por Marcus Braga
No que se refere a ambição dos órgãos que tem como missão a prevenção e o combate à corrupção, de modo geral a avaliação do resultado destes é restrita a uma simples operação aritmética: os custos operacionais de seu funcionamento em contrapartida ao retorno financeiro recuperado pela sua acção. Uma visão de que o órgão precisaria se pagar, tendo seus custos recuperados pela sua atividade, no bom estilo do retorno sobre o investimento.
Os seus custos operacionais representam a soma de despesas relacionadas a salários, aluguéis, mobiliário e insumos relacionados às actividades de controle, como combustível, passagens aéreas e verbas indenizatórias, entre outras. E, o retorno financeiro se dá, basicamente, por meio de receitas obtidas por despesas irregulares evitadas ou pelo ressarcimento destas, imposto pela acção do controle. Uma equação simples, que se pode desconsiderar fatores invisíveis, mas nem por isso menos importantes.
O primeiro tipo de custo são os chamados “custos de transacção”. São aqueles relacionados ao desenho das políticas públicas, de todo o processo de acordos, monitoramentos e de supervisão entre as partes envolvidas, por meio do estabelecimento de salvaguardas. São custos relevantes no ofício da prevenção e do combate à corrupção. Porque os órgãos com essa finalidade, de um modo geral, imputam modificações no processo de gestão das políticas públicas, que aumentam esses custos. Eles são aumentados por mecanismos de controle que as tornam mais morosas, por envolverem verificações e etapas processuais adicionais.
Esses custos, além de invisíveis, se diluem ao longo dos processos e do tempo, sem serem percebidos seus efeitos pelos órgãos que promovem a probidade. Mas que, mesmo assim, impactam diretamente os custos da política e a sua efetividade, precisando serem considerados. Faz-se necessário a empatia dos agentes do controle, sair da visão do controlador e se colocar no lugar do gestor. E ainda, no lugar do cidadão, beneficiário da política, para que os avanços da luta contra a corrupção não sejam victórias pírricas[1].
O outro factor pouco considerado é o custo de oportunidade. Trata-se do custo de alguma coisa em função da oportunidade renunciada. Se algo é verificado, outra cousa deixa de ser olhada. É uma decorrência das limitações dos sistemas, ou seja, da própria realidade. Assunto relevante no que se refere a prevenção e o combate à corrupção. Porque os meios operacionais são sempre acanhados frente às demandas por investigar atos corruptos. O que gera a necessidade de escolhas, que precisam ser baseados em critérios relacionados ao risco e ao volume financeiro envolvido, de modo a otimizar essas acções.
No caso, dado que as acções de combate e prevenção à corrupção, por envolverem uma rede de atores com atribuições específicas, que por vezes se arrastam por anos. Assim. o processo de escolha de onde atuar, pode prejudicar todo o conjunto de órgãos relacionados a essa acção, inclusive os de caráter judicial, em detrimento de outros processos e ações. Um processo de escolha que, se mal feita, pode acarretar prejuízos sistêmicos às políticas públicas.
Por exemplo, em um escândalo noticiado na imprensa, de um grande hospital da capital, um dos órgãos relacionados ao combate da corrupção mobiliza toda a sua força de trabalho. O que provoca, pela força dos acontecimentos, pesados controles e a paralisia de actividades consideradas essenciais. Assim, pela lógica exposta, há custos a serem considerados, em que pese essa acção possa trazer retornos financeiros e de governança à referida unidade de saúde e de imagem ao órgão de controle em questão.
Custos de transacção que podem onerar ou impedir algumas acções no hospital, trazem prejuízos, às vezes irreversíveis, aos utentes daquela unidade hospitalar, em especial por se tratar de Saúde. Custos de oportunidade também, porque a escolha de centrar a atenção no escândalo do hospital pode retirar acções de fiscalização em outros locais, de risco e materialidade importantes, em uma acção no momento do escândalo, que pode quebrar da visão sistêmica do combate à corrupção.
A falta de percepção desses fatores, os custos de transação e o de oportunidade, reduz a discussão do fenômeno da corrupção ao momento de sua eclosão, desconsiderando questões passadas e futuras daquele evento. Também, os aspectos estruturais, que precisam ser tratados e analisados. Seja nas escolhas do que investigar e com que intensidade, além dos efeitos concretos de essas acções na concretização das políticas públicas. Se a corrupção é uma doença, o seu diagnóstico necessita ser holístico em relação ao paciente e o remédio necessita ser aplicado na dosagem correta.
Doutor em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento (PPED/IE/UFRJ).
[1]Diz-se vitória pírrica ou vitória de Pirro a um êxito obtido a alto preço, tendo como efeitos prejuízos irreparáveis.