Mora. O surto que transformou um paraíso num deserto

Mora. O surto que transformou um paraíso num deserto


Em maio, a grande preocupação no Alentejo era o verão. O calor chegou e os casos de infeção também. Mora está agora no centro das atenções com 42 pessoas infetadas. Quem lá vive, diz que antes do primeiro caso, a preocupação não era muita.


Nos últimos meses, os habitantes de Mora viam aquela vila como se fosse um paraíso. Aliás, o Alentejo é a região que menos infeções regista, mas cujos surtos identificados nas últimas semanas têm causado preocupação. E, segundo o boletim divulgado ontem, a região do Alentejo, que registou 836 casos positivos, está quase a igualar o Algarve, que contava esta segunda-feira com 980 infeções.

Os casos de infeção em Mora por covid-19 eram inexistentes e há quem diga que, até aparecer a primeira confirmação, os moradores se esqueciam que existia uma pandemia. Agora, são já 42 os casos confirmados e, segundo informações dadas ao i pela Câmara Municipal de Mora, mais de 200 pessoas estão em casa, em quarentena, ou à espera dos resultados dos respetivos testes.

A vila está deserta e quem lá vive diz que agora é que “caiu a ficha”. “Até aparecer, não houve por parte da população aquela preocupação com a covid”, disse Helder Ganhão, habitante de Mora, onde tem um restaurante que está agora encerrado. Entre cafés e restaurantes, “só existe um aberto, o resto está tudo fechado, e de comércio só uma ou duas mercearias é que estão abertas”, explicou o proprietário do restaurante, admitindo que continua a receber chamadas para marcação de almoços e jantares. “Agora não há quase ninguém na rua”, acrescentou.

Ainda não é conhecida a origem do surto, mas a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, disse ontem que esta é uma situação em que “não são apenas os casos iniciais que interessam”, mas também os que resultam dos primeiros. “Um surto complexo”, disse Graça Freitas, que está a ser investigado pelas autoridades de saúde.

No final de maio, o número de infeções na região do Alentejo fixava-se nas 257, uma morte e 12 concelhos não tinham qualquer infeção. Nessa altura, José Robalo, presidente da Administração Regional de Saúde do Alentejo, explicou ao i que uma das preocupações era a chegada do verão: “O verão traz alguma preocupação se as pessoas não tiverem a responsabilidade que devem ter nestas circunstâncias. Se abusarem, se não cumprirem as recomendações da DGS, provavelmente vamo-nos arrepender. Se toda a gente estiver consciente desse dever de cidadania, podemos ultrapassar esta situação sem os impactos que houve noutros países”.

O fecho das fronteiras, casas familiares em vez de apartamentos e uma organização de território que já impõem, naturalmente, o distanciamento social foram alguns dos motivos que justificaram este milagre alentejano.

Surgem casos perto de Mora “Relacionado com Mora, há um outro caso em Montemor-o-Novo, Ciborro. Foram feitos 225 testes e há 24 casos confirmados neste segundo foco possivelmente relacionado com o primeiro”, avançou Graça Freitas ainda durante a conferência de imprensa. No entanto, a presidente da Junta de Freguesia de Ciborro, Nélia Campino, explicou ao i que na aldeia que preside estão apenas identificadas 10 infeções e que as restantes 14 deverão estar localizadas noutros ponto do concelho de Montemor-o-Novo.

“Temos praticamente toda a população de Ciborro em isolamento”, explicou Nélia Campino, acrescentando que os testes continuam a ser feitos. A aldeia de Ciborro, que tem menos de 700 habitante, “é uma zona de passagem”, situada entre Mora e Montemor-o-Novo e, neste momento, o cenário é idêntico ao que se vê em Mora: ruas vazias.

Tanto Mora como Ciborro têm lares, mas em nenhuma das instituições foram registados – pelo menos até ontem – casos de infeção. E as visitas foram suspensas em todas as instituições.

Covid no resto do país Os lares continuam a ser um dos focos de preocupação. No Lar de Nossa Senhora da Luz, no concelho de Torres Vedras, registou-se a morte de dois utentes. O número de casos subiu este sábado para 87, incluindo utentes e funcionários.

O boletim de ontem registava 132 novos casos – o terceiro dia consecutivo abaixo dos 200 casos –, mas a atenção foi para Sintra, onde se verificou que o número de novos casos cresceu tanto nos últimos 15 dias como em Lisboa. Desde o dia 3 de agosto, Sintra registou mais 208 novos casos e Lisboa 260. Comparando os números desde segunda-feira da última semana, Sintra passa Lisboa – 132 e 131 casos, respetivamente.