Os vídeos que tramaram António Costa

Os vídeos que tramaram António Costa


Em abril, Costa disse que “o jornalismo vive sempre da desgraça alheia”. Já este fim de semana circulou um vídeo que mostra o primeiro-ministro a chamar “cobardes” aos médicos. 


António Costa voltou a ser apanhado pelas câmaras, deixando escapar palavras menos simpáticas. Se, em abril, o primeiro-ministro disse na Rádio Observador, pensando que ainda não estava no ar, que “o jornalismo vive sempre da desgraça alheia”, este fim de semana bastaram sete segundos para gerar indignação entre os médicos. No vídeo que circulou nas redes sociais é possível ver António Costa em conversa com jornalistas do Expresso e ouve-se o primeiro-ministro a chamar “cobardes” a estes profissionais de saúde: “O presidente da ARS [Administração Regional de Saúde] mandou para lá os médicos para fazerem o que lhes competia e os gajos, cobardes, não fizeram”.

O Sindicato Independente dos Médicos (SIM) reagiu de imediato a estas palavras, sublinhando que os “médicos do SNS [Serviço Nacional de Saúde] são médicos no SNS, não são médicos em lares nem para protegerem as costas a amigos políticos, seja de que cor forem”. “A determinação da ARS Alentejo de alocar ao lar da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva equipas de médicos do Agrupamento de Centros de Saúde Alentejo Central e do Hospital Espírito Santo de Évora estava ferida de ilegalidade face às convenções coletivas de trabalho”, acrescentou o SIM em comunicado. As reações multiplicam-se e o PS considerou as afirmações do SIM “falsas”. “O SIM sabe que foi emitido um despacho do gabinete da ministra da Saúde que determina que o seguimento clínico do doente de covid-19 que habite em estabelecimento residencial para pessoas idosas e cuja situação clínica não exija internamento hospitalar não pode estar alheado da prestação de cuidados de saúde”, disse à Lusa a deputada socialista Hortense Martins. 

As palavras de Costa foram ditas em conversa com jornalistas do Expresso, tendo este jornal já reagido. Através de uma nota da direção, o semanário explicou que o vídeo se refere a “uma recolha de imagens de uma conversa off the record, privada, do primeiro-ministro com jornalistas do Expresso”.

 

Reações

Francisco Rodrigues dos Santos, líder do CDS, também reagiu às palavras de António Costa, dizendo que “os elogios, os aplausos, os ‘prémios’ de finais de Liga dos Campeões para os profissionais de saúde não foram mais que fachada mediática”. Acusando Costa de não ter retirado “uma única consequência política dos erros cometidos no lar de Reguengos”, Francisco Rodrigues dos Santos sublinhou que o primeiro-ministro “já encontrou um bode expiatório: os médicos”. E sugeriu que “o primeiro-ministro deve retratar-se publicamente e retirar imediatamente o ataque feroz que desferiu na classe profissional”. 

Além do vídeo publicado, as palavras de António Costa em entrevista ao Expresso, este fim de semana, não foram, seguramente, elogiadas pelos médicos. Costa disse que o Governo não acordou “agora por causa do relatório de uma entidade que não tem competência legal para fazer esse estudo”. As ordens “não existem para auditar o Estado”, acrescentou o primeiro-ministro em relação ao relatório apresentado pela Ordem dos Médicos sobre o caso do lar de Reguengos de Monsaraz, onde morreram 18 pessoas. 

E Miguel Guimarães, bastonário da ordem, disse este domingo que os médicos ficaram “visivelmente incomodados com as palavras do primeiro-ministro” e que esta “é a pior altura para António Costa abrir guerra com os médicos”. Miguel Guimarães garantiu que, caso a qualidade da prestação dos cuidados de saúde seja colocada em causa, a ordem pode e deve fiscalizar a instituição em questão, seja ela uma entidade pública ou privada. A Iniciativa Liberal seguiu as ideias da Ordem dos Médicos e, em comunicado, considerou “inaceitável que o primeiro-ministro afirme que as ordens profissionais não existem para fiscalizar o Estado”. “Numa democracia, todas as instituições e todos os cidadãos têm o direito e até o dever de fiscalizar a ação do Estado, sobretudo no caso de uma ordem, quando está em causa a atuação de profissionais que regula”, escreveu o partido liderado por João Cotrim de Figueiredo, acrescentando que Costa deve “pedir desculpas aos familiares dos utentes e aos profissionais da classe médica”.