de 60 dias


Os migrantes marroquinos começaram a chegar ao Algarve em dezembro. Marrocos tem ignorado pedidos das autoridades por novos passaportes, travando o repatriamento dos ilegais. Lei obriga Portugal a libertá-los após 60 dias de detenção.


O Estado português já perdeu o rasto a, pelo menos, 69 dos 97 migrantes marroquinos que desde dezembro entraram ilegalmente no país por mar (sempre através do Algarve).

Os migrantes ficaram sob custódia do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) enquanto aguardavam para serem devolvidos ao país de origem, mas o prazo legal para a detenção, estipulado em 60 dias, expirou sem que as autoridades de Marrocos tivessem emitido qualquer dos documentos de identificação necessários para que Portugal pudesse concretizar as operações de repatriamento.

Durante o processo, a embaixada de Marrocos em Lisboa utilizou várias justificações para não emitir novos passaportes: alegando, primeiro, com a falta de documentação dos requerentes, não os reconhecendo como nacionais marroquinos, e, depois, com o facto de as fronteiras do país estarem encerradas devido à pandemia. Sem soluções, só restou às autoridades portuguesas libertar os migrantes marroquinos ilegais, sem documentação ou destino definido, apenas notificando-os que ficavam, a partir daquele momento, obrigados a regressar de imediato ao Norte de África.

Em agosto, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, chegou mesmo a reunir-se por videoconferência com o ministro do Interior de Marrocos, Abdelouafi Laftit, para discutir um programa de imigração legal entre os dois países. Na altura, ainda não foi possível fechar um acordo, mas o ministro da Administração Interna garantiu ontem que o mesmo pode estar para breve.

Ao i, fonte do SEF confirma que os [69] migrantes que chegaram ao Algarve até julho “já foram todos libertados” e encontram-se “em paradeiro incerto”. “Não podemos mantê-los detidos por mais de 60 dias. É a lei portuguesa. Resta-nos libertá-los e notificá-los que têm de regressar a Marrocos, mas a verdade é que ficamos sem saber para onde, de facto, estas pessoas vão”, diz. “Acreditamos que, neste momento, já nenhum destes marroquinos se encontra em Portugal. O objetivo destas pessoas passa, normalmente, por chegar a países como Espanha ou França, onde encontram o apoio, muitas vezes família, que lhes permite permanecer na Europa”, explica a mesma fonte. O i contactou o Ministério da Administração Interna (MAI) para comentar a informação, mas, até ao momento, não obteve resposta.

Fuga em Tavira O tema dos migrantes marroquinos ilegais voltou, ontem, a conquistar mediatismo, depois de 17 elementos do único grupo que ainda se mantinha sob custódia do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras terem fugido das instalações do quartel do Regimento de Infantaria n.º 1 do Destacamento de Tavira, onde 24 pessoas se encontravam a fazer quarentena profilática, depois de dois deles terem acusado positivo à covid-19.

Estes marroquinos fazem parte de um grupo de 28 pessoas (constituído por 24 homens, três mulheres e uma criança) que, a 15 de setembro, desembarcou na ilha Deserta, situada na ria Formosa (Faro). Até ao fecho da edição, pelo menos nove migrantes já tinham sido detidos.

Ao i, o intendente da PSP Nuno Carocha descreveu que “o alerta [para a fuga] foi dado de madrugada, por volta das 02h00”, quando “o grupo foi detetado junto à estação ferroviária de Tavira”. Dois dos fugitivos foram imediatamente detidos no local – tendo um deles necessitado de receber tratamento hospitalar a um pé –, mas os restantes acabaram por conseguir fugir à polícia.

Na sequência do caso, o MAI anunciou a abertura de um inquérito para “apuramento das circunstâncias da referida fuga e de eventuais responsabilidades disciplinares de elementos do SEF e PSP”. “O ministro da Administração Interna determinou à Inspeção-Geral da Administração Interna a instauração de um processo de inquérito sobre os factos (…)”, acrescenta em comunicado.

Entretanto, a operação liderada pelo SEF e apoiada pela PSP decorre pela noite dentro. A pedido do SEF, a GNR montou um posto de controlo na fronteira de Castro Marim. Também o destacamento de trânsito tem patrulhado a A22. “Estamos a seguir pistas e acreditamos que estamos muito perto de localizar o resto do grupo”, adiantou ao i o intendente da PSP Nuno Carocha. “É muito importante estas pessoas voltarem a estar sob a custódia do Estado, não só por não deterem autorização para circularem na União Europeia, mas também porque esta é a única forma de terem o apoio médico e alimentar de que necessitam”, acrescentou.

Embora estejam classificados como fugitivos, a verdade é que, de acordo com a lei portuguesa, e seguindo os exemplos já referidos, estes migrantes marroquinos ilegais podem, em breve, voltar a partir, desta vez legalmente. Basta, para tal, que as autoridades de Marrocos continuem a não emitir novos passaportes, impedindo-os de regressarem ao seu país natal, até que se cumpra o período de 60 dias de detenção. O que, neste caso, acontece a partir de 15 de novembro.

O fluxo migratório de jovens marroquinos começou a chegar ao Algarve no final do ano passado e, desde então, já foram registados seis desembarques: em dezembro de 2019, desembarcaram em Monte Gordo oito pessoas; em janeiro, foi a vez de 11 cidadãos marroquinos serem detetados ao largo da Ilha de Armona; em junho, verificaram-se dois episódios, com uma embarcação com sete migrantes detetada ao largo de Olhão e uma com 22 intercetada à chegada à Praia de Vale do Lobo, em Quarteira; em julho, 21 homens alcançaram a Ilha do Farol, em Faro; finalmente, o último caso, teve lugar em setembro, quando 28 pessoas pisaram terra na Ilha Deserta.