A nova temporada do Centro Cultural de Belém (CCB), apresentada ontem à imprensa, em Lisboa, tem como mote a instável noção “Entre”, que faz um convite ao mesmo tempo que desenha uma função intersticial, colocando-se, como refere a própria instituição, “entre momentos históricos e modelos políticos, entre horizontes coletivos e esperanças singulares, entre identidades de género e a fluidez do mundo”. E desde logo está marcada pelos constrangimentos provocados pela crise pandémica, com o programador Delfim Sardo a reconhecer que houve necessidade de fazer reajustes e reagendamentos, de tal modo que, estando a programação delineada até ao verão de 2021, para já só foram anunciadas as iniciativas agendadas até janeiro, uma vez que “há projetos e programas que podem vir a ter alterações”. O administrador responsável pela programação cultural do centro adiantou que, além da pandemia, a margem de incerteza prende-se também com a presidência portuguesa da União Europeia, no primeiro semestre de 2021, que ocupará parte dos espaços do CCB.
Delfim Sardo assumiu funções em março, um mês já marcado pela pandemia, que levou ao adiamento de espetáculos da temporada anterior, os quais serão agora retomados numa articulação com novas propostas, as quais pretendem dar atenção a jovens criadores, a coproduções, à música antiga e à contemporânea. Naquele mês de março, entre as vidas reclamadas pela covid-19 está a do arquiteto italiano Vittorio Gregotti, coautor do Centro Cultural de Belém com Manuel Salgado. O projeto, que ocupa uma área de 97 mil metros quadrados e que, inicialmente, polarizou a opinião pública, foi pensado por Gregotti como a grande cidade aberta à cultura, e foi prevista a construção de cinco módulos independentes. Assim, o arquiteto já não verá os dois últimos, destinados ao comércio e hotelaria, serem terminados.
O programa Dias da Música, um dos mais emblemáticos do CCB, viu a edição deste ano, que seria dedicada a Beethoven, cancelada, e Delfim Sardo disse à imprensa que o projeto está a ser reestruturado e irá ser retomado num novo modelo. Além dos condicionamentos no que toca à programação cultural, a crise tem-se feito sentir ao nível da gestão deste organismo, e o presidente do conselho de administração, Elísio Summavielle, falou nos desafios que o CCB está a enfrentar do ponto de vista do equilíbrio orçamental. Summavielle adiantou que, desde março, o CCB perdeu cerca de 2,5 milhões de euros de aluguer de espaços para conferências, congressos e outros eventos, mas que, ainda assim, foi possível fazer a programação com cerca de 1,8 milhões de euros.
Apesar do cancelamento dos Dias da Música, o 250.o aniversário do nascimento de Beethoven não deixará de ser assinalado, seja com a orquestra Melleo Harmonia (que interpretará a Sexta Sinfonia, a Pastoral e o Concerto para Piano n.o 5, Imperador) ou com o DSCH – Schostakovich Ensemble, com os trios para piano, clarinete e violoncelo. E o CCB destaca ainda na sua programação uma renovada aposta na Black Box e em novos nomes da dança, do teatro e da performance, entre eles a companhia Teatro da Cidade, que irá apresentar Invocação ao meu corpo; Mário Coelho, que nos traz o espetáculo Fuck Me Gently; as coreógrafas Marta Reis Jardim e Diana Niepce, que no mesmo dia apresentarão as suas novas criações, TravessiaS e Dueto, respetivamente; ou os SillySeason, com o seu olhar sobre os loucos anos 20 em Folle Époque.